(Fiat/Divulgação)
Juliana Estigarribia
Publicado em 31 de outubro de 2019 às 06h00.
Última atualização em 18 de dezembro de 2019 às 08h30.
Não é de hoje que a Fiat tenta fazer uma nova fusão com outra montadora. A confirmação no início desta semana das tratativas com a PSA, dona das marcas Peugeot e Citroën, ocorre apenas alguns meses depois da tentativa frustrada de casamento com a Renault. Os episódios, que não foram únicos, reforçam a preocupação que praticamente se instalou como uma cultura na Fiat Chrysler. O objetivo é buscar a sobrevivência em um cenário global de profundas transformações da indústria automobilística.
A obstinação de Sérgio Marchionne, ex-presidente da Fiat, com fusões tinha como premissa um futuro em que somente as montadoras com grandes volumes - acima de 10 milhões de unidades - sobreviveriam em um horizonte de aumento de custos, resultante de novas tecnologias, eletrificação e automação.
Isso sem contar um fenômeno relativamente recente de mudança comportamental do consumidor, que passou a avaliar mais a posse do veículo com a proliferação global dos aplicativos de transporte individual.
"Há muitos anos, o [Sérgio] Marchionne já enxergava que não haveria espaço, no futuro, para tantas montadoras. Com o seu falecimento, esse 'DNA' parece que ficou na Fiat", diz Ricardo Bacellar, líder do setor automotivo na KPMG do Brasil.
A fusão da Fiat com a Chrysler levou cerca de dez anos para ser concretizada. Após esse penoso processo, que envolveu sinergias em compras, portfólios, redes de distribuição, funcionários e estruturas, o recém-formado grupo Fiat Chrysler Automobiles (FCA) passou a buscar um novo casamento.
A FCA chegou a namorar a General Motors, mas recebeu mais de uma negativa. Tentou flertar com a Volkswagen, mas nem foi correspondido. Houve ainda interesse por parte da gigante chinesa Great Wall em uma aquisição da FCA. Nada foi para frente.
"Assumir toda a operação de uma montadora é muito oneroso se a empresa quiser ter no portfólio produtos para todos os perfis de consumidor. Compartilhando os custos, cada marca pode atacar determinados segmentos e concentrar esforços em mercados onde sua participação é maior", diz Milad Kalume Neto, gerente da consultoria automotiva Jato Dynamics.
Embora a fusão da Fiat com a Chrysler tenha dado certo, esse tipo de união entre montadoras não segue uma receita de bolo. Por se tratar de uma cadeia muito longa, que envolve fornecedores de insumos, peças e componentes, sistemas, motores, além de grandes redes de concessionárias, o caso da FCA pode ser um dos únicos na história da indústria automotiva - o resto aconteceu por meio de alianças e aquisições.
A fusão entre Fiat Chrysler e PSA, se concluída, resultará na quarta maior montadora do mundo, com valor de mercado estimado de 50 bilhões de dólares e 20% das vendas globais.
Apesar dos números atraentes, as sinergias de portfólio teriam que ser bem avaliadas, já que os dois grupos têm áreas de atuação bastante semelhantes ao redor do mundo, principalmente em veículos de entrada.
No Brasil, o market share da nova empresa ficaria em pouco mais de 21%. Por aqui, a Fiat e a Jeep têm ampla participação de mercado, enquanto Citroën e Peugeot são consideradas marcas de nicho.
Para atingir o seu objetivo, a Fiat terá enormes desafios pela frente. No entanto, Bacellar lembra que os intervalos entre as tentativas de casamento entre as montadoras têm ficado cada vez menores, sugerindo que este movimento emerge como uma aposta para o futuro.
"Com a disputa por mercado cada vez mais acirrada, não há muito espaço para repassar aumento de custos de novas tecnologias para os consumidores. As fusões e aquisições vão ser tratadas como questão de sobrevivência", avalia.