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Para acionista da Vale, alta do minério faz problemas sumirem

Mineradora usou uma manobra comercial para deixar de pagar 23 bilhões de reais em impostos, segundo o UOL. Ações sobem 3% nesta segunda

AS BUSCAS EM BRUMADINHO: mineradora segue jogando com regulamento embaixo do braço  / REUTERS/Washington Alves

AS BUSCAS EM BRUMADINHO: mineradora segue jogando com regulamento embaixo do braço / REUTERS/Washington Alves

LA

Lucas Amorim

Publicado em 1 de abril de 2019 às 10h30.

Última atualização em 1 de abril de 2019 às 19h19.

O portal UOL revelou, na manhã desta segunda-feira, que a mineradora Vale usou uma manobra comercial para deixar de pagar 23 bilhões de reais em impostos na exportação de minério de ferro entre 2009 e 2015.

A manobra revelada por um estudo do Instituto de Justiça Federal, uma ONG formada por economistas e auditores da Receita Federal, é legal, segundo a empresa. Mas é mais uma notícia negativa num momento em que a companhia está sob intenso escrutínio após o rompimento da barragem de Brumadinho e de sucessivos anúncios de evacuação sob risco de novos desmoronamentos.

Segundo a reportagem do UOL, a Vale usa a Suíça, um país sem acesso ao mar, como entreposto para a venda de minério à China e ao Japão. A carga destinada à Ásia deixa o Brasil com um preço abaixo do de mercado em direção à Suíça e, de lá, é remetida à Ásia. Segundo a mineradora, “as operações com empresas controladas baseadas no exterior são previstas em lei”. Ainda segundo o UOL, a Receita Federal anunciou um plano de fiscalização especial sobre a triangulação de exportações com foco nas mineradoras.

A revelação é a nova notícia ruim sobre a mineradora de uma leva que começou em 25 de janeiro, com o rompimento da barragem de Brumadinho, que deixou 214 mortos e 91 desaparecidos. No fim de semana, moradores de quatro cidades mineiras participaram de simulações de emergência como preparação a possíveis rompimentos de barragens. Na última quarta-reira, estruturas da Vale em Nova lima, Raposos e Itabirito entraram em nível 3 de risco e apresentam “risco iminente de romper”, segundo a Agência Nacional de Mineração.

Na quinta-feira, em conferência com analistas e investidores após a divulgação anual de resultados, o diretor-financeiro da Vale, Luciano Siani, afirmou que “os negócios vão ficar em segundo plano por algum tempo”. A Vale já tem 16 bilhões de reais bloqueados pela Justiça para ajudar nos esforços de reparação. Resultado: a conferência que era para se destinar à boa notícia do dia, um lucro de 25 bilhões de reais ano passado, 25% a mais do que em 2018, virou mais um evento destinado à cobrança sobre a mineradora.

Em jogo, além da recuperação pós-Brumadinho, está a oportunidade de a empresa usar a tragédia como um divisor de águas. Conforme mostrou reportagem de capa de EXAME no início de março, especialistas vêm criticando a mineradora por tratar o rompimento de Brumadinho como um caso isolado, e não como um trágica mostra de uma empresa que precisa repensar sua atuação com a sociedade.

O rompimento de Brumadinho, conforme mostra a reportagem, pegou a Vale num momento de euforia, com as ações e geração de caixa em franca expansão. A remuneração da diretoria cresceu 150% em três anos, para 30 milhões de dólares. Entre 2008 e 2017, a Vale distribuiu 37 bilhões de dólares a seus acionistas. Mas os investimentos em manutenção caíram.

No últimos anos, a empresa também figurou nos principais índices de responsabilidade social e de solidez financeira. As políticas sociais da empresa já estão sob intenso escrutínio nas últimas semanas. Com a notícia de triangulação comercial desta segunda-feira, a fortaleza financeira da mineradora também passará a ser analisada com lupa.

Nos corredores da Vale executivos costumam dizer que, em virtude da distância do Brasil para a China, na comparação com os concorrentes australianos, cada centavo de economia conta. A estratégia comercial da Vale é corriqueira entre companhias com operações espalhadas mundo afora. Mas é o tipo de prática que entrou no radar de governos como o do americano Donald Trump, que passou a cobrar empresas como fabricantes de eletrônicos e montadoras, que deixam de pagar impostos nos Estados Unidos ao levar a fabricação de seus produtos para países como China e México.

A Vale afirma agir dentro da lei. Mas é inevitável que seja cobrada, cada vez mais, a ir além do que exigem  manuais e regulamentos. Para a empresa, uma boa notícia: a revelação da triangulação comercial veio no mesmo dia em que uma série de bons indicadores industriais chineses fez o minério de ferro subir 2% na madrugada. Resultado: as ações da Vale abriram a manhã de segunda-feira em alta de 3%.

Graças a elevações no preço da commodity a Vale já recuperou 40 bilhões de reais dos 70 bilhões de valor de mercado perdidos com a tragédia de Brumadinho. Mesmo com a própria Vale afirmando que os negócios estão em segundo plano, os investidores continuam concentrados na variável de sempre.

Procurada por EXAME, a Vale enviou o seguinte comunicado:

"A Vale possui uma empresa "trading" na Suíça para atender aos mercados europeu e asiático. Todas as empresas brasileiras exportadoras de commodities mantêm estruturas internacionais semelhantes, em países diversos.
 
A empresa atua com transparência perante a Receita Federal. As operações com empresas controladas baseadas no exterior são previstas em lei, regulamentadas e fiscalizadas.
 
A Vale informa que está em situação regular perante a Receita Federal, comprovada por suas certidões de regularidade fiscal."

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