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“Olhamos o Brasil com uma visão de longo prazo”, diz Moses Dodo

Em entrevista a EXAME, presidente da Bupa fala sobre o mercado de saúde brasileiro, o crescimento da empresa no país e seus próximos passos

Moses Dodo, Bupa (Bupa/Divulgação)

Moses Dodo, Bupa (Bupa/Divulgação)

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Clara Cerioni

Publicado em 12 de outubro de 2018 às 13h23.

Última atualização em 12 de outubro de 2018 às 13h42.

São Paulo — O grupo inglês de seguros internacionais fez sua entrada no Brasil em 2016 com a compra da operadora de planos de saúde e odontologia Care Plus, focada no segmento de clientes de alta renda em saúde.

Mesmo com a compra em pleno período de crise, Moses Dodo, presidente da Bupa na América Latina, afirma que a empresa já cresceu 17% no país no ano passado e teve um lucro de 52 milhões de reais.

A empresa oferece serviços de planos corporativos e tem como clientes companhias de tecnologia, de serviços e outros setores. O produto lançado no Brasil permite cobertura em qualquer lugar do mundo.

Em entrevista exclusiva à EXAME, Dodo fala sobre o mercado de saúde brasileiro e os próximos passos da Bupa no país.

EXAME: Qual sua visão do mercado de seguros de saúde?

Moses Dodo: As pessoas estão vivendo mais porque a medicina tem evoluído, a farmácia tem evoluído, os equipamentos têm evoluído. E isso é uma ótima notícia. A má notícia é que isso tem um custo. A medicina e a ciência evoluíram e transformaram certas doenças, como Aids e diabetes, por exemplo. Essa situação põe pressão no sistema do ponto de vista de custo. Existe uma outra questão, que também não é uma questão brasileira, é a da inflação médica. Ela roda numa velocidade que é bem maior do que o resto da inflação. A inflação médica nos Estados Unidos no ano passado foi acima de 8% e a inflação do país foi menos de 2%. Esse é o primeiro problema. Isso acontece porque o sujeito inventa um robô que faz uma operação, por exemplo, mas que custa 2 milhões de dólares. Existe um problema aí. A hepatite C hoje tem cura, mas o tratamento custa 80 mil dólares. A evolução da medicina tem duas consequências, uma positiva e outra menos positiva, porque o custo tem que ser pago de alguma forma. O grande desafio da indústria como um todo, não só do pagador, mas também do hospital, da clínica, do médico e do paciente, é ter a medicina correta para a pessoa ao preço adequado.

E como resolver isso?

O modelo de saúde está mudando em todo o mundo. As farmácias nos Estados Unidos vão incorporar um conceito de “one stop shop” de saúde. Esses modelos de integração são para tentar encontrar uma forma de controlar os custos. Ter saúde de menos é um problema. Ter saúde demais também é um problema. Nós temos hoje, por exemplo, um acordo com hospitais e com prestadores de laboratório onde tem exames básicos que não mudam, como de tipo sanguíneo, que só precisa ser feito uma vez. Quando uma pessoa é diagnosticada com uma doença, o médico pede vários exames. Se ela vai pedir uma segunda opinião, o segundo médico pede os mesmos exames. Se ela fizer mais uma vez, está desperdiçando recurso.

Existe uma alternativa para o paciente ter um prontuário dele em casa para não repetir exames?

O sistema tem que encontrar fórmulas de equilíbrio. Nisso, entra a questão da tecnologia, que precisa ter investimento para poder ser implementada. Não é barato um prontuário eletrônico, nem tão acessível. É necessário, também, que os provedores tenham uma boa relação com os pagadores e que os pacientes tenham consciência de que o desperdício e o excesso vai custar mais. Só assim o sistema vai funcionar melhor e o custo poderá ser melhor controlado.

Isso já existe em algum lugar?

Hoje, existem acordos do grupo Bupa com laboratórios aqui no Brasil. Isso está começando. No Brasil, ainda há uma série de limitantes com relação a telemedicina. Nos Estados Unidos, isso está mais desenvolvido. A telemedicina é uma realidade. Tem coisa que não precisa ter contato físico, o médico não precisa tocar em você para examinar. Imagina quantas consultas podem deixar de ser fisicamente feitas e podem ser feitas remotamente.

E por que no Brasil não conseguimos implementar a tecnologia como nos EUA?

É difícil achar o culpado, é um problema crônico, não tem uma solução única. Temos sempre aquela tendência de achar que a culpa é do pagador. Se der uma olhada na relação na Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e procurar os índices de sinistralidade das operadoras de saúde. Se você olhar, você vai ver que, no Brasil, uma maneira geral, é bastante elevado. Na indústria, é de 80%. Sobra 20% para pagar despesa administrativa, agenciamento. Precisa ter escala nesse negócio. Não é um negócio tão simples quanto parece é complicado.

A Bupa comprou no Brasil a Care Plus em 2016. Como é a atuação da empresa no país?

A Bupa atua em dois segmentos, de seguros e de provisão, que são cálculo dos riscos esperados inerentes às operações de assistência à saúde. Em alguns lugares do mundo, a empresa tem clínicas e hospitais e opera em modelo integrado. Em outros, só operamos como pagador no sistema de saúde. 70% do nosso negócio é seguro, 30% da provisão médica. Em alguns países, temos uma estrutura de modelo integrado. Esse é um dos modelos que podem vir a viabilizar uma medicina que tem um controle maior no processo de custos. Na América Latina, nossa participação é em um segmento de clientes alta renda.

No Brasil, apareceu a Care Plus, que era uma companhia dentro desse segmento que a nossa empresa olhava, cujo foco sempre foi esse. Foi o casamento meio que perfeito. Compramos em dezembro de 2016. Foram dois anos de integração e teve crescimento. Ano passado foi de mais de 17% em relação ao ano anterior, já teve um faturamento de quase 800 milhões de reais, teve um lucro de 52 milhões, está indo muito bem.

Quando vocês compraram a Care Plus, o país enfrentava uma grave recessão. Qual foi a estratégia de crescimento?

A Bupa tem uma característica diferente de outras companhias. Enquanto todo mundo estava indo embora do Brasil, a Bupa estava vindo para cá. Nossa visão é de longo prazo. Era um mercado em que a empresa queria estar. O modelo era o que estávamos procurando e, de certa maneira, foi menos afetado pela crise. Nosso cliente acredita que um seguro saúde de alto nível é um instrumento importante na retenção de talentos. Nosso cliente é a empresa que acredita que a saúde é importante para os seus empregados, acredita que isso vai ajudar a retê-los, acredita que é importantíssimo ter talento, porque se não, ele perde a competitividade no mercado e ele está num setor que, de uma certa forma, é menos vulnerável à crise econômica. Essencialmente, nossos clientes estão na tecnologia, no setor financeiro, setor de serviços, como os escritórios de advocacia. São empresas que têm, digamos, tem mais resiliência para essas crises. Eles querem ter o mesmo padrão para os funcionários da Europa ou dos Estados Unidos. E querem ter o mesmo nível de satisfação do seu funcionário.

O que está planejado para os próximos anos?

Nós continuamos nesse processo de integração. Ontem anunciamos o Luiz Camargo como o presidente da companhia. Nossa vontade é crescer no Brasil. Temos não só a capacidade financeira, como uma vontade.

A empresa fez algum lançamento de produto aqui?

Trazemos produtos. Trouxemos o produto Master Internacional. A pessoa pode gastar dinheiro aqui no Brasil ou lá fora, tem que ter os dois sistemas conversando. Nosso produto oferece acesso internacional para o cliente ter atendimento fora do país. Ele pode recorrer a qualquer médico em qualquer lugar do mundo. Acredito que tem que ser feito um passo de cada vez. Às vezes, alguns negócios dão errado por um problema cultural. Acho que conseguimos fazer isso, até porque eu sou brasileiro, nossa central em Miami é latina, é o mesmo DNA. Trabalhamos essa parte cultural fortemente.

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