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O que o desperdício de comida tem a ver com as mudanças climáticas?

Você vai se surpreender: se o volume de alimentos não consumidos fosse um país, seria o terceiro maior emissor de gases de efeito estufa do planeta

Cerca de 1 bilhão de toneladas de alimentos são perdidos ou desperdiçados a cada ano (Agência/Getty Images)

Cerca de 1 bilhão de toneladas de alimentos são perdidos ou desperdiçados a cada ano (Agência/Getty Images)

Desperdiçar comida costuma ser um ato subconsciente. A maioria das pessoas nem percebe que faz. Porém, o Índice de Desperdício de Alimentos 2021 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) mostra que, globalmente, perto de 1 bilhão de toneladas de alimentos são perdidos ou desperdiçados a cada ano – um número grande demais para ser ignorado.

Enquanto a produção agrícola teve enormes avanços nas últimas décadas, um terço do que sai do campo termina no lixo, cerca de 1,8 bilhão de toneladas anuais. É o suficiente para nutrir com sobra os mais de 800 milhões de indivíduos que passam fome no planeta. E representa uma perda financeira anual em torno de 1 trilhão de dólares, segundo a ONU.

Tudo isso já seria o bastante para fazer desse cenário um grande problema mundial. Mas soma-se aí outro fator alarmante: o ambiental. O desperdício causa a emissão de mais de 3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa (GEE).

Estima-se que de 8% a 10% das emissões globais estão associadas a alimentos que não são consumidos. Para ter uma dimensão do tamanho da questão, se o desperdício fosse um país, seria o terceiro maior emissor depois de Estados Unidos e China. 

Como essas questões se relacionam?

Quando os alimentos são perdidos ou desperdiçados, todos os recursos naturais que foram utilizados para a sua produção também são jogados fora. “São utilizados terras e recursos hídricos preciosos para, essencialmente, nada”, disse Inger Andersen, Diretora Executiva do PNUMA.

Além disso, a comida descartada vai parar em aterros, e a decomposição desses resíduos leva à emissão de metano, potente GEE. 

Também pesam nessa conta as emissões geradas pelo transporte e as embalagens – essas, aliás, contribuem com mais emissões do que qualquer outro elemento da cadeia de abastecimento, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). 

E há ainda o fator energia: alimentos descartados respondem por 38% do uso total de energia no sistema alimentar global. 

Ou seja, parece inofensivo, mas aquele restinho de comida deixado no prato ou esquecido na geladeira tem um impacto muito maior do que o imaginado, contribuindo para acelerar as mudanças climáticas. 

Desperdício x perda

A FAO calcula que, em nível global per capita, 121 quilos de alimentos são desperdiçados por consumidores anualmente, dos quais 74 quilos são no ambiente doméstico. Porém, as famílias, claro, não são as únicas responsáveis por esse quadro. 

E aqui vale esclarecer a diferença entre desperdício e perda. O primeiro está ligado a um descarte intencional de comida que ainda poderia ser aproveitada, pelo consumidor ou no varejo. Já a perda ocorre entre a colheita e a chegada ao varejo, quando o alimento é descartado em meio a processos como produção, armazenamento e transporte.  

Uma pesquisa da FAO apontou que aproximadamente 14% dos alimentos produzidos para consumo global são perdidos nesse segundo contexto. No caso de frutas e vegetais, são mais de 20%.

E boa parte desse volume está associada a padrões estéticos. Embora estejam frescos, muitos produtos que não estão com tamanho ou formato perfeito nunca chegam à prateleira do supermercado – podem não passar pelo fornecedor ou nem sair da fazenda. Na União Europeia, por exemplo, um estudo estimou que mais de um terço da produção no campo é descartada por essa razão.

Parte da solução

Diante disso, fica claro que reduzir a perda e o desperdício de alimentos é um caminho importante – e viável – para conter o avanço das mudanças climáticas. 

“Com uma ação colaborativa entre as cadeias de abastecimento, redução do desperdício em casa, algumas mudanças importantes de comportamento por parte dos consumidores e políticas que mantenham os alimentos fora do aterro sanitário, podemos ter um grande impacto na crise planetária, com benefícios em toda a Agenda 2030”, avalia Clementine O'Connor especialista em sistemas alimentares do PNUMA.

A questão integra os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (12.3), com a meta de reduzir pela metade a perda e o desperdício global de alimentos até o fim da década. Com apenas nove anos restantes, será um grande desafio. Mas cada um pode contribuir fazendo sua parte em casa.

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