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O que as demissões da Estácio revelam sobre o setor

A demissão de 1.200 professores é a mais extrema medida da obsessão das redes de ensino com o controle de custos, que tende a se intensificar em 2018

ESTÁCIO: a companhia dobrou de valor este ano graças a agressivos cortes de custos e a planos de investimento (foto/Divulgação)

ESTÁCIO: a companhia dobrou de valor este ano graças a agressivos cortes de custos e a planos de investimento (foto/Divulgação)

LA

Lucas Amorim

Publicado em 6 de dezembro de 2017 às 15h26.

Última atualização em 7 de dezembro de 2017 às 14h08.

O grupo de ensino Estácio confirmou, em nota divulgada nesta terça-feira, que demitiu profissionais da área de ensino. Segundo revelou o jornal O Globo, a empresa vai demitir 1.200 professores num processo de reposição de quadros, em que serão contratados, segundo a companhia, o mesmo número de docentes. A demissão em massa é o mais novo episódio da maciça reestruturação de custos não só da instituição de ensino fluminense, como de todo o setor de educação superior.

“Os grupos de educação têm gastos crescentes com salários de seus professores. Muitos deles têm políticas pouco sustentáveis, de aumentos automáticos com bases em titulações”, diz Romário Davel, sócio da consultoria especializada em educação Atmã Educar. “Com o sucesso do grupo Kroton, que consegue gastar menos com salários, todos os grandes grupos têm sido pressionados a rever a estratégia”.

Os cortes da Estácio, neste sentido, são apenas a ponta de lança de um movimento de enxugamento que, segundo o consultor, pode ganhar força ao longo de 2018. Segundo dados da Atmã, a Kroton aloca 19,8% de sua receita para gastos com professores, enquanto a média de instituições isoladas está em 41%. A Estácio gasta quase isso: 40%.

“A Estácio é uma instituição antiga e com muitos professores na titulação de doutor. O movimento é uma nítida substituição de professores caros por professores baratos. Hoje existe fartura na oferta de docentes titulados”, diz Davel.

Oficialmente, a empresa afirma que não se trata de uma mudança para contratos na nova legislação trabalhista, pois os novos professores também serão contratados pela CLT. “É simplesmente uma oportunidade de geração de valor orçamentário. Tínhamos professores descolados da média hora/aula e professores sem titulação ganhando o mesmo que professores com doutorado”, afirma um executivo do alto escalão da Estácio. Segundo a companhia, é um número relativamente pequeno de ajustes, uma vez que a empresa tem mais de 10.000 professores contratados.

O modelo da Kroton, que vem sendo o novo parâmetro do setor, inclui mais professores por sala de aula e uma estrutura de cursos que permite, por exemplo, que alunos de diferentes graduações assistam juntos aulas que constem em vários currículo. Um forte braço de ensino à distância, com menos custos fixos com professores, também é um diferencial da Kroton, e é uma prioridade para os principais grupos de educação do país. A Kroton, o maior grupo de ensino do mundo, tem conseguido conciliar essa estrutura de custos enxuta com qualidade de ensino dentro da média de seus principais concorrentes.

EXAME apurou que a Estácio está aumentando o número de alunos por professor em sala da aula, como forma de reduzir custos. Para executivos da Estácio, isso não afetará a qualidade se as universidades tiverem ensino padronizado. A empresa também reduziu o orçamento de marketing e mudou a sede de um prédio de escritórios para dentro de um de seus campi.

Desde que a fusão com a Kroton foi negada pelo Cade, em junho, a companhia adotou uma série de medidas para cortar custos, sob a gestão de Pedro Thompson. Demitiu 125 nomes da diretoria e do segundo escalão da gestão, encerrou o departamento de inovação, e fechou três campi, que atendiam 10.000 alunos.

Junto com um aumento no preço dos cursos, e um novo plano de crescimento em ensino básico, as medidas ajudaram o valor de mercado da companhia dobrar em cinco meses, para cerca de 9 bilhões de reais. O anúncio das demissões também parece ter agradado os investidores: os papeis da companhia subiram 2,66% até as 13h desta quarta-feira.

A reforma trabalhista

O caminho de conseguir ensinar mais gente gastando menos é inevitável no ensino superior privado brasileiro. Ainda assim, especialistas do setor afirmam que cortes bruscos, como o da Estácio, têm um risco. “Essa substituição de professores mais caros por outros em início de carreira é natural, mas pode ser feita de duas maneiras. A menos agressiva é seguir o turnover anual regular. Outra é com demissões. O risco da segunda é prejudicar a qualidade do ensino”, diz um executivo do setor.

A advogada Clarisse Rosales, sócia do escritório Andrade Maia especialista em direito do trabalho, afirma que a Estácio ou qualquer empresa pode dispensar o número de funcionários que bem entender, mas que eles não poderão ser recontratados num prazo inferior a seis meses, exceto se mantidas as mesmas condições do contrato anterior.

Embora a Estácio afirme que os novos contratados serão via CLT, a demissão em massa reacendeu o temor de funcionários dos mais diversos setores de serem demitidos para dar lugar a trabalhadores terceirizados, como parte das mudanças permitidas pela Reforma Trabalhista. Rosales afirma que, embora a medida seja permitida, não deve acontecer em larga escala. “Demitir para contratar novas pessoas em larga escala é um risco à qualidade do serviço e traz um grande custo de capacitação e treinamento, o que torna esse tipo de decisão pouco comum no meio empresarial”, afirma Rosales.

A atual gestão da Estácio tem acertado muito mais do que errado, segundo seus investidores. Como as demissões afetarão a qualidade do ensino é uma questão a se observar ao longo de 2018.

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