XP: Benchimol diz que nada - nem ele, nem a empresa - mudou: "a desbancarização continua inabalada" (Germano Lüders/Site Exame)
Estadão Conteúdo
Publicado em 15 de maio de 2017 às 11h17.
São Paulo - A XP Investimentos, maior corretora independente do País, surpreendeu o mercado na semana passada ao vender parte de seu capital ao Itaú Unibanco, maior banco privado do País.
O espanto veio por dois motivos: a empresa vinha preparando seu IPO (oferta inicial de ações, na sigla em inglês) e, principalmente, havia crescido de forma acelerada nos últimos anos ancorada no discurso de desbancarização.
Sob o olhar desconfiado do mercado, a XP fez questão de frisar que o Itaú não terá voz no comando da corretora, já que os papéis com direito a voto continuam, pelo menos até 2023, com o fundador Guilherme Benchimol e seus sócios originais.
O discurso foi reforçado por Candido Bracher, presidente do Itaú, em conversa com analistas na sexta-feira, 12.
À reportagem, Benchimol diz que nada - nem ele, nem a empresa - mudou: "a desbancarização continua inabalada", "eu estou aqui, igualzinho", "(o negócio da XP) continua sendo (roubar clientes dos bancos)". A seguir, trechos de entrevista.
Quando a negociação com o Itaú se tornou mais interessante que a abertura de capital?
Quando decidimos abrir capital, a premissa era buscar dinheiro e ter a máxima governança possível, porque a gente trabalha com investimento.
Quem mexe com investimento tem de expor credibilidade. Quando a gente faz o negócio com o Itaú, a gente endereça todas essas questões (credibilidade e governança). Abrir capital é um desafio enorme. Há momentos em que a ação cai com as crises.
Aí aparece uma oportunidade para captar dinheiro a um preço parecido com o que achávamos que íamos captar no mercado, podendo continuar com capital fechado, e o sócio ainda agrega mais credibilidade do que o mercado. A gente tem o melhor dos mundos, né?
A XP sofre com falta de credibilidade?
Quando se pensa em investimento no Brasil, se pensa em banco, não em corretora. A gente endereçou muita credibilidade, não é à toa que temos R$ 85 bilhões (incluindo varejo e corporativo) sob custódia.
Mas um terço do que o cliente (da corretora) tem de investimento está na XP. Os outros dois terços não estão porque ainda tem um 'preconceitozinho'.
A XP cresceu muito com o apelo de desbancarização. Vocês vão mudar de discurso?
Não. A desbancarização e a minha crença de que o cliente investe melhor fora dos bancos continuam inabaladas. Os bancos no Brasil são plataformas fechadas, não são focados em investimento.
Na XP, a gente é aberto (vende papéis de diferentes instituições) e foca em investimento. Isso nos faz mais competentes nesse segmento.
Dá para falar em desbancarização tendo o maior banco privado do País como sócio?
Desbancarização de investimentos. A gente não muda o discurso. Você tem de pagar conta, ter cartão de crédito. Não tem como não ter conta em banco.
Mas se você investir fora dos bancos, em um lugar como a XP, vai ter mais opções, vai poder comparar produtos de todo o mercado.
Nos bancos, normalmente são vendidos apenas produtos com a marca própria. O Itaú percebeu na frente de seus concorrentes que essa é a tendência. Não é difícil de se imaginar que um lugar onde a pessoa pode investir com liberdade é melhor.
O negócio da XP era roubar os clientes dos bancos...
Continua sendo.
O Itaú não perde com isso?
Sim (perde).
O que o Itaú ganhou então ao fechar o negócio?
Somos novos e vamos crescer. O Itaú quis apostar nesse novo. Talvez o jeito dos bancos seja antiquado. O ambiente atual é moderno. O Itaú, nos vendo, quis entrar nesse projeto. Ele nos vê como algo em que pode ter retorno.
Como sócio, o Itaú perde menos. É isso?
A gente tira (clientes) dos outros (bancos), né? A gente tira dos demais bancos que competem com o Itaú. Ele perde, mas com compensação.
Como vocês vão conseguir continuar independentes com essa base acionária?
Quem tem o capital votante somos nós. Eles são investidores. Não estou alinhado com os interesses do Itaú, estou alinhado em fazer nosso modelo de negócio continuar crescendo.
Não há risco de fuga de clientes que estavam com vocês justamente pelo discurso da desbancarização?
Por que as pessoas não gostam dos bancos? Porque tem taxa cara e produto ruim. Por que as pessoas gostam da gente? Porque o serviço é bacana. Nada disso vai mudar. Eu estou aqui, igualzinho, só tenho um novo acionista, que é o Itaú, que não tem interferência na condução da companhia.
Mas, se de um lado a credibilidade do Itaú interfere no negócio, o peso de ter um banco como acionista não vai interferir?
O Itaú como banco é espetacular. Mas, do ponto de vista de investimento, talvez existam outros caminhos. A gente é um deles. Eles vão entrar como sócios porque querem competição. A nossa vontade de crescer vai tirar o Itaú e todo mundo da zona de conforto. Tenho certeza de que a visão dos controladores do Itaú é criar uma competição que faça os dois serem melhores que os demais.
Os bancos de porte médio estão desconfortáveis porque a XP negocia os CDBs deles. Qual a resposta a eles?
Mudança sempre traz desconforto, mas já os comunicamos que o controle segue nosso. O que está na mesa são os interesses da XP, não os do Itaú.
Além dos bancos, tem dois agentes desconfiados: os funcionários da XP...
A primeira reação foi 'que é isso'? Depois que a pessoa entende, pergunta: 'como é que vocês conseguiram'? Estamos no melhor dos mundos: tenho a liberdade de controle da empresa e o Itaú me dando credibilidade. Quem acha isso ruim?
E os agentes autônomos? Algumas corretoras afirmam que há agentes procurando interessados em mudar de empresa preocupados com a possibilidade de serem trocados pelas agências do Itaú.
Isso não faz sentido. Não tem nenhuma integração entre XP e Itaú. Os agentes podem crescer mais do que tudo agora. Tem uma frase ótima: 'se o Itaú quer investir o dinheiro deles com a gente, se o Itaú confia tanto na gente que está vindo, por que o cliente não vai vir junto?'
O mercado diz que pode acontecer com vocês o que aconteceu com a Ágora, corretora comprada pelo Bradesco em 2008 e que praticamente sumiu. A XP inclusive cresceu no espaço deixado pela Ágora...
Quando o Bradesco comprou a Ágora, ele tirou os antigos donos do comando. O Itaú não entrou aqui para gerir o negócio, entrou como investidor. A gente tinha uma meta audaciosa que era, em dez anos, virar a maior empresa de investimento do Brasil (hoje, a XP tem 2% do mercado) e passar os bancos. Com a credibilidade do Itaú por trás, essa meta passou para cinco anos.
As outras corretoras independentes torciam pelo IPO e o viam como uma chancela para o setor. Com vocês, pela primeira vez, as independentes podiam arranhar os bancos. Isso muda?
Continuo independente, mas optei por ter um acionista diferente. Sigo lutando contra os bancos. Abrir capital traz muita responsabilidade, prefiro gastar energia garantindo que a empresa cresça mais e melhor. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.