A mineradora enfrenta a opinião pública em meio a uma geração de caixa expressiva (Washington Alves/Reuters)
Juliana Estigarribia
Publicado em 1 de agosto de 2019 às 16h13.
A mineradora Vale está entre a cruz e a espada. Ao mesmo tempo em que administra os danos causados pelo rompimento da barragem de Feijão, em Brumadinho, a empresa precisa enfrentar a opinião pública, diante do aumento expressivo da sua geração de caixa: o crescimento exponencial decorre justamente dos desdobramentos da tragédia em Minas Gerais.
A companhia saiu de um lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) ajustado negativo em 652 milhões de dólares no primeiro trimestre deste ano para 3 bilhões de dólares positivos de abril a junho.
O resultado foi influenciado pela alta dos preços do minério de ferro desde o rompimento da barragem. A Vale precisou cortar capacidade de produção para se adequar às exigências do poder público e, com isso, afetou o equilíbrio entre oferta e demanda global, em um momento que a China, maior consumidor do mundo, vem elevando suas compras.
Diante desse quadro, os preços da commodity tiveram uma valorização de quase 50% desde o dia 25 de janeiro, girando hoje em torno de 120 dólares a tonelada. Com 400 milhões de toneladas de minério de ferro de capacidade produção, a Vale é a maior do mundo em seu mercado.
Ou seja: a tragédia tem feito um bem danado ao balanço da Vale. E isso, claro, pode ser um problema de imagem. No primeiro trimestre, a receita líquida da companhia foi de 30 bilhões de reais; de abril a junho, de 35 bilhões de reais. Para o terceiro trimestre, analistas estimam 42 bilhões. Já a geração de caixa esperada de julho a setembro é de 22 bilhões de reais, ante 11,4 bilhões no intervalo imediatamente anterior.
Tanto no primeiro quanto no segundo trimestre os bons resultados não chegaram à última linha do balanço pelos bilhões reservados para as reparações de Brumadinho e mais custos com descomissionamento de uma barragem e aportes na Fundação Renova, responsável pelas reparações do rompimento em Mariana. A nova leva de provisões em Brumadinho, no segundo trimestre, não era esperada por analistas, que projetavam um lucro na casa dos 2,5 bilhões de dólares – veio um prejuízo de 133 milhões de dólares.
Dos 23 bilhões de reais totais provisionados até o momento para cobrir os custos com os desdobramentos da tragédia, cerca de 15 bilhões serão aplicados com reparações às vítimas e, o restante, para adequação de barragens, informou a companhia.
A partir do terceiro trimestre, o valor de provisões deve sair do balanço, e escancarar o ótimo momento financeiro da Vale. “A partir de agora, se houver algum tipo de provisionamento, serão mudanças marginais”, afirmou nesta quinta-feira, 1º, Luciano Siani, diretor de relações com investidores da Vale, em teleconferência com analistas.
Em paralelo, a tendência é que os números da mineradora se mantenham fortes, diante de uma demanda relativamente estável no mundo e dos cortes de oferta na Austrália, principal concorrente do Brasil em minério de ferro.
É uma situação que vai exigir mais da retórica dos executivos da companhia. Nesta quinta-feira, o tom durante a conferência com analistas era o mesmo do início do ano, logo após a tragédia: repetição do discurso de preocupação quase que exclusiva com a reparação às vítimas. “Trabalhamos para ser a mineradora mais segura do mundo e estamos no caminho para reparar de forma justa e rápida a todos que foram atingidos em Brumadinho”, disse o CEO da Vale, Eduardo Bartolomeu.