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Na Uber, uma questão de reputação

Michele Loureiro A julgar pelos números, 2016 foi um ano espetacular para a empresa de mobilidade Uber no Brasil. O número de usuários regulares saltou de 1 milhão para 8,7 milhões, o número de motoristas passou de 10.000 para mais de 50.000, em 40 cidades. Nessa toada, o Brasil virou o terceiro maior mercado para […]

UBER: representantes do governo Michel Temer sinalizaram que esperam que o Senado não aprove o projeto que, na prática, proibiria o transporte particular de passageiros por aplicativos, como faz o Uber / Victor J. Blue / Getty Images

UBER: representantes do governo Michel Temer sinalizaram que esperam que o Senado não aprove o projeto que, na prática, proibiria o transporte particular de passageiros por aplicativos, como faz o Uber / Victor J. Blue / Getty Images

DR

Da Redação

Publicado em 11 de janeiro de 2017 às 11h57.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h30.

Michele Loureiro

A julgar pelos números, 2016 foi um ano espetacular para a empresa de mobilidade Uber no Brasil. O número de usuários regulares saltou de 1 milhão para 8,7 milhões, o número de motoristas passou de 10.000 para mais de 50.000, em 40 cidades. Nessa toada, o Brasil virou o terceiro maior mercado para a empresa, atrás de Estados Unidos e Índia.

Mas, em meio ao cenário promissor, a companhia vem enfrentando uma situação nova no país – a qualidade do serviço vem sendo cada vez mais contestada. Nos últimos 30 dias, a empresa foi a nona no ranking nacional de queixas do portal Reclame Aqui com quase 5.000 reclamações. Os problemas vão desde questionamentos sobre a tarifa dinâmica, erros de login, problemas com troco para pagamentos em dinheiro, até comportamento inapropriado dos motoristas. Em 2015, a Uber mantinha um status de reputação boa no site, que recebe cerca de 600.000 acessos diários, e agora o conceito está classificado como regular.

Nos últimos meses, episódios de assédio, discussões, estafa e despreparo dos profissionais e até casos de polícia entre motoristas e passageiros foram relatados em sites e jornais. Para piorar, os motoristas passaram a ser alvo de bandidos. Em dezembro, um motorista foi assassinado por falsos clientes em Goiás; outro foi morto a tiros dentro do carro, em um lava jato em Curitiba; na semana passada, outra morte, a facadas, em São Paulo. Os episódios ainda estão sendo investigados, e podem não ter ligação com a atividade prestada para a companhia. A Uber não comenta os casos.

Ainda assim, na última semana a companhia anunciou a cobrança de uma taxa de 0,75 real para cada viagem em todo o Brasil. Segundo a companhia, o custo fixo será “destinado para apoiar iniciativas de segurança para motoristas parceiros e usuários, além de outros custos operacionais”.

Esses episódios, evidentemente, vão muito além dos limites da empresa – são um retrato da violência crônica que toma conta do país. Mas a violência também se insere em outro tipo de problema – as dores do crescimento, comuns a quaisquer empresas que multiplicam de tamanho num intervalo de tempo curto. “O tipo de resposta que a Uber dará a esses casos é que mostrará sua capacidade de continuar como um player importante no país. A concorrência, como a Cabify, já está se aproveitando dessas brechas para crescer e atrair profissionais”, diz Marcos Bedendo, professor de Branding da ESPM..

Segundo Guilherme Telles, diretor geral da Uber no Brasil, há um controle rígido na qualidade dos serviços prestados pela empresa e a nota média de avaliação dos motoristas no Brasil continua estável em 4.8 pontos. “O que acontece é que a demanda cresce muito, então novos motoristas entram na plataforma constantemente para garantir que os usuários tenham um carro. Na prática, com mais motoristas entrando toda semana existe a chance de você pegar alguém que acabou de entrar na plataforma. Com os feedbacks e as notas, eles se adequam à demanda e ficam com uma média boa”, explica. “E, óbvio, motoristas que ficam abaixo da média de 4.6 são desligados da plataforma”, diz.

Telles afirma que há um monitoramento constante dos motoristas e até de passageiros que recebem notas ruins e infringem os termos de uso. A companhia não divulga o número de profissionais descadastrados por não prestarem um bom serviço.

Entre os motoristas, a percepção é que as punições não são rígidas e que a qualidade do serviço caiu. Um dos motoristas do aplicativo conta que em oito meses de Uber soube apenas de um caso em que um colega perdeu o direito de dirigir. “Somos constantemente avisados quando a média não é boa. Recentemente começaram até a mandar vídeos de boas práticas, mas sei de muitos casos que o motorista é ruim”, diz.

Para dar conta da demanda alta, a Uber sempre fez um cadastro simples dos motoristas interessados em virar parceiros. As exigências limitam-se a carteira de habilitação com licença para exercer atividade remunerada e checagem de antecedentes criminais. Os carros precisam estar com a documentação em dia e ter no máximo oito anos de uso. “Nos orgulhamos de ser uma plataforma inclusiva, que permite que as pessoas possam apertar um botão e encontrar uma forma digna e acessível de gerar renda, independente de gênero, classe social, econômica ou idade”, diz Telles. A empresa fica com percentuais que variam de 10% a 30% de cada corrida, dependendo do formato do serviço.

Segundo Alexandre Diogo, presidente do Instituto Ibero-Brasileiro de Relacionamento com o Cliente (IBRC), as queixas são de fato consequência do crescimento da empresa, mas a qualificação total ainda é positiva. “A empresa ficou entre as dez melhores no conceito dos consumidores em 2015 e permaneceu nesse status em 2016, de acordo com as nossas pesquisas”, diz. Segundo ele, o tempo de resposta do aplicativo ficou mais rápido, passando de seis para quatro horas. “Podemos notar que eles estão preocupados em responder os consumidores”, diz.

Em uma tentativa de melhor sua imagem, a Uber, que passa por dificuldades de regulamentação em muitos municípios, lançou esta semana o Uber Movement, um serviço de monitoramento do trânsito que usa dados da empresa para ajudar planejadores urbanos a tomarem decisões sobre o trânsito. Uma espécie de Waze e Google Maps para auxiliar o poder público e empresas que dependem do tráfego. Ainda que experimental e não disponível no Brasil por enquanto, a iniciativa acena para estratégia de fazer parte da solução – e não do problema da mobilidade.

Mesmo com os desafios, a aposta da Uber é continuar crescendo em 2017. O diretor da companhia não revela números, mas garante que uma das apostas é o UberEATS, serviço apresentado no final de 2016 que já está funcionando em alguns bairros de São Paulo. Uma parceria com restaurantes permite que usuários peçam comida e paguem com um só toque. Esta pode ser uma das saídas para a empresa caso a economia dê sinais de recuperação, o desemprego diminua e haja uma queda no número de motoristas em tempo integral – uma realidade em diversos outros países.

Também seria uma forma de lidar com uma concorrência crescente – na semana passada, a 99 anunciou um aporte de 320 milhões de reais da Didi Chuxing, empresa chinesa de transporte que deve ser a principal concorrente da Uber mundo afora. Na China, na impossibilidade de concorrer, a Uber acabou se aliando à Didi.

“Os restaurantes usam a plataforma da Uber para encontrar o entregador mais próximo e os parceiros ganham mais uma oportunidade de gerar renda em horários flexíveis. A intenção é tornar a experiência de pedir comida pelo celular tão simples quanto a de pedir um carro”, afirma Telles. Agora, além de motoristas, a Uber ainda se preocupará com entregadores de comida.

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