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Para não afundar, Maldivas aposta em plano ambiental e no sucesso da COP26

Ao mesmo tempo em que as mais de 203 ilhas habitadas do país têm a natureza como convite para o turismo, a nação enfrenta um futuro ambiental preocupante. Pare mitigar o risco, governo e resorts lançam leis e programas de proteção

Vista aérea do Anantara Kihavah, resort das Maldivas. (Anantara/Divulgação)

Vista aérea do Anantara Kihavah, resort das Maldivas. (Anantara/Divulgação)

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Julia Storch

Publicado em 30 de outubro de 2021 às 06h00.

Última atualização em 8 de novembro de 2021 às 10h26.

Destino de lua de mel conhecido pelas águas azul turquesa, areias brancas e mergulhos para avistar corais, tartarugas, tubarões e raias, as Maldivas enfrentam drama: suas ilhas podem afundar. Nem todos os turistas conhecem os desafios que as o país insular, de apenas 500 mil habitantes, enfrenta contra o aquecimento global.

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Ao mesmo tempo em que as mais de 203 ilhas habitadas do país têm a natureza como convite para o turismo, a nação enfrenta um futuro ambiental preocupante, visto que 80% das ilhas estão a apenas 1 metro acima do nível do mar. Além disso, 90% das 1.190 ilhas já apresentam algum grau de inundação.

“Se as temperaturas continuarem a aumentar, os cientistas dizem que as Maldivas ficarão completamente submersas nos próximos 50 anos”, comenta Emilia Fulgido, bióloga marinha e gerente de sustentabilidade dos resorts Anantara Dhigu Resort, Anantara Veli Resort & Naladhu Private Island.

Para não sucumbirem a esse destino catastrófico, as Maldivas dependem de um acordo climático bem-sucedido entre potências mundiais, o que pode ser alcançado na COP26, a Conferência do Clima da ONU, que começa neste domingo, 31. O arquipélago localizado no Oceano Índico, porém, não está sozinho na missão contra o desaparecimento. Junto às Maldivas, estão 38 países membros da ONU e 20 não membros, que compõem o SIDS (Small Island Developing States), grupo de pequenas nações insulares que representa 65 milhões de pessoas, menos de 1% da população mundial.  A EXAME estará em Glasgow e fará a melhor cobertura da COP26. Acompanhe! 

Isoladas geograficamente, essas nações dependem do mercado externo para o abastecimento, pagando alto por bens de consumo. Segundo a ONU, diversos fatores colocam as pequenas nações insulares em risco. “O pequeno tamanho populacional, o afastamento dos mercados internacionais, altos custos de transporte, vulnerabilidade a choques econômicos exógenos e frágeis ecossistemas marinhos e terrestres tornam os SIDS particularmente vulneráveis ​​à perda de biodiversidade e às mudanças climáticas.”

A “Cidade da Esperança”

A primeira parada ao chegar no país é na capital Malé. Impressiona a vista aérea, com três ilhas conectadas por uma ponte. Olhando no mapa, a ilha em que fica o aeroporto internacional Velana se aproxima em tamanho dos 2,5 quilômetros quadrados que abrigam 130 mil habitantes na capital.

Conectada a Malé por uma ponte está outra ilha, Hulhumalé, construída artificialmente com areia bombeada do fundo do oceano. Apelidada de “Cidade da Esperança”, o local começou a ser construído em 1997 a fim de acolher a população e oferecer maiores oportunidades de emprego e lazer, visto que a capital tem uma das maiores densidades populacionais do mundo e alta taxa de desempregos entre jovens, 15%, de acordo com o relatório Banco Mundial de 2020.

A ilha artificial Hulhumalá, conhecida como a "cidade da esperança", nas Maldivas. (Mauroof Khaleel)

O planejamento sustentável impera na ilha, que pretende acomodar 240 mil pessoas até o fim desta década. Por lá, os ônibus são elétricos e ciclovias atravessam paisagem. Os sistemas de água, eletricidade, incêndio e esgoto estão sendo atualizados para os modelos de cidades inteligentes.

O turismo local também é incentivado, com mais de cem hotéis butiques e atrações aquáticas e gastronômicas disponíveis. Turistas brasileiros não precisam de visto e comprovante de vacinação contra a covid-19 para entrar no país, mas é preciso apresentar um atestado de PCR negativo para o coronavírus.

Cercada pelo oceano, mas sem água potável

Outro obstáculo das Maldivas é a obtenção de água doce. Cercado pelo oceano e sem rios ou lençóis freáticos, o abastecimento de água potável no país acontece através do processo de dessalinização, o qual retira o sal da água do mar.

Segundo a ONU, porém, para cada litro de água potável produzido, 1,5 litro de líquido poluído com cloro e cobre é criado. O descarte do resíduo precisa ser controlado, para evitar a degradação da fauna e flora marinha.

Além das Maldivas, Bahamas e Malta também utilizam o processo para suprir as necessidades. Segundo a organização, 50% da água potável da Arábia Saudita é obtida por meio da dessalinização.

Outro ponto de preocupação é a temperatura da água. Em 1998, o fenômeno El Niño aumentou a temperatura do mar em 4 °C, acabando com mais de 90% dos recifes de coral rasos no país. O coral se regenerou significativamente desde que sofreu o evento de branqueamento; no entanto, flutuações de temperatura ameaçam sua sobrevivência.

Fenômeno frequente, em 2016, 60% dos corais das Maldivas foram perdidos por branqueamento causado pelo aumento da temperatura do mar. E com o aquecimento global, esses picos de temperatura estão ocorrendo com cada vez mais frequência.

O país também corre contra o tempo para limitar a poluição dos mares. Uma das iniciativas do governo foi a aprovação de uma lei que proibirá plásticos de uso único em todo o país até 2025, e a importação de sacolas plásticas. No início deste ano, a Câmara Municipal de Addu (localizada em Addu Atoll, Maldivas) aprovou uma lei que proíbe o uso único de plásticos em seu atol.

Atuações dos resorts para a preservação ambiental

Em 2016, 60% dos corais das Maldivas foram perdidos por branqueamento causado pelo aumento da temperatura do mar. (Anantara/Divulgação)

Ao se hospedar nos resorts da rede Anatara, nota-se algumas medidas, como o não uso de plástico em nenhum dos amenities dos hotéis. As garrafas de água do quarto são de vidro, assim com as San Pellegrino servidas nos bares e restaurantes.

Isolada no Oceano Índico, a maioria dos insumos é importada. Manteiga e ostras frescas vêm da França, as frutas do Sri Lanka e Tailândia e as vieiras, do Canadá. Produtos locais também são oferecidos nos menus, para uma pegada de carbono menor, pescados frescos do dia como atum e garoupa são altamente recomendados.

Para manter as ilhas no mapa, os resorts investem em tecnologia e programas de sustentabilidade. No resort Niyama, foi adquirido um conversor de biodiesel, que transforma óleo de cozinha em biodiesel. O combustível é usado em tratores, incineradores e até mesmo nas tochas tiki que adornam jantares na praia. O biodiesel é uma alternativa ecologicamente correta e não produz gases de efeito estufa. O resort também faz parcerias com ilhas vizinhas para converter o óleo usado.

Em 2010, foi lançado o programa de adoção de corais, uma atração turística que visa acelerar a regeneração do ecossistema de recife. Acompanhados de um biólogo, os hóspedes prendem fragmentos de corais em uma corda, que é movida para o berçário subaquático. Após os corais atingirem um certo tamanho, a corda é movida para o recife ou para as trilhas de mergulho. Os valores variam entre 185 dólares, apenas para o patrocínio e 247 dólares, incluindo o patrocínio e plantio.

“Convidamos os hóspedes a participarem do projeto de longo prazo, plantando corais no viveiro de recifes e acompanhando seu crescimento com atualizações de fotos ou revisitas”, explica a bióloga marinha do resort Niyama, Philippa Darbyshire-Jenkins. Também acontecem oficinas de conservação do oceano com crianças e escolas próximas.

No final de 2019, Andy Bruckner, do Coral Reef CPR (ONG dos EUA), passou um tempo no resort Niyama e realizou uma pesquisa de recife de coral onde o coral “Bird's Nest” foi descoberto entre Niyama e Maeenbhoodo. Este coral estava extinto nas Maldivas desde 1998.

“Estamos vendo sinais lentos de recuperação nos recifes das Maldivas, mas é da maior importância que todos façam sua parte em casa, mesmo não vivendo nas Maldivas, para sermos mais sustentáveis ​​e ecologicamente corretos”, finaliza Darbyshire-Jenkins.

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