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Lojas gigantes mostram que não é só o e-commerce que acaba com shoppings

A cada década que passa, os americanos gastam proporcionalmente menos renda em coisas e mais em serviços, como educação e entretenimento

Macy's (EUA) (Michael Nagle/Bloomberg)

Macy's (EUA) (Michael Nagle/Bloomberg)

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Da Redação

Publicado em 26 de fevereiro de 2020 às 08h00.

Última atualização em 26 de fevereiro de 2020 às 08h00.

Tem sido uma década difícil para as lojas físicas, e as coisas só parecem estar piorando.

Apesar de uma forte economia de consumo, os varejistas fecharam mais de nove mil lojas em 2019 – mais do que o total de 2018, que já havia superado o recorde de 2017. Só neste ano, mais de 1.200 fechamentos foram anunciados, incluindo 125 lojas da Macy's.

Algumas pessoas chamam o que acontece com o cenário de compras de "o apocalipse do varejo". É fácil culpar a ascensão do e-commerce, que prospera enquanto as lojas físicas passam por dificuldades. E não há como negar que a Amazon e outros varejistas on-line mudaram radicalmente o comportamento do consumidor ou que grandes varejistas como Walmart e Target tentaram reforçar sua própria presença on-line.

Mas isso pode ser um exagero.

Para começar, mesmo que o e-commerce esteja crescendo acentuadamente, ele pode não ser tão grande quanto pensamos. O Census Bureau mantém o controle oficial. As vendas on-line cresceram tremendamente nos últimos 20 anos, passando de US$ 5 bilhões para quase US$ 155 bilhões por trimestre. Mas as compras pela internet ainda representam apenas 11 por cento de todo o total de vendas no varejo.

Além disso, mais de 70 por cento desses gastos nos Estados Unidos estão em categorias que tiveram uma penetração lenta da internet, seja por causa da natureza do produto ou por causa de leis ou regulamentos que regem a distribuição. Isso inclui automóveis, gasolina, reformas domésticas e suprimentos de jardim, drogas e farmácia, alimentos e bebidas.

Coletivamente, três grandes forças econômicas tiveram um impacto ainda maior nas lojas físicas do que a internet.

Em nenhuma ordem em particular, aqui estão elas:

– Grandes cadeias de lojas: nos Estados Unidos e em outros lugares, não compramos mais nos mesmos lugares – nós nos afastamos de lojas menores como as de shopping centers e optamos por lojas autônomas de grandes cadeias. Há quatro anos, Chad Syverson e Ali Hortacsu, economistas da Universidade de Chicago, analisaram a história recente do varejo e descobriram que o aumento de armazéns e supercentros era maior que a ascensão do comércio on-line.

Eles deram este exemplo revelador: nos 14 anos até 2013, a Amazon fez US$ 38 bilhões em vendas, enquanto o Costco fez US$ 50 bilhões e a divisão Sam's Club do Walmart, US$ 32 bilhões. A Amazon teve a maior taxa de crescimento, mas o maior problema para a maioria das lojas físicas eram as grandes lojas físicas. Isso continuou em 2019.

– Desigualdade de renda: o aumento da desigualdade de renda pôs menos dinheiro nas mãos da classe média, e as lojas tradicionais de varejo que a atendem sofreram. O Centro de Pesquisa Pew estima que, desde 1970, a parcela da renda do país obtida por famílias da classe média caiu de quase dois terços para cerca de 40 por cento. Portanto, não é surpresa que os varejistas que buscam as extremidades da distribuição de renda – pessoas de alta renda e pessoas de baixa renda – tenham contabilizado praticamente todo o crescimento da receita do varejo, enquanto as lojas voltadas para a média mal cresceram, de acordo com um relatório da Deloitte.

À medida que a concentração de renda no topo aumenta, o varejo global sofre, simplesmente porque as pessoas desse segmento economizam uma parcela muito maior de seu dinheiro. O governo relata os gastos de diferentes níveis de renda na Pesquisa Oficial de Despesas do Consumidor. Nos dados mais recentes, os dez por cento no topo economizaram quase um terço de sua renda após descontados os impostos. As pessoas no meio da distribuição de renda gastaram cem por cento dela. Assim, à medida que a classe média ia sendo espremida e mais dinheiro ia para o topo, isso significou poupanças mais altas em geral.

– Serviços em vez de coisas: a cada década que passa, os americanos gastam proporcionalmente menos renda em coisas e mais em serviços. Lojas, shoppings e até mesmo os comerciantes on-line mais poderosos continuam sendo os grandes vendedores de coisas. Desde 1960, passamos de cinco por cento de gasto da nossa renda em saúde para quase 18 por cento, mostram as estatísticas do governo. Gastamos mais em educação, entretenimento e todos os tipos de outros produtos que não são vendidos em lojas tradicionais de varejo.

Essa tendência continuou por muito tempo. A Pesquisa de Despesas Correntes do governo federal remonta a mais de um século. Em 1920, os americanos gastavam mais da metade de sua renda com alimentos (38 por cento) e vestuário (17 por cento), e quase tudo isso era consumido em lojas tradicionais de varejo. Hoje, a comida consumida em casa e fora dela representa dez por cento dos gastos, e as roupas, apenas 2,4 por cento.

Economistas debatem teorias sobre as razões para optarmos por serviços e nos afastarmos de bens materiais, mas ninguém questiona que isso seja um fato. Significa que, com o tempo, os varejistas que vendem coisas terão de se esforçar cada vez mais só para continuarem existindo.

Em suma, as forças amplas que atingem o varejo são mais uma lição de economia do que do poder da tecnologia disruptiva. Essa é a lição que todos os varejistas terão de aprender um dia – até mesmo a poderosa Amazon.

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