O empresário Marcus Teles, presidente da livraria Leitura (Alexandre Resende / NITRO/Exame)
Mariana Desidério
Publicado em 8 de janeiro de 2022 às 08h00.
Última atualização em 11 de janeiro de 2022 às 13h14.
A Livraria Leitura, maior rede de livrarias no varejo físico do país, está avançando nas vendas online, um território dominado pela gigante Amazon. A loja virtual da companhia já responde por cerca de 7% das vendas totais, e vende mais do que qualquer unidade física da rede.
Porém, a disputa na venda de livros online é dura. “O difícil é ganhar dinheiro no digital. Nossa meta é ir crescendo de forma saudável, no azul. Tem empresas de grande porte que dão muito desconto, vendem praticamente abaixo do custo. Nós não vamos entrar nessa concorrência de crescer com prejuízo”, afirma Marcus Teles, presidente da Leitura.
Para se manter competitiva nesse mercado, a Leitura aposta na variedade de títulos e na capilaridade de sua rede. Também tem buscado se alinhar às tendências de omnicanalidade, com opções como pedir no site e buscar na loja. Hoje a companhia tem lojas em 21 unidades da federação, o que permite oferecer entrega rápida para destinos distantes do eixo Rio-São Paulo, usando as lojas como pontos de apoio logístico.
“Temos a vantagem de estar mais próximos e entregar mais rápido. Se o consumidor fizer uma compra no norte de Manaus, ou no Amapá, pode demorar mais de duas semanas para receber. No nosso caso, conseguimos entregar antes, porque temos as lojas”, diz Teles.
Fundada em 1967 em Belo Horizonte, a Leitura resistiu à tendência das vendas online. Após uma primeira experiência, a companhia chegou a encerrar sua loja virtual em 2015, após avaliação de que as vendas pela internet geravam receita, mas não havia margem. O problema se agravou com o crescimento da Amazon no Brasil, e sua estratégia de descontos agressivos.
A Leitura voltou a vender pela internet em 2019, pouco antes da pandemia. No período em que as lojas físicas ficaram fechadas, as vendas pela internet foram fundamentais para o negócio, e continuam crescendo mesmo com a reabertura das lojas físicas. Só em 2021, as vendas na loja online se multiplicaram por cinco.
A estratégia da Leitura para o varejo online se assemelha à adotada para crescer nas lojas físicas. A rede ganhou espaço ao abrir lojas em regiões mais distantes dos grandes centros econômicos e pouco visadas por livrarias como Cultura e Saraiva. Agora, tem nessas mesmas regiões uma fortaleza também para o varejo online.
Outro ponto que aproxima as estratégias é a preferência por crescer “no azul”, ou seja sem perder dinheiro para ganhar mercado. Do mesmo modo, a expansão de lojas físicas da Leitura foi feita na maior parte com capital próprio e olhar atento à rentabilidade das unidades.
A avaliação de Teles é que há espaço tanto para as vendas na loja física quanto para as vendas online. “São vendas de produtos e momentos diferentes. Os lançamentos, por exemplo, são vendidos 70% nas lojas físicas, porque é um livro que o cliente ainda não conhece”, diz.
A Livraria Leitura abriu 14 novas lojas em 2021, e expandiu outras 4. Fechou o ano com 94 unidades, se consolidando como maior rede de livrarias do país. A empresa não abre faturamento, mas estimativas de mercado indicam uma receita anual da ordem de 400 milhões de reais. A expansão de lojas no ano passado superou com folga a meta inicial, que era abrir 8 unidades no ano.
“Apareceram muitas oportunidades. Outras livrarias fecharam lojas nesse período e a Leitura tinha reserva, não tinha dívidas, aproveitamos o momento para crescer”, afirma. Pelo mesmo três novas lojas foram abertas em espaços antes ocupados pelas concorrentes, além das unidades inauguradas em shoppings de onde as concorrentes saíram.
As vendas nas lojas físicas da Leitura fecharam 2021 perto dos níveis pré-pandemia, com exceção das lojas em aeroportos e regiões mais comerciais, em que o movimento ainda não se recuperou totalmente. Para 2022, a meta é abrir mais oito lojas, e terminar o ano com 102 unidades. Nas vendas online, a expectativa é crescer, mas as vendas não devem passar de 10% do total.
Além de comandar a rede de livrarias, Teles foi eleito em dezembro presidente da Associação Nacional das Livrarias (ANL). Dentre as principais bandeiras da entidade em sua gestão está a defesa da isenção fiscal dos livros.
Outro tema importante para a entidade é o projeto da Lei Cortez, que, dentre outros pontos, institui um limite para descontos em livros lançados recentemente. O projeto de lei propõe limitar em 10% o desconto em livros no primeiro ano do lançamento, o que, segundo Teles, representa menos de 7% do total de título vivos no país.
“Apoiamos esse projeto. É um modo de evitar que algumas empresas joguem o preço para baixo e estraguem o mercado atuando próximo da ilegalidade. Eles vendem o livro um pouco acima do custo, mas dão frete grátis o que na prática significa que está abaixo do custo”, afirma.
A eleição de Teles à presidência da ANL representa um olhar mais pragmático para segmento, com atenção especial à saúde financeira em um mercado escaldado pela derrocada de grandes redes.
Para manter a operação no azul, mais da metade das lojas da Leitura conta com a figura do gerente-sócio, um modelo que começou na família. O fundador, Emidio Teles de Carvalho, tem 14 irmãos, cinco dos quais atuam hoje no negócio. O próprio Marcus Teles entrou na sociedade ao ganhar de presente do irmão uma participação de 10% em uma das unidades.
Hoje, boa parte dos gerentes-sócios são funcionários que se destacaram na empresa. O modelo permite agilidade na gestão e faz com que cada unidade adquira uma cara própria.
A Leitura também tem o costume de fechar uma loja por ano, encerrando rapidamente as unidades deficitárias — o que fez com que chegasse à pandemia em boa situação para aproveitar as oportunidades da crise.