Fernanda Cubiaco é CEO da consultoria Bota pra Girar (Bota pra Girar/Divulgação)
EXAME Solutions
Publicado em 19 de março de 2024 às 14h30.
Última atualização em 19 de março de 2024 às 15h05.
Com quatro unidades no Rio de Janeiro, a Torta & Cia resolveu, no ano passado, se debruçar sobre um enorme problema que inúmeros empresários do ramo fingem não existir: o volume nada desprezível de lixo produzido por empreendimentos do gênero. Na ativa desde 1989, a rede contratou a consultoria Bota pra Girar, especializada no assunto, para encontrar maneiras mais inteligentes de descartar o próprio lixo. Resultado: em seis meses, a conta de lixo da Torta & Cia diminuiu 40%.
Como? Conhecida pelas tortas caseiras, a rede passou a dar a devida atenção para a separação dos diversos tipos de lixo. O material orgânico, por exemplo, como restos de alimentos e guardanapos de papel, correspondia à maior parte do volume que era descartado como lixo comum. Ajustes feitos, o passo seguinte foi revisar o contrato estabelecido com a companhia responsável pela coleta dos sacos que terminam nos lixões. “Todo empreendimento pode solicitar a revisão desse tipo de contrato da mesma forma que pode alterar o plano de celular com a operadora”, afirma Fernanda Cubiaco, CEO da Bota pra Girar.
Para dar fim a restos de comida, sobras de ingredientes e qualquer tipo de material biodegradável, o melhor caminho — deveria ser o único — é a compostagem. Há empresas especializadas nisso e que se encarregam da coleta para bares, restaurantes e afins. É o caso, no Rio de Janeiro, da VideVerde, da Ciclo Orgânico e da Casca. Cada tonelada de resíduo biodegradável coletada e compostada poupa a emissão de 60 quilos de CO2.
A Bota pra Girar acaba de ser contratada pelo SindRio, o Sindicato de Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro, para traçar um raio X do setor no que se refere à gestão do lixo. O intuito do levantamento é descobrir qual é o destino, exatamente, que os empreendimentos gastronômicos estão dando para cada tipo de descarte e quais são os principais desafios para a adoção de práticas mais sustentáveis. O objetivo final é incentivar a gestão inteligente do lixo em restaurantes e bares.
“Esse é um assunto ainda muito pouco discutido”, diz Sérgio Abdon, diretor executivo do SindRio. “O lixo impacta tanto o meio ambiente quanto a logística e as finanças dos estabelecimentos do nosso setor. Antes de apresentar soluções, porém, precisamos de um diagnóstico do que está sendo feito e saber quais são os desafios que precisam ser superados.”
Ele conta que há restaurantes que dizem que não separam o próprio lixo por falta de espaço para armazenar cada tipo de material. Por outro lado, alguns dizem que não aderem à coleta seletiva porque o dia da coleta não os atendem. “Esse levantamento poderá abrir caminho para soluções financeiramente viáveis para os bares e restaurantes e justas para as cooperativas envolvidas”, resume Abdon.
No levantamento encomendado pelo SindRio, dez estabelecimentos estão sendo esquadrinhados — da rede Gula Gula ao tradicionalíssimo Bode Cheiroso, no Maracanã. Os resultados da pesquisa serão divulgados daqui dois meses. Para evitar saias justas, dados específicos de cada um dos empreendimentos analisados pelo Bota pra Girar não serão revelados.
“Lixo é um gargalo para bares e restaurantes”, observa Cubiaco. “Os empresários que despejam todos os tipos de lixo em sacos pretos, no entanto, estão desperdiçando dinheiro, para não falar do impacto ao meio ambiente”. Ela diz mais: “Todo lixo misturado acaba ganhando um volume muito maior do que ele teria se fosse separado e descartado dessa forma”.
O mais indicado? Manter na cozinha, para começo de conversa, um daqueles galões de plástico, com tampa preta. É onde a brigada deveria depositar todos os alimentos que sobram na fase de pré-produção, além dos restos de comida nos pratos e toda sorte de produtos biodegradáveis, a exemplo de canudos, copos e guardanapos de papel. Caso esse galão não disponha de um pedal de abertura, Cubiaco recomenda deixar o recipiente sem tampa mesmo. “O tempo que ficará aberto é muito curto”, argumenta.
A coleta do tal galão, como é de imaginar, deve ficar a cargo das empresas especializadas em compostagem. O que fazer em dias de não coleta? O ideal é manter o recipiente em uma espécie de câmara fria exclusiva para o armazenamento temporário de lixo — sim, uma área de que pouquíssimos empreendimentos dispõem. “Os arquitetos especializados em projetar cozinhas profissionais não poderiam deixar de prever espaços do tipo”, defende a especialista.
É recomendado manter na cozinha uma lixeira, daquelas tradicionais, sustenta a CEO da Bota para Girar. É onde os funcionários deveriam depositar, única e exclusivamente, aquilo que não pode nem ser reciclado, nem ir para a compostagem. Falamos de esponjas velhas, por exemplo, de panos multiusos e de embalagens repletas de gordura ou de sangue animal.
Esse lixo, sim, deve ser descartado da maneira tradicional. “É um tipo de lixo que corresponde a 15% do volume total gerado por restaurantes e bares”, informa Cubiaco. “Infelizmente, não dá para atingir o lixo zero. Mas dá para adotar boas práticas e diminuir o desperdício”. Nos dias em que o caminhão de lixo não passa, os sacos pretos, destinados aos aterros, também deveriam ser guardados na câmara fria própria para isso.
Por fim, é preciso dar a devida atenção para o material reciclável. Latas e garrafas utilizadas, por exemplo, devem ser armazenadas em separado. E o ideal é que aguardem o dia da coleta no mesmo cômodo que o lixo comum e o lixo que vai para a compostagem. “Isso tudo contribui com a logística dos bares e restaurantes”, lembra Cubiaco. “E, além disso, ajuda a diminuir a pegada ambiental e a combater o desperdício — o que está sendo jogado fora, afinal, fica evidente para todos”.