Negócios

Grupo bilionário do Centro-Oeste investe R$ 100 milhões em suplementos

Holding goiana comanda negócios como a operação da Coca-Cola na região e agora mira o mercado de suplementos com nova fábrica em Anápolis

Nova fábrica da Vitamedic em Anápolis (GO): capacidade instalada é de 1,5 milhão de unidades comerciais por mês (Grupo José Alves/Divulgação)

Nova fábrica da Vitamedic em Anápolis (GO): capacidade instalada é de 1,5 milhão de unidades comerciais por mês (Grupo José Alves/Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 27 de novembro de 2025 às 06h00.

A lógica é simples: se o negócio cresce, o Grupo José Alves quer produzir ele mesmo.

É assim nas bebidas da Coca-Cola, na linha de higiene e limpeza, nos medicamentos — e agora também nos suplementos.

A holding goiana, com presença nacional, operações em onze setores e cerca de 7.000 funcionários, segue um mantra claro: verticalizar para não depender de ninguém.

A mais recente prova dessa filosofia é o investimento de 100 milhões de reais num novo ciclo industrial da Vitamedic, braço farmacêutico do grupo desde 2015.

O montante contempla duas plantas, sendo a principal uma nova fábrica de suplementos e vitaminas em Anápolis, a 60 quilômetros da capital Goiania, construída para atender ao portfólio da TrustFuel, marca premium voltada para consumidores de alta renda, e abrir caminho para novas linhas — como a FourDay, marca de entrada criada para disputar espaço nas farmácias com produtos mais acessíveis.

“O que a gente faz, a gente quer dominar do começo ao fim”, afirma João Ricardo Alves, diretor de novos negócios do Grupo José Alves e membro da terceira geração à frente do negócio. “Se eu puder ter o domínio de todo o ciclo físico e financeiro da cadeia de suprimentos, a execução fica na minha mão — e não de terceiros.”

A nova fábrica é parte de uma guinada estratégica: a empresa começou testando canais com produção terceirizada, mas agora aposta na produção própria como alavanca de crescimento, eficiência e margem.

Quem é o Grupo José Alves

O Grupo José Alves é um daqueles impérios discretos que comandam marcas populares em vários segmentos.

A história começou nos anos 1960, no interior de Goiás, com comércio atacadista de secos e molhados. A virada veio nos anos 1980, quando a família assumiu a franquia da Coca-Cola em Goiás e Tocantins, criando a Refrescos Bandeirantes — hoje o principal negócio do grupo.

“Temos 3 mil funcionários só na operação de bebidas. Atendemos 34 mil pontos de venda. Refrigerante, água mineral, chá — somos líderes em praticamente todas as categorias no nosso território”, afirma João. “E a verticalização está em tudo. Produzimos, distribuímos, investimos em geladeira, vasilhame, logística. A gente quer ter o controle do que entrega.”

O grupo também atua em educação, com instituições de ensino em Goiás, São Paulo e até no exterior; imobiliário, rastreamento de frotas, higiene, embalagens e agora entra com força em suplementos e proteínas.

O faturamento total em 2024 foi de 3,6 bilhões de reais.

No comando atual está José Alves Filho, filho de José Alves, criador do negócio. João Ricardo, por sua vez, é acionista e diretor do grupo.

Da terceirização à produção própria: a virada da Vitamedic

A TrustFuel, marca de suplementos criada em 2023 para o público premium, nasceu com uma estratégia de terceirização.

O objetivo era testar canais e formatos com agilidade — e, caso a tese funcionasse, levar tudo para dentro de casa. Foi o que aconteceu.

“Passamos os últimos anos aprendendo com o mercado — testando formatos, validando canais, entendendo padrões de consumo e fortalecendo a marca”, diz João. “Agora que dominamos esse repertório, a decisão da Vitamedic foi verticalizar para transformar velocidade em vantagem competitiva, qualidade em confiança e eficiência em crescimento sustentável”.

A nova fábrica recebeu 70 milhões de reais — sendo 35 milhões de reais em obras e equipamentos, R$ 25 milhões para o lançamento de 200 SKUs até 2026 e R$ 10 milhões em marketing e trade.

Outros R$ 30 milhões já haviam sido aplicados em 2023 numa planta de efervescentes.

É um movimento coordenado, mirando controle da cadeia e margem: a expectativa é que a verticalização adicione 15 a 20 pontos percentuais no EBITDA.

“Quando você terceiriza, você paga a margem do outro. O cara vai te cobrar 40% a mais pra ele ter 10 ou 15% de lucro. Se eu fizer aqui, eu não tenho esse markup”, afirma João. “E ainda compro matéria-prima direto, muitas vezes da China ou da Índia, com negociação de volume e prazo. A diferença é brutal.”

Por dentro da fábrica: formatos, metas e marcas

A nova unidade, instalada em Anápolis ao lado do parque farmacêutico da Vitamedic, foi construída com padrão técnico de medicamento e deve operar 24/7 até o fim de 2026.

A capacidade instalada é de 1,5 milhão de unidades comerciais por mês, com produção de cápsulas, comprimidos, pós solúveis, géis comestíveis, sachês, sticks e gummies sem açúcar.

O portfólio será dividido entre a TrustFuel, voltada para o público de alta renda, e novas marcas. Uma delas é a FourDay, criada para disputar o segmento de entrada.

A unidade já passa por certificação do FDA, agência reguladora dos Estados Unidos, e será avaliada por comitês esportivos para garantir que nenhum produto contenha substâncias classificadas como doping.

“A régua técnica do mercado subiu. A ANVISA também está apertando — exige estabilidade, rastreabilidade, controle. Se não fizer direito, não cresce”, diz o executivo.

A Vitamedic também prepara o lançamento de produtos com fórmulas e formatos inéditos no Brasil. “Queremos entregar conveniência com funcionalidade — uma coisa que ainda não existe por aqui, mas que já funciona lá fora.”

A verticalização é total — até com Coca-Cola

A aposta na verticalização vai além dos suplementos.

Nos bastidores da Refrescos Bandeirantes, o grupo está internalizando linhas inteiras de produtos da Coca-Cola, como Powerade, néctares Del Valle e sucos infantis. Tudo isso para ter mais controle sobre insumos, estoque e abastecimento.

“Hoje a gente fabrica Powerade aqui, incluindo a versão zero açúcar. Também internalizamos o suco infantil e vamos produzir néctar com tecnologia Tetrapak”, diz João.

O desafio era logístico: quando o produto vinha de outra fábrica, a prioridade era do território de origem — o que gerava rupturas no ponto de venda.

“A verticalização nos deu previsibilidade. Evita faltar produto, melhora o supply chain e aumenta nossa margem.”

Na Vitamedic, o processo segue a mesma lógica. A produção própria reduz etapas, melhora governança técnica e acelera o time-to-market.

“Se a gente puder tirar um layer, uma camada entre a fábrica e o PDV, melhor. Eu deixo de pagar a margem do distribuidor, controlo a operação e ainda entrego mais valor.”

De Goiás para o Brasil: a ambição de crescer 30%

A fábrica de suplementos marca o início de um novo ciclo para a Vitamedic — mais competitivo, mais técnico e mais ousado.

O plano é que os suplementos respondam por 1/3 do faturamento da farmacêutica em até três anos.

“É uma nova trajetória. A gente aprendeu a surfar numa onda limpa. Não vamos bater de frente com quem já está, mas criar nossas próprias categorias”, diz João. “Foi assim com as proteínas UHT e vai ser com os novos lançamentos de 2026.”

A distribuição também está em expansão.

A empresa já montou CDs em São Paulo, Santa Catarina e Alagoas, com equipe própria de vendas — e quer nacionalizar esse modelo. “Hoje, ainda temos distribuidor em algumas regiões. Mas o plano é ter operação direta em todo o Brasil.”

A meta é clara: dominar a cadeia, do insumo ao ponto de venda. “Se eu errar, o erro é meu. Mas se eu acertar, o acerto também é”, afirma João.

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