Fabio Schvartsman: ele será o novo presidente da Vale (Leandro Fonseca/Exame)
Rafael Kato
Publicado em 29 de março de 2017 às 13h05.
Última atualização em 31 de março de 2017 às 15h39.
Reportagem publicada originalmente em EXAME Hoje, app disponível na App Store e no Google Play. Para ler reportagens antecipadamente, assine EXAME Hoje.
No dia 24 de fevereiro, quando comentou os resultados anuais da mineradora Vale, Murilo Ferreira afirmou que a idade foi um dos motivos que o levou a deixar a presidência da companhia. “Temos como visão que devemos ter limite de idade de 65 anos [para a diretoria]. Vou fazer 64 anos agora em junho e 65 no ano que vem”. Ferreira anunciou que deixaria o cargo em maio. Como era de se esperar, as semanas seguintes foram repletas de insinuações sobre seu substituto. A decisão, tomada com base numa lista elaborada pela empresa de recrutamento Spencer Stuart, foi bem técnica.
Para seu lugar foi anunciada nesta segunda-feira a escolha de Fabio Schvartsman, presidente da fabricante de celulose Klabin. O escolhido trabalhou por 22 anos no Grupo Ultra, passou pelo GP e assumiu o comando da Klabin em 2011. Em sua gestão, o faturamento da companhia dobrou, para 7,1 bilhões de reais. Schvartsman é tido como mais duro e direto do que Ferreira, o que deve marcar uma mudança no dia-a-dia da companhia.
Mas o que tem levantado dúvidas no mercado é outra questão. Ferreira, de saída, tem 63 anos. Schvartsman, que assumirá em pouco mais de um mês, também. A regra dos 65 anos de idade limite não está escrita no estatuto da Vale, mas, se o bom senso predominar, o novo presidente terá vida curta na companhia. Qual a lógica?
Embora os mandatos de presidente da Vale durem apenas dois anos, é comum que os executivos fiquem mais tempo na cadeira. Ferreira ficou seis anos. Seu antecessor, Roger Agnelli, dez. É natural que assim seja na indústria de minérios, onde os ciclos são longos e os projetos demoram muito a sair do papel. O S11D, maior projeto de minério da história da companhia, no Pará, começou a ser estudado em 2000, e só saiu do papel em 2012. A licença de operação saiu em dezembro do ano passado. Foi o grande projeto de Murilo Ferreira. “O mercado de mineração não é de longo, mas de longuíssimo prazo”, diz José Renato Lima, professor da USP e especialista em mineração.
As circunstâncias levaram analistas, consultores e investidores a concluir que o novo presidente deve de fato chegar à Vale para uma passagem curta. Segundo o relatório do banco BTG Pactual, a escolha tem a vantagem de minimizar “as preocupações dos investidores em relação à interferência política”. “Ele não é um político, mas é uma pessoa muito bem relacionada. É um nome técnico, que vem para arrumar a casa”, diz outro analista.
O maior desafio de Schvartsman deve ser mesmo conduzir a reorganização societária anunciada pela Vale em fevereiro, que prevê a unificação das ações num único grupo de ordinárias e a listagem da companhia no mais alto segmento de governança da BM&FBovespa, o Novo Mercado. No fim do processo, em 2020, a Vale será uma empresa sem controle definido – e com menos influência do governo.
“A Vale precisa, neste momento, de um presidente de cabelos brancos”, diz Marco Saravalle, analista da XP Investimentos. Para concluir a reestruturação é preciso garantir que os acionistas preferenciais aceitem mudar seus papéis. “A Vale precisa de um nome que consiga dialogar com os acionistas e consiga convencê-los do valor da mudança”, afirma Saravalle.
No comando da Klabin, Schvartsman conduziu a companhia para o nível 2 de governança da BM&FBovespa e emitiu ações para o financiamento do Projeto Puma, em Ortigueira (PR), o maior já realizado pela companhia, com 8,5 bilhões de reais de orçamento.
Ao mesmo tempo Schvartsman também tem bagagem no mercado global de commodities. China e Europa são os principais consumidores de celulose. No ano passado, o preço da celulose enfrentou turbulências parecidas com o preço do minério de ferro nos últimos anos. A inauguração de grandes fábricas de celulose e a desaceleração da demanda na China colocaram a comodity em seu menor patamar em 20 anos.
Joga a favor de Schvartsman também o fato de pegar a empresa num momento relativamente tranquilo para o minério, o que permite que o foco esteja nas questões internas. Depois de chegar a 180 dólares em 2011, o preço do minério caiu para baixo dos 50 dólares no fim de 2015, mas voltou para 80 dólares no início deste ano. A subida, aliada a um forte programa de vendas de ativos e cortes de custos ajudou a Vale a fechar 2016 no azul. A receita aumentou 21% em 2016, totalizando 94,6 bilhões de reais, com isso a companhia saiu de um prejuízo de 44,2 bilhões de reais em 2015 para um lucro de 13,3 bilhões em 2016.
A grande questão é se dois anos são suficientes para as mudanças societárias numa empresa do porte da Vale. “Criar uma corporação não é só pulverizar o capital na bolsa. Essa é a parte fácil”, diz a consultora Betania Tanure. “O mais difícil é mudar a cultura, e, para isso, dois anos pode ser pouco tempo até para companhias muito menos complexas”.
Outra dúvida que se impõe é o que Schvarstman conseguirá fazer em relação à Samarco, mineradora controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, parada desde o rompimento da barragem em Mariana (MG), em novembro de 2015. A previsão mais otimista é que a operação seja retomada apenas em 2018. Todos os custos da companhia são pagos com um aporte de 230 milhões de dólares que a Vale e a BHP fizeram no fim de 2016. O problema é que este dinheiro deve durar apenas até junho.
Se conseguir desatar os vários nós da Vale, e ainda dar um jeito na Samarco, Schvarstman ganha força para continuar para além de 2019. Neste caso, o limite de idade cobrado por Ferreira pode ficar em segundo plano frente a satisfação dos acionistas.
*Com reportagem de Isabel Seta