Fly51: espaço terá área coberta para 10.000 pessoas, e espaço total para 20.000 pessoas (Fly51/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 25 de julho de 2025 às 14h38.
Durante muito tempo, Porto Alegre foi parada obrigatória em turnês internacionais. Metallica, Paul McCartney, Madonna, Rolling Stones, todos já estiveram por ali.
A cidade, que sempre teve público e apelo cultural, acabou perdendo protagonismo nos últimos anos. Estádios caros, falta de infraestrutura e distâncias longas acabaram afastando os grandes eventos.
Agora, um grupo de empresários quer mudar esse cenário — com uma arena que promete ser a maior do país no segmento de eventos ao ar livre e multiuso.
O projeto se chama FLY 51 e é uma parceria entre nomes de peso no entretenimento gaúcho: TE2 Hospitality, Greenvalley, GDO Produções e Grupo Prime.
A arena vai ocupar uma área de 27.000 metros quadrados dentro do Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, em um modelo de subconcessão com a alemã Fraport, responsável pela gestão do terminal. O investimento estimado é de 35 milhões de reais e a previsão de abertura é março de 2026.
A proposta é preencher uma lacuna estratégica no Sul do país: oferecer um espaço permanente, escalável e com estrutura pronta para receber shows, congressos, festas, feiras, casamentos e o que mais o mercado pedir. Com capacidade de até 20.000 pessoas, o FLY 51 quer entrar direto no radar de grandes artistas e produtores nacionais e internacionais.
“A gente já fez evento para 245.000 pessoas somadas em Porto Alegre. Agora é hora de escalar isso com infraestrutura real, tecnologia e conforto. Um lugar onde você não precise apostar na sorte para saber se vai se molhar ou não”,
E depois de sobreviver à maior enchente da história do estado — que deixou o terreno da arena completamente submerso —, o projeto está mais determinado do que nunca a sair do papel. A ordem agora é construir, abrir e retomar o protagonismo da capital gaúcha no circuito cultural brasileiro.
Tiago Escher entrou no entretenimento antes dos 25 anos, quase por acaso — e nunca mais saiu. Começou em 2002, no interior do Rio Grande do Sul, e construiu uma trajetória de duas décadas à frente de casas noturnas, festas de luxo e eventos de grande porte.
Aos poucos, ele transformou o que era uma carreira improvisada em um plano de expansão sólido. Em 2006, comandava casas no litoral gaúcho como a Cozumel e o Jimbaran. No ano seguinte, fundou o República de Madras, em Porto Alegre — um espaço que trouxe nomes como David Guetta e Armin Van Buuren, ainda em início de carreira internacional, para se apresentarem no sul do país. Era um tempo em que o dólar a pouco mais de 1 real tornava viável trazer os "big names", como ele mesmo chama.
O primeiro grande ponto de virada veio em 2010, com dois projetos opostos — e igualmente arriscados. De um lado, lançou a Farm, primeira casa de sertanejo universitário em Porto Alegre. De outro, trouxe para o Brasil a marca internacional Pink Elephant, com filiais em Nova York, São Paulo e Porto Alegre. “Porto Alegre era cheia de pub e rock bar. A ideia de uma casa sertaneja parecia loucura. Ninguém quis ir comigo. Só o Paulo Sat topou. Foi ele que acreditou”, lembra.
A Pink, por sua vez, inaugurou uma nova lógica de consumo na noite gaúcha. “A gente construiu o prédio do zero, com os tijolos do antigo Jockey Club. Foi feito com um escritório de arquitetura dos Estados Unidos. Na época, ninguém vendia champagne em balada. Era tudo Smirnoff. A gente criou esse novo padrão de consumo de alto padrão em Porto Alegre.”
Nos anos seguintes, Tiago seguiu apostando em marcas internacionais e depois migrou para produtos próprios. Em 2013, fundou o 300, uma marca de entretenimento de luxo que se espalhou por Porto Alegre, Jurerê Internacional, São Paulo e Gramado. Em paralelo, também tocou festas no Uruguai e nos Estados Unidos. “Em 2018, fizemos quatro réveillons simultâneos: em Miami, Punta del Este, Atlântida e Jurerê. Foi uma loucura.”
Mesmo com toda essa diversificação, foi só depois da pandemia que Escher começou a pensar em uma arena fixa de grande porte. A ideia ganhou corpo com a atuação do Grupo Prime, do qual também é sócio, responsável por eventos como Tardezinha, Luan City, Numanice e grandes shows de pagode e funk. “Comecei a ter contato com um público de 20, 30, 40 mil pessoas. E aí a dor ficou clara: Porto Alegre não tem espaço fixo pra isso. Tudo é improvisado, montado em cima da hora, com estrutura de estádio. Era hora de mudar isso.”
Foi desse vácuo que nasceu a ideia do FLY 51.
Porto Alegre tem mais de 4 milhões de pessoas na região metropolitana. E não tem um espaço definitivo para grandes eventos”, diz Escher. “A gente passou os últimos três anos estudando local, modelo de negócio, impacto econômico e viabilidade jurídica para fazer algo de verdade”.
A localização encontrada é, de fato, estratégica: uma área no sítio do aeroporto, do lado da Avenida Sertório — eixo central de transporte público da cidade — e colada à estação do Trensurb. Nos estudos de tráfego contratados pela TE2, a estimativa é de que, em finais de semana, cerca de 3,4 milhões de pessoas estejam a até 20 minutos da arena.
Além disso, por estar em uma área sob concessão da Fraport, a arena não terá problemas com vizinhança ou restrições de zoneamento. “A gente está falando de uma área que ficou meio ‘inviável’ para a Fraport, mas que virou uma joia para nós. Não dá pra fazer prédio ali, então a solução ideal era um espaço de uso público, com geração de fluxo e economia”, diz Escher.
A estrutura foi desenhada para evitar os erros comuns dos espaços temporários. Tudo será fixo e modular — do palco ao sistema de som, dos banheiros à alimentação. A arena terá mais de 400 banheiros, tendas com tecnologia belga, estacionamento para 400 carros, áreas VIP, espaços de descanso, ambulatórios e camarins equipados.
“Hoje o consumidor chega em um show e não sabe onde estaciona, por onde entra, onde está o banheiro. Isso afasta um público enorme, mais exigente, que quer conforto, conveniência e previsibilidade. Vamos resolver tudo isso”, diz Escher.
A estrutura coberta principal terá capacidade para até 10.000 pessoas, com possibilidade de expansão para 20 mil. Como o espaço é todo plano e sem pilares, poderá ser adaptado para diferentes tipos de evento — de shows a feiras, passando por casamentos e até eventos religiosos. “Já fomos procurados para um réveillon religioso de milhares de pessoas. E isso nem estava no radar”, conta.
Outro diferencial está na operação: a arena já nascerá com eventos marcados, graças à sociedade com produtores que detêm os direitos locais de diversos artistas.
“No show business não adianta ter espaço, tem que ter quem faz o show. Senão, o artista nem vem. A gente montou um modelo onde os sócios já têm a base mínima de operação garantida”, afirma Escher.
O projeto quase naufragou — literalmente — em maio de 2024.
A enchente que paralisou o Rio Grande do Sul inundou completamente a área do futuro FLY 51. Com água até dois metros de altura, os planos foram suspensos e investidores, naturalmente, recuaram. “Tinha gente que dizia: acabou Porto Alegre, não tem como continuar”, afirma Escher.
O acesso ao crédito ficou mais difícil, a confiança caiu e a capitalização do projeto teve que ser reavaliada. A solução encontrada foi tocar tudo com capital próprio. “A gente decidiu que não ia esperar a Selic cair ou o dólar estabilizar. Se for por esse caminho, você nunca faz nada no Brasil”, afirma.
A nova versão do projeto cortou as outras frentes previstas inicialmente — como o parque infantil e o parque de churrasco — e concentrou tudo na arena de eventos.
O FLY 51 será operado por um consórcio de sócios que cobre quase todo o espectro do entretenimento nacional. A Greenvalley, eleita cinco vezes como o melhor club de música eletrônica do mundo, entra com a cena eletrônica. A GDO, baseada em Chapecó, domina o mercado sertanejo e popular. Já a Prime atua com exclusividade em nomes como Thiaguinho, Ludmilla e Luan Santana no Sul. A TE2 orquestra tudo isso.
“É quase um seguro contra a ociosidade. Só com os eventos que os próprios sócios produzem, a agenda já começa cheia. Mas o espaço também vai estar disponível para outras produtoras. A ideia é virar uma base para todo o mercado”, afirma Escher.
Outro trunfo é a logística para artistas: como o local está dentro do sítio do aeroporto, é possível descer do avião e chegar no palco em cinco minutos. “Isso muda completamente o jogo para turnês internacionais. Evita deslocamentos longos, trânsito, riscos. É quase plug and play para o artista”, diz.
Até hoje, o maior projeto de arena para shows ficava em Sorocaba, com espaço para 6.000 pessoas.
Se der certo, o FLY 51 pode reposicionar Porto Alegre como parada obrigatória de turnês e festivais — como já foi no passado.