Pierre Schrappe, country manager da Cotton On no Brasil: “Temos um centro de distribuição em Jundiaí e vamos expandir para estados mais distantes" (Cotton On/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 4 de dezembro de 2024 às 08h35.
Última atualização em 4 de dezembro de 2024 às 09h08.
Entrar no Brasil é fácil. Ficar é outra história.
Gigantes da moda como Forever 21 e Topshop já tentaram, mas acabaram saindo ao enfrentar um mercado complexo e consumidores exigentes. A Cotton On, porém, varejista australiana de moda casual, parece ter aprendido com os erros alheios. Após 10 anos por aqui, a empresa diz que agora é hora de crescer — e muito.
A australiana é uma empresa familiar e de capital fechado. Ela chegou ao Brasil em 2014, trazendo um modelo 100% próprio, sem franquias ou parcerias.
“Estamos com operação própria. Isso dá mais fôlego financeiro para acertar os modelos de negócio, conectar com nosso fornecedor e consumidor”, diz Pierre Schrappe, country manager da marca no Brasil.
Hoje, a empresa opera 29 lojas físicas em estados como São Paulo e Paraná, além de um e-commerce que entrega para todo o país.
O plano para a próxima década é abrir 100 novas lojas, o que exigirá um investimento significativo. Cada unidade custa entre 2,5 milhões e 5 milhões de reais para ser inaugurada, o que tranquilamente soma mais de 300 milhões de reais em investimentos.
“Imaginamos um ritmo saudável, de cinco a 10 lojas por ano. É importante cuidar do que já temos enquanto expandimos”, afirma Pierre.
Além disso, a empresa planeja um crescimento geográfico, saindo do eixo Sudeste-Sul. “Atuar em estados mais distantes será um desafio logístico, mas estamos pensando em uma expansão gradual", diz. "O Brasil é como vários países dentro de um único país. É preciso cuidado para não perder o controle”.
A Cotton On começou de forma modesta em 1988, quando seu fundador, Nigel Austin, vendia jaquetas jeans no porta-malas de um Ford Bronco em Geelong, na Austrália.
A primeira loja oficial veio apenas em 1991, na mesma cidade. Desde então, a marca australiana cresceu de forma acelerada, diversificando seu portfólio e expandindo globalmente. Hoje, o grupo opera em 22 países, com mais de 1.500 lojas e oito marcas: Cotton On, Cotton On Kids, Cotton On Body, Factorie, Typo, Rubi, Supré e Ceres Life.
“A Cotton On é uma das poucas marcas baseadas no hemisfério sul", diz Pierre. "Isso nos dá uma vantagem estratégica na sazonalidade, porque o Brasil segue o mesmo calendário de estações da matriz australiana. É algo único que fortalece nosso modelo de negócios por aqui”.
Por aqui, a empresa australiana pousou em 2014. Nos primeiros anos, operou com cautela.
“A empresa abriu cinco lojas e procurou entender o mercado. Não é um mercado fácil. Muitas marcas entram e saem", diz. "Decidimos azeitar a operação, entender o consumidor e crescer de maneira robusta”.
A pandemia de covid-19 atrasou os planos, mas também testou a resiliência da empresa. “Tínhamos 10 lojas antes da pandemia e, a partir de 2021, aceleramos. Abrimos 14 novas lojas e lançamos o e-commerce.”
Hoje, a operação brasileira fatura cerca de 150 milhões de reais por ano e emprega 260 pessoas. O compromisso com sustentabilidade também faz parte da estratégia. Mais da metade dos produtos já utilizam materiais reciclados ou orgânicos, e a meta é alcançar 100% até 2030.
“Nosso diferencial não é competir só no preço", diz. "Queremos ser acessíveis, mas com uma experiência melhor para o consumidor e produtos mais sustentáveis”.
Pierre é direto sobre os desafios.
“O mercado de vestuário no Brasil é muito fragmentado. Para uma empresa como a nossa, indo de pequena para média, isso é uma oportunidade, mas também exige foco", diz. "Olhamos para o que conseguimos controlar, sem nos distrair com fatores externos, como inflação ou concorrência.”
Outro ponto crítico é o custo do capital.
“O custo de financiamento aqui é alto. Nosso modelo de operação própria ajuda, mas exige um controle rígido dos custos e da gestão de estoques”, afirma.
A logística também não facilita. “Temos um centro de distribuição em Jundiaí e vamos expandir para estados mais distantes, mas cada quilômetro extra no Brasil aumenta a complexidade.”
Enquanto algumas marcas estrangeiras ainda tropeçam no mercado brasileiro, a Cotton On parece ter encontrado o equilíbrio entre paciência e ambição.
A Cotton On também está ampliando sua atuação social no Brasil. Por meio da Cotton On Foundation, braço filantrópico do grupo, a empresa anunciou uma parceria com a ONG Gerando Falcões para investir 3 milhões de reais no projeto Favela 3D, que busca transformar comunidades vulneráveis como a Cidade de Deus, em Ferraz de Vasconcelos (SP).
“Convidamos o consumidor a participar desse movimento de mudança. Toda a renda arrecadada com itens como ecobags e balas de menta nas lojas é destinada à fundação. É uma forma de envolver nossos clientes em algo maior”, afirma Pierre.
Resta saber se a estratégia da varejista australiana funcionará para transformar a moda casual em um sucesso de longo prazo no Brasil.