Ross Saario, CEO do Grupo Intelipost: "Com o uso da IA, estimo que dentro de dez anos a logística do Brasil estará par a par com a dos Estados Unidos, pelo menos em termos de uso de tecnologia para a logística" (Divulgação/Divulgação)
Editor de Negócios e Carreira
Publicado em 12 de março de 2024 às 13h38.
Última atualização em 13 de março de 2024 às 09h30.
Estradas em mau estado de conservação, aeroportos lotados e portos com pouca tecnologia para o desembaraço alfandegário por muito tempo encareceram o transporte de bens ao redor do país. E, ao mesmo tempo, elevavam o grau de incerteza sobre quando de fato um produto chegaria ao destino final.
Assim como em outras indústrias, a inteligência artificial (IA) promete contornar boa parte dos gargalos da infraestrutura brasileira.
Vide a experiência da empresa de tecnologia Grupo Intelipost com IA. O embrião do Grupo foi fundado em São Paulo, em 2014, com a missão de fornecer um software para cotação de serviços de transporte com 1.500 integradores de soluções logísticas, como transportadoras rodoviárias ou terminais portuários.
Os 650 clientes da empresa, entre eles nomes com presença nacional como a calçadista Grendene, podem checar pela plataforma da Intelipost qual operador logístico tem a melhor combinação de preço e tempo previsto para entregar uma encomenda de um ponto A ao B.
Por ano, a tecnologia da empresa transaciona mais de 50 bilhões de reais em entregas de mercadorias. "Com esse volume de transações, a gente tem mais dados de logística do que qualquer empresa no Brasil, exceto gigantes como Mercado Livre e Amazon", diz o americano Ross Saario, CEO à frente da Intelipost desde 2022, após uma carreira em empresas de tecnologia que incluiu o cargo de gerente geral da Amazon nos Estados Unidos.
Só em 2023, foram 100 milhões de pedidos feitos pela plataforma. No ano passado, a empresa faturou 200 milhões de reais, uma alta anual de 30%. Além disso, fechou o primeiro ano com lucro desde a fundação.
Por trás do bom momento estão investimentos no uso de IA para ganho de eficiência na operação. Nos últimos meses, uma ferramenta de machine learning proprietária rastreou boa parte das encomendas feitas pelo sistema da Intelipost em dez anos. Um dos objetivos foi determinar a duração real do transporte entre rotas muito demandadas. Além disso, o intuito é estimar quais variáveis durante a rota vão resultar num atraso na entrega.
O trabalho permitiu a alguns operadores diminuírem o tempo médio previsto a alguns clientes. Via de regra, por causa da infraestrutura ruim, os operadores logísticos no Brasil trabalham com uma margem de segurança nas rotas.
Por causa disso, via de regra um operador vai prometer a um cliente entregar uma carga saída de São Paulo com destino a Salvador em quatro dias, por exemplo. Os dados rastreados pela IA, contudo, mostraram que em 90% das encomendas contratadas pela Intelipost fizeram a rota em até dois dias.
O sistema também ajudou a clarear os dias da semana com maiores índices de a encomenda demorar mais pelo caminho. As informações já permitiram agregar novas rotas, mais rápidas, ao sistema da Intelipost.
Fundada pelo alemão radicado no Brasil Stefan Rehm, especialista em tecnologia com passagem por IBM e Google, e pelo engenheiro brasileiro Gabriel Drummond, a Intelipost já levantou 130 milhões de reais em investimentos. Um deles, em 2020, contou com o fundo global Riverwood Capital.
Boa parte da quantia foi empregada na aquisição de duas startups com tecnologias complementares: Agile, dona de uma solução para roteiro de encomendas em tempo real, e a Pegaki, rede de pontos de retirada para as compras online.
Turbinada pelo ganho de eficiência com a inteligência artificial, a Intelipost almeja chegar ao 1 bilhão de faturamento num prazo de cinco anos. Para isso, investe pesado em tecnologia. Por ano, a empresa aloca 40 milhões de reais em pesquisa e desenvolvimento de produtos.
Saario vê o investimento em IA como uma forma de o Brasil encurtar o gap de logística com países desenvolvidos. "Até pouco tempo, os Estados Unidos estavam ao menos 10 anos à frente do Brasil em supply chain", diz Saario.
Então, empresas de logística no Brasil tinham poucos modelos preditivos capazes de recalcular custos e duração de fretes quando intempéries aconteciam pelo caminho. Ou, então, de já utilizar os mesmos dados para estimar as condições de fretes na mesma rota no futuro. Ou, ainda, prever o que será pedido, quando e por quem.
"A Amazon já consegue fazer esse tipo de previsão", diz Saario. "Com o uso da IA, estimo que dentro de dez anos a logística do Brasil estará par a par com a dos Estados Unidos, pelo menos em termos de uso de tecnologia para a logística." Resta torcer para o período também coincidir com uma melhora na infraestrutura brasileira por onde passarão essas encomendas daqui para frente.