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Empresa investe R$ 10 milhões para permitir que brasileiros paguem a conta de luz com pontos

Startup de São Paulo Prospera compra a SoulPrime e lança uma plataforma que mistura rede social, moeda digital e impacto ambiental. A meta é chegar a 500 mil usuários ainda este ano

Marcelo Freitas, da Prospera: “Diferente de programas em que você acumula e esquece, aqui a recompensa vem todo mês. Porque todo mês tem conta de luz.” (Prospera/Divulgação)

Marcelo Freitas, da Prospera: “Diferente de programas em que você acumula e esquece, aqui a recompensa vem todo mês. Porque todo mês tem conta de luz.” (Prospera/Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 9 de julho de 2025 às 07h45.

Trocar pontos de fidelidade por combustível, desconto em passagem aérea ou uma cafeteira é fichinha.

Uma empresa de São Paulo quer ir além: permitir que os pontos acumulados no dia a dia sirvam para zerar a conta de luz no fim do mês.

A proposta vem da Prospera, que acaba de investir 10 milhões de reais na compra da SoulPrime, uma startup que criou uma rede social baseada em recompensas digitais.

Com a aquisição, nasce a SoulUP, uma plataforma que une conteúdo, consumo e impacto ambiental, com uma moeda própria (e verde): os Pontos ECOA.

“Nosso objetivo é transformar a conta de luz em um benefício, não num peso”, afirma Marcelo Freitas, fundador e CEO da Prospera. "Queremos que a pessoa vá ao mercado, abasteça o carro ou compre no e-commerce e ganhe pontos que viram desconto direto na fatura".

A ideia não surgiu do nada. Freitas é engenheiro elétrico e passou anos atuando como fornecedor de tecnologia para grandes projetos do setor de energia.

Em 2020, decidiu mudar de lado: começou a construir pequenas usinas de geração solar e lançou um modelo de fidelização voltado para o pequeno varejo.

“A gente entregava energia para padarias, farmácias, academias, e junto instalava uma maquininha de pagamento. Toda vez que o cliente usava nossa maquininha para vender, ganhava crédito para abater na conta de energia. Chegamos a dar 100% de economia”, conta.

O modelo deu certo, mas tinha um limite. Era restrito a quem usava os terminais físicos da empresa.

Foi aí que a Prospera decidiu transformar a maquininha em algoritmo — e criar uma moeda digital.

“A gente entendeu que podia expandir esse benefício. Tiramos o hardware (a maquininha) e colocamos uma lógica de pontos dentro de uma plataforma. Agora qualquer pessoa pode ganhar ECOA comprando no cartão, assistindo vídeo ou até interagindo com marcas.”

Com a SoulPrime, a tecnologia da Prospera ganhou uma nova vitrine.

A startup, criada por Fabiano Miranda, já funcionava como uma rede social onde usuários acumulavam tokens ao consumir conteúdo. A integração foi natural.

“O Fabiano tinha desenvolvido a última milha do nosso projeto. Ele já tinha uma rede com base tecnológica sólida. A gente só trocou o dinheiro pelos pontos ECOA”, diz Freitas.

A fusão também marca uma mudança de escala.

A SoulUP começa com uma base de quase 60 mil usuários, e a meta é multiplicar esse número por dez até o fim do ano. “Estamos plugando os pontos em bancos, redes de varejo, indústrias de bebidas e apps de compras. Queremos que a moeda esteja presente em qualquer transação cotidiana”, afirma.

Qual é a história da empresa

Marcelo Freitas nunca planejou trabalhar com fidelização, tampouco fundar uma startup.

A carreira começou de forma tradicional: técnico em informática industrial, depois engenheiro elétrico formado pela PUC. Passou por multinacionais alemãs do setor de automação e chegou a atender grandes clientes da indústria pesada, como a Volkswagen Caminhões e Ônibus, no Rio de Janeiro. Foi ali que a energia virou mais do que uma área técnica.

“Conheci um medidor de energia supermoderno, usado na Europa e no Canadá, que quase ninguém no Brasil sabia operar. Comecei a estudar aquilo e vi que o setor elétrico tinha muita complexidade, mas também muito espaço pra inovação”, lembra.

Em 2005, decidiu empreender.

Fundou a Cenatec, empresa de tecnologia que fornecia soluções para projetos de geração, transmissão e distribuição de energia. O portfólio atendia desde usinas hidrelétricas como Belo Monte até parques eólicos e grandes indústrias em migração para o mercado livre de energia.

Mesmo com a empresa crescendo, Freitas já traçava outro plano: deixar de ser fornecedor e virar produtor. “Sempre tive essa visão: queria construir minhas próprias fazendas solares e vender energia limpa direto ao consumidor. Mas não queria vender para grandes grupos. Queria chegar na padaria, na academia, no posto de gasolina”, afirma.

Essa virada começou em 2020. A Prospera foi criada com uma proposta diferente: vender energia renovável para o pequeno varejista e oferecer, junto com ela, uma maquininha de pagamento própria. O cliente contratava energia, usava a maquininha para receber suas vendas e acumulava créditos que viravam desconto na conta de luz.

“Era simples: ele contratava, por exemplo, 5.000 reais em energia, e ao usar nosso terminal durante o mês, podia chegar a pagar só 500 reais no fim do ciclo. Chegamos a zerar conta de luz de muito cliente. Porque a margem da maquininha ia direto pra carteira dele”, explica.

O modelo unia fidelização, geração de energia e pagamento. Mas era difícil de escalar: precisava instalar equipamentos, treinar lojistas, acompanhar uso. Foi aí que surgiu a ideia de digitalizar o programa. A maquininha virou algoritmo, e a recompensa virou ponto digital. O nome: ECOA, uma moeda lastreada em créditos de carbono e energia limpa.

“Nosso maior acerto foi tirar o hardware e transformar a recompensa em algo que pode estar em qualquer lugar: no cartão, no app de delivery, no e-commerce. Qualquer compra pode gerar ponto. E todo mundo tem conta de luz pra pagar”, diz Freitas.

Como funciona a nova plataforma

Na prática, o sistema criado pela Prospera transforma qualquer atividade de consumo em oportunidade de recompensa.

Compras no cartão de crédito, interação com anúncios, check-in em eventos ou até assistir a vídeos podem gerar pontos ECOA, que ficam acumulados no aplicativo da SoulUP.

Esses pontos podem ser trocados por selos digitais. Cada selo equivale a um benefício prático: desconto na conta de energia elétrica, compensação de carbono e acesso a experiências ou produtos.

“É como se fosse um cupom. A pessoa resgata um selo, por exemplo, ganha 50 reais de crédito na conta de luz, preserva uma quantidade de árvores e ainda pode concorrer a prêmios como smartphones ou ingressos para eventos”, explica Freitas.

Não é preciso ser cliente da Prospera nem contratar energia diretamente da empresa. O usuário cadastra sua conta de luz no aplicativo, digita o código de barras da fatura e aplica o desconto gerado pelos pontos. O sistema já está integrado com todas as distribuidoras do país.

Como ele mudou o negócio

A criação do ponto ECOA nasceu de uma virada estratégica dentro da própria Prospera.

Antes, o modelo de negócios era centrado nas maquininhas de pagamento conectadas à oferta de energia renovável para pequenos comércios. Mas a operação era limitada e difícil de escalar.

“Nós ganhávamos nas duas pontas: na geração de energia e nas taxas das maquininhas. Mas vimos que dava para digitalizar o modelo, tirar o hardware e transformar isso em uma lógica de plataforma”, afirma o fundador.

O primeiro passo foi criar a moeda digital baseada em créditos de carbono e energia renovável. Em vez de um ponto tradicional, como os de companhias aéreas ou programas de milhagem, o ECOA tem lastro ambiental — e isso o torna atrativo para empresas que querem mostrar ações concretas em ESG.

Agora, a venda da moeda é o principal motor de receita da Prospera. Os pontos ECOA são adquiridos por empresas que desejam usá-los em seus programas de fidelidade, relacionamento ou incentivo ao consumo.

A lógica é parecida com qualquer programa de pontos tradicional.

“Tem mais de 2.000 grandes empresas no Brasil comprometidas com o pacto global da ONU. Todas precisam mostrar ações no escopo 3. Quando elas distribuem pontos ECOA, estão engajando o consumidor e, ao mesmo tempo, entregando uma ação rastreável de impacto ambiental”, diz Freitas.

Os detalhes da aquisição e o futuro da empresa

A SoulPrime entrou no radar da Prospera depois de aparecer no programa Shark Tank Brasil, onde apresentou seu modelo de rede social descentralizada, em blockchain, que remunera o tempo dos usuários com tokens.

A proposta chamou a atenção de investidores e também de Marcelo Freitas, que viu ali a peça que faltava.

“O Fabiano tinha feito algo muito valioso: criou uma rede onde o tempo do usuário vira valor. Eu vi e pensei: se a gente colocar os pontos ECOA ali dentro, fechamos o ciclo. O consumo vira ponto, o ponto vira benefício, e o benefício alimenta a comunidade”, afirma o CEO.

A aquisição foi total. Toda a tecnologia da SoulPrime, incluindo o código-fonte e equipe, foi incorporada pela Prospera. A rede social foi rebatizada de SoulUP e passou a ser o hub da nova operação. Fabiano Miranda assumiu o cargo de CTO da empresa.

Com a fusão, a Prospera aposta em escalar rapidamente. A plataforma está em fase de lançamento comercial com parcerias em negociação com bancos, marketplaces e grandes indústrias, inclusive uma do setor de bebidas no Norte do país.

A expectativa é crescer de forma acelerada ainda este ano.

“A gente quer sair de 60 mil usuários para 500 mil até dezembro. E não estamos falando só de downloads, mas de pessoas ativas, que realmente usam o app, trocam pontos e veem diferença na conta no fim do mês”, diz Freitas.

A ambição é que os pontos ECOA estejam em qualquer lugar — da compra do pão à passagem aérea. O que vale é o acúmulo e o uso frequente. “Diferente de programas em que você acumula e esquece, aqui a recompensa vem todo mês. Porque todo mês tem conta de luz.”

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