Gustavo Montezano, do BNDES, governador Renan Calheiros Filho, e Roberto Caetano, Redator-Chefe de EXAME: financiamento de obras de infraestrutura em debate (Fabiola Picozzi/Exame)
Denyse Godoy
Publicado em 7 de novembro de 2019 às 19h25.
Última atualização em 7 de novembro de 2019 às 19h50.
O governador Renan Calheiros Filho abriu nesta quinta-feira, durante a primeira edição do Fórum EXAME PPPs e Concessões Alagoas, a consulta pública sobre um novo projeto de distribuição de água e coleta e tratamento de esgoto na região metropolitana de Maceió.
O modelo, que mescla investimentos públicos e privados, foi estruturado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao longo dos últimos dois anos. “Diante da escassez de recursos para investimentos da União e dos estados, a solução para viabilizar obras é por meio de parcerias público-privadas”, disse Calheiros Filho a uma plateia de cerca de 200 políticos, empresários do setor e investidores que se reuniu no Fórum na capital alagoana nesta quinta-feira (07). “Esse empreendimento será um modelo para todo o Brasil.”
A principal inovação do projeto é juntar, em um contrato único com um prestador privado, os serviços de água e esgoto de 12 municípios da região metropolitana e de Maceió. Normalmente, cada cidade é responsável por gerenciar o seu próprio sistema.
Depois da consulta pública, que deve durar 30 dias, será lançado o edital do leilão da concessão, previsto para março de 2020 na bolsa de valores brasileira B3.
O vencedor vai ganhar o direito de distribuir água e recolher e tratar os resíduos na região metropolitana da capital alagoana – atendendo 1,5 milhão de pessoas – durante 35 anos. Os investimentos estimados na construção das novas redes e tubulações são de 1,6 bilhão de reais para o serviço de água e 1 bilhão de reais para o de esgoto. A maior parte do montante deve ser aplicada nos primeiros oito anos da concessão. A produção e o tratamento da água continuarão sendo feitos pela estatal Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal), que se tornará dona da infraestrutura construída após o vencimento do contrato.
A meta é universalizar o acesso a água encanada nos 13 municípios em seis anos e o serviço de esgoto gradualmente em 16 anos – atualmente, o sistema cobre apenas 35% da região incluída no novo projeto. As tarifas a serem cobradas devem ser iguais, em valores reais, às atualmente praticadas pela Casal e pelas outras empresas públicas que atendem as cidades. “O cidadão não quer saber se o dinheiro do projeto é público ou privado. Quer receber o serviço”, disse Calheiros Filho.
Durante o evento, exemplos de PPPs bem-sucedidas no Nordeste foram mostrados, como o da Nova Ceasa de Teresina, projeto apresentado pela Superientendente de PPPs do Piauí Viviane Araujo, representante do poder concedente, e pelo presidente da central estadual de abastecimento James Andrade, falando como concessionário. O caso do Hospital do Subúrbio, em Salvador, foi contado pela coordenadora técnica da Secretaria da Fazenda da Bahia, Priscila Romano Pinheiro. O da ampliação da infraestrutura de esgoto da região metropolitana de Recife foi relatado por Adriano Barbosa, diretor de operação da empresa de saneamento BRK Ambiental, que tem 90% da empresa concessionária do serviço.
O papel do BNDES
Gustavo Montezano, que preside o BNDES há cerca de cinco meses, disse que o projeto do novo sistema de água e esgoto da região metropolitana de Maceió representa o novo estilo de trabalho do banco: mais do que aplicar dinheiro, principalmente prestar consultoria e ajudar na criação de soluções para os problemas do país.
“Se existe uma área em que o Brasil precisa investir e que não foi atendida nos últimos anos é a de saneamento”, afirmou Montezano. “O banco agora tem que se adaptar à nova realidade global, em que os investidores querem retorno econômico mas também avaliam os projetos sob as óticas ambiental e social. Assim, vamos contribuir com ideias para que os recursos sejam bem aplicados.”
Na opinião de Montezano, nos últimos anos, o BNDES investiu muito, mas nos projetos errados – como as compras de participações em grandes empresas de capital aberto, a exemplo do frigorífico JBS, controlado pela família de Joesley e Wesley Batista. Uma investigação do banco encerrada em setembro concluiu que houve erros operacionais e técnicos no aporte de 8,1 bilhões de reais pelo BNDES, porém não encontrou evidências de influência política na decisão de investir no grupo.
Quando assumiu, Montezano prometeu em dois meses “abrir a caixa-preta” do BNDES – termo obscuro que o governo Jair Bolsonaro usa para insinuar que o banco e seus funcionários cometeram ilegalidades durante principalmente as gestões dos presidentes da República Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) e Dilma Rousseff (2011-2016). Até agora, a tal caixa-preta não veio à tona. Mas a importância de mudar o BNDES é ponto comum. Montezano, por sua vez, tem enfrentado enorme resistência dos funcionários do banco em implementar mudanças na gestão e na avaliação de projetos, segundo EXAME apurou.
Nesta quinta-feira, Montezano discursou sobre o novo papel do banco e participou de um debate no palco com Renan Filho – mas se recusou a responder perguntas sobre como o BNDES, ele próprio, vai agir com menos recursos. Há dois dias o ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou como parte do seu pacote de reforma estrutural uma redução de 40% para 14% na parcela do Fundo de Amparo ao Trabalhador repassada ao banco. No ano passado, o repasse correspondeu a 37% do orçamento do BNDES.
A participação do banco de fomento para além das ideias é um dos temas importantes que foram levantados por participantes do EXAME Fórum. “O BNDES já garantiu que participará com parte do financiamento do novo projeto de água e saneamento, assim como outros bancos públicos”, disse George Santoro, secretário da Fazenda de Alagoas.
O estado tem vários outros projetos de concessões e PPPs em busca de financiadores, segundo Maurício Quintella, secretário de Infraestrutura de Alagoas, e Antônio Tenório Cavalcante Neto, presidente da Alagoas Ativos, que gerencia as empresas a serem confiadas à iniciativa privada: o Ceasa de Maceió, o Abatedouro de Viçosa e o aeroporto regional da cidade turística de Maragogi.
O Fórum EXAME em Alagoas mostrou que a iniciativa privada terá um papel essencial na execução dos projetos que o Brasil tanto precisa. Mostrou também que a participação do BNDES nesta caminhada é relevante – mas precisa ser mais bem definida.