Estudantes na reta final da preparação para um dos exames mais difíceis do mundo (Divulgação/Colégio Propósito)
Estagiária de jornalismo
Publicado em 14 de novembro de 2025 às 16h48.
Quando abriu um pequeno cursinho pré-vestibular em Teresina, em 2011, o professor de matemática Vilton Soares queria, basicamente, preparar jovens para o vestibular de medicina.
A fórmula parecia conhecida: turmas cheias, foco em resultados e uma cidade em que, segundo ele, “todo mundo da classe média alta quer fazer medicina”.
A história, porém, seguiu outro caminho. Em pouco mais de uma década, o antigo cursinho se transformou no Colégio Propósito, referência em aprovados no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e Instituto Militar de Engenharia (IME), com alojamentos para alunos de vários estados, um projeto robusto de bolsas e uma gestão pensada como empresa, sem abrir mão da narrativa de propósito que dá nome ao colégio.
No início, os números em medicina chamavam atenção.
“Nós somos a escola que mais aprova para medicina no Piauí”, conta Vilton.
As turmas cresciam, as unidades se multiplicavam e o colégio chegou rapidamente à marca de cerca de 3 mil alunos.
Mas uma cena recorrente começou a incomodar o mantenedor. “Eu entrava em sala, turmas às vezes com 50 alunos, perguntava ‘quem quer fazer medicina?’ e todos levantavam a mão, eu sabia que nem todo mundo tinha as mesmas aptidões e os mesmos sonhos.”
Ao mesmo tempo, ele via os melhores alunos interessados em engenharia ou escolas militares migrarem para escolas em Fortaleza ou São Paulo, porque Teresina não tinha tradição nesses vestibulares.
Foi a combinação desses dois incômodos, o “monocultivo” da medicina e a fuga de talentos, que abriu espaço para o projeto que mudaria a história do colégio.
Concentração dos alunos e professores no local de prova do ITA em Teresina (Divulgação/Colégio Propósito)
Em 2015, o Colégio Propósito lançou uma turma específica para ITA e IME. O começo foi modesto com cinco alunos e nenhum aprovado no primeiro ano.
“Na época foi algo muito disruptivo, porque não tínhamos resultado nem tradição nesses vestibulares”, lembra Vilton.
Para fortalecer o projeto, a escola decidiu investir pesado em docentes. “Eu comecei a trazer professores de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Fortaleza para essa turma. Foi um investimento alto para o início do projeto”, diz. No ano seguinte, veio o primeiro resultado: Riedel Linhares, aluno da casa desde o fundamental, aprovado no ITA ainda na terceira série do ensino médio.
O efeito foi imediato. A escola passou a ser observada de perto pelos institutos militares. Teresina entrou no mapa dos grandes vestibulares de engenharia, e o projeto ganhou tração.
Hoje, mais de 300 alunos se preparam anualmente com o Propósito para ITA e IME. Nos últimos anos, colégio esteve entre as escolas que mais aprovam no ITA e no IME no Brasil.
O diretor Vilton Soares junto com os alunos do alojamento masculino (Divulgação/Colégio Propósito)
Com a consolidação em exatas, o colégio passou a receber alunos de vários estados. Para atender quem vem de fora, o Propósito estruturou dois alojamentos, masculino e feminino, que atualmente acolhe dezenas de estudantes.
Muitos chegam por meio de bolsas. Casos como o de Matheus, filho de uma doméstica e de um pedreiro, aprovado no ITA e hoje no mercado financeiro, tornaram-se parte do repertório pedagógico da escola.
Mais recentemente, o estudante Victor Caus, aprovado no ITA, foi aluno bolsista do colégio, e agora foi aprovado na École Polytechnique, na França, com bolsa integral e ajuda de custo. “É um projeto que passou da linha de ser só uma escola de resultado. Virou um projeto de transformação”, resume Vilton.
Vilton Soares, mantenedor e diretor do Colégio Propósito em Teresina (Divulgação/Colégio Propósito)
Se no começo a estrutura era típica de uma escola familiar, ele e a esposa, ambos professores, o crescimento acelerado trouxe um novo desafio. “O maior desafio foi a profissionalização do negócio, porque a escola cresceu muito rápido”, afirma.
A resposta foi buscar competências fora do universo escolar. Com isso, vieram sistemas, tecnologia, processos, avaliação. “Coisa que, em geral, as escolas não possuem, porque são empresas familiares.”
O movimento se antecipou a um cenário que hoje pressiona escolas em todo o país: margens apertadas, competição de grandes grupos e mudanças demográficas. A experiência levou Vilton a atuar também como consultor, ajudando outros mantenedores a fazer a travessia da escola artesanal para a gestão estruturada.