Repórter de Negócios
Publicado em 19 de agosto de 2025 às 06h34.
Última atualização em 19 de agosto de 2025 às 06h52.
De fábrica de trufas caseiras para um império de chocolate e, agora, de diversão. Depois de criar a maior rede de chocolates do país, Alexandre Costa prepara sua empresa para um salto inédito: virar referência no setor de parques temáticos.
Com investimento estimado em R$ 2 bilhões, o Cacau Park, entre os municípios de Itu e Sorocaba, no interior paulista, a 100 quilômetros da capital, quer atrair milhões de visitantes e disputar atenção em um mercado que, no Brasil, movimenta mais de R$ 8 bilhões por ano.
A empreitada coloca a maior rede de chocolates finos do mundo em um território novo (e de alto risco), mas também revela a ambição de levar a marca além do consumo imediato para se tornar experiência, destino e estilo de vida. O novo momento da empresa foi o tema da capa da EXAME de abril.
A ideia é trazer a Disney para os brasileiros. De acordo com o empresário, apensas 3% da população consegue viajar para exterior para visitar parques de diversão. O fundador da Cacau Show planeja ter ingressos com preços mais acessíveis em alguns dias do mês.
"Teremos uma tarifa social para conseguir levar o maior número de pessoas ao parque", diz o fundador Alexandre Costa.
A maior e mais rápida montanha-russa da América Latina se tornou o principal símbolo do ambicioso plano de diversificação da Cacau Show, que agora entra no mercado de entretenimento.
Com 55 metros de altura, o brinquedo atinge 120 km/h em apenas cinco segundos e percorre um trajeto de um quilômetro. A capacidade é de até 1.000 visitantes por hora, distribuídos em dois trens de 16 lugares cada.
Além das mais de 50 atrações, o complexo terá um shopping a céu aberto com lojas e restaurantes, além de dois hotéis com 1.330 quartos.
Projeto do Cacau Park, a ser construído em Itu, no interior paulista (Cacau Show/Divulgação)
O Cacau Park também vai contar com espaços como:
E esse é apenas o começo. O fundador da companhia adquiriu 16 milhões de metros quadrados de terreno, com espaço de sobra para a abertura de outros parques e novas experiências.
A aposta é alta, e o desafio também: conquistar um público exigente em um país com pouca tradição em parques de grande porte.
O salto pretendido com o parque é mais uma ousadia na trajetória do fundador da Cacau Show. Nascido na zona norte de São Paulo, em 1971, ele cresceu vendo a mãe vendendo cosméticos e chocolates a vizinhos e conhecidos por meio de catálogos. No fim dos anos 1980, Alê resolveu continuar o negócio da mãe, mas de um jeito diferente.
Com 17 anos e 500 dólares emprestados, também saiu por aí vendendo chocolates. Só que o fornecedor não deu conta da primeira leva de pedidos — 2.000 ovos de Páscoa.
Às vésperas do domingo de Páscoa, ele mesmo fabricou os ovos e entregou tudo com o Fusca que tinha na época. (O veículo, inclusive, inspirou o layout do carrinho bate-bate que será uma das atrações do Cacau Park.)
O negócio que começou em 1988 se tornou a maior empresa de chocolates do Brasil, com quase 5.000 pontos de venda e mais de 22.000 funcionários.
O faturamento chegou a 6,2 bilhões de reais em 2024 (21% a mais do que em 2023). Para este ano, a meta é chegar aos 8,4 bilhões de reais em receita. Mas, para o empresário, o show está só começando.
De alguns anos para cá, Alê vem batendo na tecla de que é preciso acrescentar outros sentidos ao consumo do chocolate para além do sabor. Um primeiro passo foi a conversão de lojas em megastores com direito a cafeteria e alguns ambientes temáticos.
Numa das principais, na fábrica em Itapevi, na Grande São Paulo, é possível acompanhar ao vivo a transformação de um cacau em chocolate, desde a torra da semente até a pasta que será acrescida de leite e açúcar.
Mais tarde, em 2022, veio a aposta em um hotel temático sobre o cacau, chamado Bendito Cacao Resort, hoje com unidades em Campos do Jordão e Águas de Lindóia, estâncias turísticas no interior paulista.
Com o Cacau Park, a marca leva o conceito de varejo de experiência à máxima potência, criando um destino turístico que mistura memória afetiva, gastronomia e diversão em larga escala.
A aposta na experiência dos clientes não é uma exclusividade da Cacau Show. No Brasil, a varejista Magazine Luiza planeja uma megaloja no espaço deixado pela Livraria Cultura no Conjunto Nacional, cartão-postal de São Paulo no coração da Avenida Paulista, com espaço para eventos e teatro.
Em 2010, a marca de carros de luxo Ferrari abriu um parque de diversões em Abu Dhabi, no Oriente Médio, com a montanha-russa mais rápida do mundo. A meta era conquistar novos públicos com a pegada de ser uma marca associada à velocidade. Deu certo: mais de 1 milhão de pessoas passam pelo parque todos os anos.
Outros bem-sucedidos nessa linha vêm das grifes italianas Prada e Bvlgari, que conseguiram replicar o conceito de exclusividade em cafés e hotéis temáticos.
Hersheypark, parque de diversões da Hershey’s na Pensilvânia (EUA): parque temático da empresa americana recebe mais de 1 milhão de visitantes todos os anos (Arlutz73/Getty Images)
O maior desafio será, claro, fazer o projeto do parque virar um grande negócio. Pelo mundo, já existem exemplos de equipamentos turísticos ligados ao chocolate que dão certo há mais de 100 anos.
O principal deles é o Hersheypark, parque temático da empresa de chocolates Hershey’s, nos Estados Unidos. Criado em 1906 como um parque de lazer para funcionários da indústria de chocolate, virou uma atração turística que recebe mais de 1,5 milhão de visitantes todos os anos.
No Brasil, a história do setor de parques é marcada por tropeços e por poucos casos de sucesso duradouro. Numa ponta, está o catarinense Beto Carrero World, o maior do gênero, com 2 milhões de visitantes anuais e operante desde 1991.
Na outra, estão negócios que ficaram na memória de muitos clientes, mas fecharam por crises de segurança, governança ou falta de investimento, como o Terra Encantada, no Rio de Janeiro, e o tradicional Playcenter, na zona norte de São Paulo, desativado em 2012.
A marca continuou com operações dentro de shoppings, os Playlands, e foi adquirida pela Cacau Show em 2024, como uma estratégia de trazer know-how para a rede de chocolates.
Alê Costa, da Cacau Show, e Marcelo Gutglas, fundador do Grupo Playcenter (Cacau Show/Reprodução)
Entre uma ponta e outra, há casos como o Hopi Hari, do interior de São Paulo, em recuperação judicial com dívidas de 350 milhões de reais, mas numa toada de recuperação de faturamento: de 2018 para 2023, por exemplo, as receitas saltaram de 70 milhões para 162 milhões de reais.
O principal desafio é manter o interesse dos consumidores no longo prazo. “É um setor que tem necessidade de reinvestimento muito grande”, diz Vanessa Costa, da Adibra. “Você precisa sempre ter novidades para manter a atratividade.”
A precificação do ingresso também é uma questão num mercado consumidor sufocado por juros altos e com 75 milhões de endividados. Um único dia no Magic Kingdom, o parque mais visitado da Disney, pode custar 1.200 reais — valor impraticável no Brasil.
A expectativa de Alê é que consiga o retorno do investimento em 12 a 15 anos, com um público médio de 3 milhões de visitantes anuais.
No futuro, o empresário estuda até o lançamento de filmes e séries, como a Disney faz há décadas. “São poucas marcas no mundo que conseguem montar uma fórmula que envolve marca, produto, storytelling e experiência”, diz o consultor de varejo Eduardo Terra.