Marcelo Pimentel, CEO da Marisa: “Queremos ser ainda mais a plataforma da mulher, onde ela faz suas compras, se informa, encontra produtos sobre o que ela ama, como o universo PET, e pode organizar sua vida financeira” (Eliel Souza/Reprodução)
Marina Filippe
Publicado em 11 de março de 2022 às 06h00.
Última atualização em 11 de março de 2022 às 09h02.
A pandemia da covid-19 tem feito o varejo brasileiro passar por altos e baixos. Para se dar melhor, a multicanalidade tem sido imprescindível. Sabendo disto, a varejista de moda Marisa colocou em prática operações como uso da loja física como estoque, lançamento e reforços no aplicativo e diversificação de serviços, incluindo a fintech mBank.
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As estratégias permitiram uma recuperação gradativa nos principais pilares da empresa. No terceiro trimestre de 2021, último período com resultados divulgados, a Marisa vendeu 530,1 milhões de reais — alta de 18% sobre o mesmo período do ano anterior, quando a empresa lidava com os efeitos da pandemia.
O lucro líquido, de 44 milhões de reais, foi uma melhora significativa em 12 meses (no terceiro trimestre de 2020, ainda sob as incertezas da pandemia, a varejista registrou prejuízo de 124 milhões de reais.
Ainda assim, na avaliação da empresa, é preciso seguir conquistando as consumidoras para a empresa garantir lucros no longo prazo. “Queremos ser ainda mais a plataforma da mulher, onde ela faz suas compras, se informa, encontra produtos sobre o que ela ama, como o universo PET, e pode organizar sua vida financeira”, diz Marcelo Pimentel, CEO da Marisa em entrevista exclusiva à EXAME.
Pimentel ocupa a principal cadeira da varejista desde 2019, após quase dois anos como vice-presidente de operações da varejista fundada em São Paulo, em 1948, como uma loja de acessórios femininos como bolsas.
Até 2016, a varejista foi comandada pela família do fundador Bernardo Goldfarb. Então, Marcio Goldfarb, filho de Bernardo, passou o controle ao empresário Marcelo Araújo para, dois anos depois, retomar o controle. A gestão de Pimentel, portanto, tem sido a mais duradoura de um executivo de fora da família.
Formado em administração, com pós-graduação no Reino Unido, Pimentel assumiu o controle da Marisa após duas décadas de carreira em grandes varejistas como os supermercados Asda e Walmart e o Grupo DPSP, das redes de farmácias São Paulo e Pacheco.
A principal aposta de Pimentel para a Marisa é acelerar a digitalização do negócio. No fim de 2021, a companhia investiu no lançamento oficial da mBank, dedicada a oferecer crédito e impulsionar o empreendedorismo feminino.
Na entrevista a seguir, Pimentel comenta os planos de digitalização da varejista, a importância do marketplace e de outras estratégias para conquistar a atenção de consumidoras.
A busca por novos modelos de negócios, em especial os digitais, está na prioridade dos CEOs do varejo. Qual foi o ponto de partida da Marisa para essa guinada?
Este projeto começou em 2017 com a mudança de plataforma no site, e uma visão de multicanalidade delineada em 2018, quando lançamos a loja oficial dentro do Mercado Livre. Hoje estamos nos principais marketplaces.
Já em agosto de 2019 avançamos com a modalidade 'clique e retire', quando a cliente compra online e retira o produto na loja. Atualmente, a solução atende todas as lojas da rede e fechou 2021 correspondendo a 33% de todos os pedidos feitos no e-commerce.
Ter dado esses passos nos ajudou quando a pandemia da covid-19 chegou e tivemos de fechar todas as lojas físicas. Naquele momento, as 140 lojas viraram dark stores e serviram de estoque. Hoje, 60 lojas permanecem como “hubs” e tornam a entrega mais rápida.
Além disto, temos duas dark stores oficiais, uma em São Paulo e outra em Belo Horizonte. Em 2020 entregávamos o pedido em até cinco dias, agora entregamos em média em dois dias, ou mesmo em um dia se nas duas capitais. Ainda neste 1º trimestre de 2022 dois novos espaços serão abertos nos estados do Rio de Janeiro e Bahia.
Em novembro a Marisa lançou um marketplace próprio. É a hora de a varejista competir com marketplaces de grande porte como Mercado Livre ou Magazine Luiza?
Estamos trazendo, inicialmente, 10 parceiros e uma média de 7.000 itens no segundo semestre. Não queremos competir com os grandes, mas sim ter produtos específicos para a mulher, as categorias serão ligadas à moda, autoestima, beleza, educação e pets.
Isto se conecta com a nossa estratégia digital e a intenção de que 25% das vendas da empresa venham desses canais online em cinco ano. Em 2021 o montante foi de 14%. Em 2017, era apenas 2%. Ou seja, temos muita oportunidade e estamos fazendo isto com quem entende de outras categorias que interessam à mulher.
Como aproximar a marca das consumidoras também no digital?
Um ponto muito importante foi o lançamento do aplicativo em 2020. Em menos de um ano tivemos 10 milhões de downloads graças à muita divulgação nas lojas e redes sociais. Hoje são 12 milhões de downloads e 70% da venda digital acontece dentro do app.
Entendemos que para a cliente manter o app no smartphone é preciso gerar valor. Por isto, em setembro lançamos o Universo M, uma plataforma de conteúdo com a estrutura editorial formada por quatro pilares: “Meu Estilo”, com conteúdo sobre moda; “Meu Bem-Estar”, com inspirações sobre cuidados com o corpo e a saúde física e mental, além de dicas de decoração; “Meu Dinheiro”, dedicado às informações sobre empreendedorismo, educação financeira, liderança e empoderamento feminino; e “Nossas lutas”, que reúne temas como câncer de mama, violência contra a mulher e maternidade. Atualmente são 3,5 milhões de visitas por mês nessa área de conteúdo.
Para além do conteúdo, por que é interessante para a consumidora baixar um app da Marisa?
Hoje ela consegue fazer tudo no app. Há por exemplo, a Sacola de Vatagens, que oferece benefícios exclusivos e integra as lojas físicas ao aplicativo, podendo evitar fila na loja, ganhar descontos e mais. A solução foi lançada em junho e no fim de 2021 registrou um crescimento de 65% no ticket médio comparado aos demais canais de vendas. Desta porcentagem, 55% das consumidoras utilizaram o mBank, cartão oficial da marca, como meio de pagamento. Por fim, o serviço ainda aumentou a quantidade de itens comprados para aproximadamente cinco peças.
Em setembro, a Marisa lançou o mBank, com serviços financeiros. Qual é a ambição da varejista com a medida?
O serviço atualmente conta com cartões de crédito Itaúcard Mastercard e private label digital em parceria com o Itaú Unibanco. Ele é dedicados às compras realizadas dentro das lojas da marca, além de seguros, assistências, empréstimo pessoal, opção de saque em espécie nos espaços físicos Marisa e ações exclusivas de cashback.
A expectativa é melhorar a experiência das nossas clientes e incentivá-las a trazer ainda mais independência financeira e empoderamento feminino com o serviço, que já conta com uma base de 3 milhões de consumidoras. Para 2022, planejamos o lançamento de serviços como conta digital, pagamento de contas, recarga de celular, e outras soluções.
Esperamos que a consumidora aproveite não só o contexto transacional de compra e venda de produtos, mas utilize crédito para iniciativas de empreendedorismo. Além disto, é importante considerar que estamos avançando aos poucos, antes não era possível pagar pelo mBank, hoje 35% das vendas digitais acontecem por ele. A nossa missão é lançar uma carteira digital, permitir o pagamento de contas, recargas de celular e outras soluções.
O que fará a consumidora escolher a conta digital do mBank entre tantas disponíveis no mercado?
Além das vantagens já comentadas para o varejo, vemos uma oportunidade de fomentar o empreendedorismo feminino ao oferecer crédito específico para mulheres com taxas atrativas, uma vez que elas são melhores pagadoras do que os homens.
Em 2021 começamos parcerias com empreendedoras, como o programa de aceleração de startups Female Scale, cocriado em parceria com a plataforma B2Mamy, com objetivo de promover a aceleração de negócios fundados ou cofundados por mulheres. A primeira etapa do processo apoiou 50 startups com mentorias durante um mês.
Sabemos que o dinheiro é uma questão importante para o crescimento e a liberdade da mulher. Quando elas empreendem ainda recebem menos aportes do que os homens, mas queremos mostrar que elas podem e ao mesmo tempo termos rentabilidade. Novidades nesta frente serão anunciadas neste ano e a narrativa será nesta linha de mostrar que não é mais uma conta, mas sim um espaço para a mulher resolver todas as suas necessidades financeiras.
O apoio às mulheres se repete dentro de casa?
Sim, é um trabalho de dentro para fora. Temos 50% de mulheres no conselho e 40% de mulheres na diretoria, onde também queremos ter equidade em breve. Na empresa como um todo, elas são 70%, e na liderança (cargos de supervisão e acima) 76%. Fizemos um trainee exclusivo para mulheres e estamos sempre trabalhando para capacitá-las e apoiá-las no crescimento. Foram quase 12 mil inscrições, 3 mil a mais do que o programa do ano passado que não havia recorte por gênero.
Recentemente, a Marisa lançou um serviço para pets. Como ele funciona e por que entrar nesta categoria?
Costumamos fazer pesquisas com consumidoras para entender quais categorias são relevantes para elas, e pet era uma tema recorrente. Além disto, percebemos uma deficiência no mercado de seguros para animais de estimação. Somos a primeira varejista a oferecer seguro de proteção pessoal com assistência para pets.
A solução Proteção Pessoal e Pet, desenvolvida em parceria com a seguradora Assurant, possui cobertura para acidentes pessoais e auxílio dedicado a cães e gatos, com consultas veterinárias, emergenciais, hospedagem e assistência funeral, além de cobertura de acidentes pessoais. A novidade é destinada às clientes do mBank. Ainda não comentamos a aderência, por ser algo muito novo, mas estamos animados.
O varejo brasileiro vem sofrendo com a concorrência feroz de varejistas internacionais, a exemplo da chinesa Shein, notória pelos preços baixos. Ela é um risco para a Marisa?
Em um momento econômico como este sabemos a importância de garantir bom preço e acessibilidade. Fazemos isto com proposta de valor e oferecendo serviços importantes. Mas temos uma visão pragmática de que é preciso ser rentável e sustentável. Então, se tivermos que desacelerar o e-commerce, por exemplo, para ter rentabilidade, assim faremos porque é a coisa certa.
O desafio do mercado é querer combater uma Shein a qualquer custo e não acredito nisto. É importante comentar que também seguimos investindo na loja física, que atrai a mulher que está na rua, que está a caminho do trabalho e de outros compromissos.
Por isto, no final do ano passado reformamos quatro lojas em São Paulo com iluminação melhor, provadores amplos e experiência multicanal. Não investíamos na atualização de loja há seis anos, mas entendemos a importância dessa estratégia completa, com modelo replicável e rentável.
E quais são as expectativas em relação à 2022?
2022 é um ano incerto, começamos com os desafios da ômicron, e agora estamos recuperando o fluxo de loja. Mas também estamos em um ano de eleição, que pode gerar investimentos e impactar o varejo. No geral, tendo a ser mais otimista do que as previsões originais porque estamos trabalhando para colher bons resultados.