Se prevenir é o melhor remédio, por que tão poucos brasileiros o fazem?
Dados apontam que 71% dos usuários do SUS não realizam atividades preventivas e, entre os que têm plano de saúde, só 15% participam de programas de prevenção.
O custo disso é alto: pacientes com doenças crônicas gastam até sete vezes mais do que os saudáveis. No Brasil, a medicina preventiva ainda é subvalorizada, apesar de ter potencial para reduzir custos e salvar vidas.
Foi essa realidade que o médico carioca Antônio Carlos Júnior decidiu enfrentar. Depois de superar um câncer, ele transformou sua experiência em inspiração para criar um modelo de saúde acessível, baseado na prevenção.
Assim nasceu a Cia do Médico, rede de clínicas de baixo custo que faturou 18 milhões de reais em 2024. “Na maioria das vezes, o paciente só procura o médico quando já está doente. Queremos mudar isso, oferecendo saúde preventiva a um custo acessível”, afirma o fundador.
Qual é a história da Cia do Médico
A história de Antônio Carlos é uma combinação de desafios pessoais e uma visão empreendedora.
Em 2024, ele foi diagnosticado com câncer e precisou interromper sua rotina para enfrentar o tratamento. Foi um momento de introspecção, mas também de transformação. "Percebi que, se para mim já era difícil, imagine para quem depende do SUS ou não tem recursos para acessar uma saúde de qualidade", diz.
Não foi a primeira vez que ele enfrentou dificuldades na carreira. Formado em medicina em 2005, Antônio abriu sua primeira clínica em 2008, mas o negócio não vingou.
"Faltava experiência em gestão", afirma. "Aprendi da maneira mais dura que ser um bom médico não é suficiente para ter sucesso empresarial".
Após o fechamento da clínica, decidiu investir em conhecimento: fez um MBA em vendas, marketing e geração de valor, além de imersões em gestão e empreendedorismo. "Eu sabia que precisava entender de negócios para evitar os mesmos erros."
Em 2020, no auge da pandemia de covid-19, nasceu a Cia do Médico. A ideia era simples, mas ousada: criar um modelo que combinasse prevenção, acessibilidade e qualidade.
A primeira unidade, inaugurada em Bangu, no Rio de Janeiro, foi fruto de um investimento de 2 milhões de reais feito em parceria com Luiz Henrique, amigo e sócio.
"O início foi desafiador. Tínhamos que convencer as pessoas de que cuidar da saúde antes de adoecer faz toda a diferença", afirma Antônio.
O sucesso não demorou a chegar. O modelo de acompanhamento anual, que custa 90 reais por mês e inclui seis especialidades, rapidamente ganhou adeptos.
“O brasileiro não está acostumado a se cuidar de forma preventiva, mas quando mostramos que isso pode ser acessível e eficiente, o interesse cresce”, diz.
Hoje, a rede conta com quatro unidades, todas na Zona Oeste do Rio: duas em Bangu, uma em Realengo e um medical center em Campo Grande, com quase 2 mil metros quadrados.
Planos para crescer com saúde
O ano de 2024 marcou a entrada da Cia do Médico no sistema de franquias.
São dois modelos de negócio disponíveis: clínicas compactas, com investimento inicial de 850.000 reais, e medical centers, que exigem aporte de 1,5 milhão de reais.
Apesar do foco no programa de acompanhamento anual, o modelo de franquia vai além da medicina preventiva. As unidades também geram receita com a locação de consultórios e espaços para outros profissionais de saúde. "Já temos clínicas faturando 60.000 reais por mês apenas com aluguéis, o que ajuda os franqueados a alcançarem o ponto de equilíbrio mais rápido", explica Antônio.
O objetivo é abrir de três a sete novas unidades em 2025, priorizando o Norte e o Nordeste, regiões onde o acesso à saúde ainda é mais precário.
“Manaus, por exemplo, é um mercado com muito potencial. Estamos avaliando abrir pelo menos duas clínicas na região”, diz.
Outro ponto estratégico é a tecnologia. A rede está desenvolvendo uma plataforma própria para integrar os serviços das unidades e facilitar o acompanhamento dos pacientes. “Queremos que o paciente tenha acesso ao histórico médico, agendamento e orientações na palma da mão. Isso vai aumentar a adesão ao programa de prevenção”, afirma.
O fundador também planeja fortalecer o ecossistema da Cia do Médico, aumentando o número de parceiros e especialidades disponíveis. “Nosso modelo não é só sobre atendimento, mas sobre construir um hub de saúde que conecte médicos, pacientes e outros serviços de forma eficiente. É um ciclo virtuoso em que todos ganham.”
Desafios no caminho
Apesar do otimismo, Antônio sabe que o caminho não é fácil. A medicina preventiva ainda enfrenta barreiras culturais no Brasil. “Muitas pessoas só procuram ajuda quando já estão doentes. Precisamos mudar essa mentalidade e mostrar que investir na saúde preventiva é mais barato e eficiente no longo prazo”, diz. Além disso, questões externas, como juros altos e reforma tributária, podem impactar o setor. "A reforma tributária pode trazer vantagens para nosso modelo, mas ainda há incertezas. Estamos atentos a isso", comenta.
O câncer também deixou uma marca pessoal no empreendedor. “Foi um divisor de águas. Hoje, vejo meu trabalho como uma missão: ajudar as pessoas a cuidarem de si mesmas antes que seja tarde demais. É isso que me motiva todos os dias”, afirma Antônio.