Sandro Ferraz, do Instituto Evollution: “A pior parte não era engordar. Era saber que eu era médico e não conseguia resolver nem o meu problema.” (Instituto Evollution/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 16 de outubro de 2025 às 07h14.
O empresário Sandro Ferraz sempre sonhou em ser médico — mas isso dizia pouco sobre o caminho que ele de fato trilhava.
Aos 17 anos, treinava para ser nadador profissional, uma carreira que ele mesmo define como “um sonho mais do meu pai do que meu”.
As coisas mudaram depois de um acidente de moto no interior do Rio de Janeiro.
Ele sofreu uma fratura exposta no fêmur, uma luxação no quadril e um traumatismo craniano. Passou um mês na UTI e seis meses sem andar. “Aquilo me tirou da natação. Mas, ao mesmo tempo, me colocou de volta no que eu sempre quis ser: médico”, diz.
Ferraz se formou em medicina em 2008, no Rio, e se mudou para São Paulo logo depois. Começou atendendo em plantões e se especializou em gastroenterologia, mas vivia um outro conflito: aos poucos, passou a ganhar peso, até atingir 120 quilos.
“O que eu sabia de medicina não resolvia nem o meu problema”, diz.
Foi ali que começou a estudar nutrologia. Aplicou os conhecimentos em si mesmo, eliminou 29 quilos e percebeu que havia encontrado mais do que uma solução: tinha achado um novo caminho de atuação médica.
Hoje, ele é fundador do Instituto Evollution, uma rede de clínicas com foco em emagrecimento saudável, saúde preventiva e medicina integrativa. E é inimigo número 1 do que chama de “receitinha pronta para emagrecer”.
Em 2024, o negócio faturou 20 milhões de reais. A próxima aposta é a inauguração da maior unidade da rede, em Alphaville, e um plano de expansão por franquias.
A meta: alcançar 200 milhões de reais em receita até 2030. “Eu fui espremido para empreender. Nunca quis abrir uma clínica. Só entendi que era o meu caminho depois de quase morrer e pesar 120 quilos”, afirma.
Sandro Ferraz nasceu em Araruama, cidade de pouco mais de 180.000 habitantes no interior do Rio de Janeiro.
Desde pequeno, dizia que queria ser médico — mas o caminho que trilhava era outro. Começou a nadar aos 3 anos e, por muitos anos, treinou com foco em competir profissionalmente. “Era o sonho do meu pai. Eu gostava, mas não era exatamente meu”, diz.
A rotina de treinos dominava a infância e a adolescência. A família girava em torno disso. A possibilidade de uma carreira olímpica era levada a sério em casa — até que, aos 17 anos, tudo mudou.
Um acidente de moto o tirou da água e o deixou seis meses sem andar. Ferraz teve fratura exposta no fêmur, traumatismo craniano e luxação de quadril. Passou um mês na UTI e saiu de cadeira de rodas.
O impacto do acidente foi mais emocional do que físico. Fora das piscinas, sem os treinos, ele viu a identidade de atleta se desmanchar. “Eu treinava todo dia. Tinha um corpo preparado para performance. Quando isso desaparece, você se sente meio perdido.”
Foi nessa fase que se aproximou de vez da medicina. Aos 20 anos, entrou na faculdade no Rio e, em 2008, se formou. Quase ao mesmo tempo, decidiu se mudar para São Paulo.
“Sabia que tudo que era novo na medicina chegava aqui antes. Não queria fazer mais do mesmo.” O plano era atender, especializar e seguir carreira médica. Mas o corpo, mais uma vez, começou a cobrar outro tipo de atenção.
Nos plantões de madrugada, ele comia o que dava, dormia mal e se acostumou a um corpo que não respondia mais.
“A pior parte não era engordar. Era saber que eu era médico e não conseguia resolver nem o meu problema.”
Foi essa frustração que o empurrou para a nutrologia. Ferraz mergulhou em cursos, estudou endocrinologia, medicina do esporte e longevidade, e aplicou os próprios métodos. O resultado veio em meses: perdeu 29 quilos e viu a rotina mudar.
A experiência pessoal virou combustível para a carreira. O que começou como tentativa de autoconhecimento se transformou em uma metodologia aplicada em consultório.
O primeiro consultório próprio veio em 2014. Era alugado, pequeno, com 8 metros quadrados, móveis improvisados e café em copo descartável. Atendia aos sábados, no Tatuapé, zona leste de São Paulo. “Ali foi o embrião de tudo. E já não dava conta da demanda.”
Aos poucos, Ferraz começou a organizar a agenda, montar equipe e estruturar um atendimento mais completo — com exames, plano alimentar e protocolos personalizados.
Foi também nesse período que desenvolveu o Programa de Emagrecimento Saudável (PES), metodologia própria que combinava acompanhamento médico, nutricional e comportamental. “Eu já tinha vivido isso. Sabia onde o processo falhava.”
O modelo cresceu rápido. Em dois anos, abriu a primeira clínica com 100 m². Depois, outras duas unidades vieram na sequência — uma na região da Paulista, outra na zona sul. Chegou a operar com 12 médicos. Mas quanto mais crescia, mais difícil ficava manter a consistência da experiência. “Tudo ainda girava em torno de mim. Isso me travava.”
A virada aconteceu depois de uma viagem a trabalho para Las Vegas. Planejava passar 12 dias com a esposa, mas teve que voltar no quinto. “O dinheiro acabou. E ficou claro: eu precisava de um negócio que funcionasse sem mim atrás da mesa.”
Foi quando começou a redesenhar o modelo com foco em escalabilidade.
Hoje, só mantém sob gestão direta a unidade da Anália Franco. As outras foram vendidas. O foco agora é a nova clínica de Alphaville, com 800 m² e equipamentos de ponta — como esteiras a vácuo, cápsulas de nitrogênio e exames de termografia.
O espaço também terá estrutura para uma operação 100% multidisciplinar, com atendimento médico, nutricional, psicológico e físico no mesmo lugar.
A nova clínica de Alphaville vai funcionar em dois formatos: atendimento pontual (consulta, exames, protocolos avulsos) e um clube de saúde com adesão mensal.
O plano, batizado de Evolution Care Club, vai custar 7.900 reais por mês e dará acesso ilimitado a todos os equipamentos e especialidades da clínica.
O modelo é inspirado em academias de alto padrão e clubes de lifestyle voltados ao bem-estar e longevidade.
“Não é hospital. Não é clínica comum. É uma experiência de autocuidado contínuo.” A estrutura foi pensada para um público de alto poder aquisitivo, que procura soluções de saúde com conforto, privacidade e tecnologia.
Além do atendimento, Ferraz fala sobre “criar uma tribo”. A ideia é formar um grupo de pessoas que compartilham da mesma mentalidade: saúde como prioridade. O ambiente foi desenhado com esse conceito — iluminação específica, identidade olfativa, obras de arte e móveis assinados. “A arquitetura comunica tanto quanto o conteúdo técnico.”
Em paralelo, o Instituto também se prepara para lançar uma linha de roupas com foco em conforto e estilo de vida saudável, em tons neutros e cortes minimalistas. “Tudo parte do mesmo conceito: ajudar a pessoa a viver a saúde que ela quer projetar para o mundo.
A expansão por franquias começa em 2026.
A meta é abrir 30 unidades até 2030, operando em pelo menos 10 estados.
Para desenhar o modelo, Ferraz firmou parceria com a consultoria Bittencourt. O plano é agressivo: gerar 200 milhões de reais em receita por ano no fim do período.
Mas a decisão de franquear demorou para sair do papel. “Por anos eu adiei. Porque não queria colocar meu nome num negócio que eu não pudesse garantir a entrega”, diz.
O maior medo era depender de franqueados que não tivessem o mesmo padrão de atendimento. “Não é só sobre ser médico. Tem que ser gestor, comunicador, líder.”
A solução foi manter 30% de participação nas unidades franqueadas e levar sua equipe para implementar os processos. O modelo também inclui fontes de receita independentes do médico — como os equipamentos de tecnologia e os protocolos prontos de atendimento.
Além disso, o Instituto oferece mentoria para médicos interessados em empreender. “Escalar é fácil. Escalar sem virar genérico é o desafio", diz.
Nos últimos anos, o mercado de emagrecimento foi dominado por medicamentos injetáveis como Ozempic e Mounjaro — as chamadas “canetinhas”.
Eles atuam no controle do apetite e ajudam a reduzir o peso de forma rápida. São cada vez mais prescritos por médicos e desejados por pacientes. Ferraz conhece bem o fenômeno, mas prefere colocar as coisas em perspectiva.
“Dizer que não funciona seria mentira. Eles ajudam, claro. Mas isso é só um pedaço da história. E o mais fácil, pra falar a verdade.”
Para ele, o uso isolado das canetas cria uma ilusão de resultado definitivo.
“Você emagrece, mas não muda o comportamento. Não entende o que te fez engordar. E quando o remédio acaba, tudo volta.”
Na prática, o protocolo do Instituto Evollution até pode incluir o uso dos medicamentos — mas sempre dentro de uma abordagem mais ampla.
O foco, segundo Ferraz, está em preservar a massa muscular, reduzir gordura de forma saudável e tratar os fatores emocionais envolvidos.
“A maioria das pessoas que chega aqui já tentou de tudo. Dieta, remédio, jejum, coach. Mas nenhuma dessas coisas funciona sozinha.”
A crítica não é ao medicamento em si, mas à promessa de solução mágica.
“A indústria vende a ideia de que basta aplicar uma injeção e tudo muda. Não muda. O paciente precisa entender o que está por trás do ganho de peso. E isso não vem num frasco.”