Negócios

Deeptech pernambucana ganha escala global e projeta crescer 150% até 2026

Com tecnologia distribuída em cinco países da Europa, Ásia e Estados Unidos, Poliana Silva e Gisela Sales, fundadoras da NMRec, mostram que a inovação também tem sotaque nordestino – e voz feminina

Poliana Silva e Gisela Sales, fundadoras da deeptech NMRee.

Poliana Silva e Gisela Sales, fundadoras da deeptech NMRee.

Caroline Marino
Caroline Marino

Jornalista especializada em carreira, RH e negócios

Publicado em 24 de novembro de 2025 às 16h01.

Ciência, pesquisa e propósito movem a trajetória das pernambucanas Poliana Silva e Gisela Sales. A partir de um experimento acadêmico, elas fundaram a deeptech NMRec que, em menos de dois anos de operação formal, se tornou um caso de sucesso da inovação científica brasileira. O negócio nasceu para provar que ciência e empreendedorismo podem caminhar lado a lado e que mulheres à frente da tecnologia são capazes de romper barreiras e levar conhecimento de ponta para o mercado global.

O embrião do negócio surgiu nos laboratórios da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde a dupla transformou anos de análises em uma solução capaz de revolucionar a Ressonância Magnética Nuclear (RMN). A startup desenvolve materiais e tecnologias que tornam o método mais preciso, permitindo que cientistas e indústrias “enxerguem” moléculas em três dimensões com agilidade e confiabilidade – uma solução que reduz custos, etapas e tempo em análises químicas e farmacêuticas.

Hoje, a empresa atende mais de 20 clientes internacionais e tem sua tecnologia distribuída em cinco países da Europa, Ásia e Estados Unidos, graças à parceria com a espanhola Mestrelab Research. A companhia mantém um contrato internacional de R$ 125 mil e já captou cerca de R$ 250 mil em investimentos por meio de editais e programas de fomento, como Finep Mulheres Inovadoras 2024, Facepe 2024/2025, Growth Fast Motion 2024 e Catalisa ICT 2025.

Com uma jornada que mistura ousadia e visão de mercado, a NMRec dobrou a base de clientes em 2025 e projeta crescimento de 150% até 2026, quando deve ingressar diretamente no mercado europeu. O plano de longo prazo é ambicioso: abrir o próprio espaço de pesquisa no Recife e, em até cinco anos, inaugurar a primeira filial internacional, consolidando-se como referência global em controle de qualidade por RMN.

Quando a ciência encontra o empreendedorismo

A conexão entre as cientistas aconteceu em um laboratório da UFPE. Gisela, então mestranda, buscava um modo de aplicar seu estudo ao dia a dia das indústrias, enquanto Poliana, já com experiência em gestão e planejamento, via na tecnologia uma oportunidade de transformar conhecimento acadêmico em produto. “Quando meus antigos parceiros deixaram o projeto, percebi que Poliana seria a pessoa ideal para me ajudar a estruturar a NMRec como empresa. Não teria conseguido sozinha.”

A complementaridade entre as duas foi instantânea: Gisela cuidando da pesquisa e do desenvolvimento dos produtos, e a sócia estruturando o modelo de negócios, a parte financeira e as conexões estratégicas.

Desafios tecnológicos

Esse caminho de desenvolvimento foi marcado por desafios que são típicos das deeptechs e ainda mais intensos para mulheres, como trabalhar com equipamentos caros e insumos importados num país que investe pouco em ciência. “Mas tivemos a sorte de encontrar pessoas que acreditaram no nosso potencial”, diz Poliana. Entre os apoiadores está o professor Armando Navarro-Vázquez, da UFPE, que cedeu infraestrutura, orientação técnica e acesso a equipamentos no Parque Tecnológico ParqueTec.

O reconhecimento veio rápido. Em pouco tempo, parcerias e contratos com companhias fora do país começaram a surgir. “Ver nossa tecnologia sendo utilizada em laboratórios da Espanha e dos Estados Unidos foi um divisor de águas. É a prova de que a ciência brasileira tem qualidade e competitividade para o mercado global”, afirma Gisela.

Atualmente, seis pessoas – entre cientistas, técnicos e equipe de vendas – atuam na startup, que desenvolve materiais que ajudam pesquisadores e indústrias a enxergar moléculas com muito mais precisão. O principal produto é a linha Clarity Gels, géis inéditos no Brasil que fazem as moléculas se alinharem dentro do tubo de RMN, técnica usada para identificar estruturas químicas. De maneira mais prática, quando a molécula está dentro do gel, é possível ver detalhes dos ângulos e das posições entre os átomos, algo essencial para entender como ela se organiza no espaço. Antes isso só era viável obtendo dados de várias técnicas diferentes para montar a estrutura 3D de uma molécula.

Há também serviços de controle de qualidade, consultoria e estudos completos de moléculas, integrando ciência aplicada e resultado de mercado. “Nosso propósito é criar soluções que levem a pesquisa científica para a prática, com a mesma precisão que se espera dentro de um laboratório”, explica Poliana, reforçando que os estudos continuam.

A startup está incubada no ParqueTec e no centro IncubaScience (CETENE), desenvolvendo uma nova geração de Clarity Gels. Agora deuterados, com sensibilidade ainda maior e precisão aprimorada para análises químicas complexas.

Impacto e inspiração

Mais do que números e contratos, o que move as fundadoras é o desejo de criar impacto e inspirar outras mulheres cientistas a empreender. “Além das barreiras externas, existe uma batalha interna que cada uma de nós enfrenta: aquela voz que insiste em dizer que não somos boas o suficiente para ter uma empresa ou liderar”, afirma Poliana. Às que sonham em inovar, recomenda acreditar na ideia, mesmo quando tudo parece impossível.” E completa: “Medo todo mundo sente; o segredo é começar mesmo assim. O tempo vai passar de qualquer jeito, então, por que não tentar?”.

Para elas, cada etapa da jornada reforça que é possível fazer ciência de ponta e gerar negócios sustentáveis no Brasil. E que, quando lideradas por mulheres, essas iniciativas ganham um sentido ainda mais transformador.

Acompanhe tudo sobre:Construindo futuroshub sebrae

Mais de Negócios

Startup quer transformar o WhatsApp no maior terminal rodoviário do Brasil

EXAME é escolhida revista e site do ano no +Admirados de Economia e Negócios

Com US$ 23 e uma ideia, irmãos criam negócio que fatura mais de US$ 1 milhão por ano

Ele começou com US$ 0 e se recusou a trocar líderes — hoje comanda empresa de US$ 17 bilhões