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"Conta não pode ir para os acionistas da Petrobras", diz Samuel Pessôa

Para o economista, se for para a estatal atender a interesses sociais, é preciso fechar seu capital

 (Paulo Whitaker/Reuters)

(Paulo Whitaker/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 3 de junho de 2018 às 14h29.

Última atualização em 4 de junho de 2018 às 07h45.

São Paulo - A saída de Pedro Parente da presidência da Petrobrás indica que o executivo encontrou dificuldade para manter a política de preços do combustível alinhada com o mercado internacional, segundo Samuel Pessôa, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV- Ibre).

Para ele, se a sociedade quiser que a estatal atenda a interesses sociais e permitir a atuação de interesses políticos, é preciso fechar seu capital. "O futuro (da petroleira) depende do resultado eleitoral", diz.

Pessôa destaca que o governo perdeu a capacidade de gerenciar crises e afirma que o principal risco para o País, após a greve dos caminhoneiros, é que movimentos semelhantes comecem a ocorrer nos próximos meses. "Haveria um risco de estagflação."

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Como fica a Petrobrás após o anúncio de redução do preço de diesel, ainda que temporário, e a saída de Pedro Parente?

(A redução do preço) é um choque momentâneo. Eu entendo uma regra mais estável (para o preço do combustível), em vez de reajustes todo dia. Agora, a Petrobrás não pode subsidiar, tem de cobrar o preço internacional. A saída de Parente é péssima para a empresa e para o País. O interesse de utilizar a Petrobrás para fazer política se sobrepõe aos interesses da sociedade.

Sendo uma empresa estratégica para todos os setores da economia, ela não tem função social?

Entendo que, num período de guerra, haja uma ação da Petrobrás para garantir a estabilidade da oferta. Numa condição de normalidade, não entendo o subsídio. A maneira de fazer isso (subsidiar) é de uma forma transparente, com recursos do Tesouro, do contribuinte. A conta não pode ser jogada nos acionistas da Petrobrás.

Por quê?

Porque a decisão é da sociedade. A empresa tem de ter a gestão bem feita e vai dar lucro. Esse lucro vai gerar dividendos para o governo. Não sei por que aquele cara que comprou uma ação da Petrobrás acreditando numa guinada política tenha de sofrer perda no seu patrimônio porque a política mudou. É uma empresa que está listada em Bolsa e obedece uma governança que não permite atuação política. Se a gente, enquanto sociedade, achar que a empresa tem de ser usada com esse fim, aí temos de comprar as ações de volta. Fechar o capital da empresa.

A saída de Parente indica que a empresa vai voltar a subsidiar o combustível?

Havia espaço para ele negociar uma nova regra de preço que reduzisse as oscilações. Mas o fato de ele ter saído e, antes mesmo disso, sinalizado que estava disposto a negociar alguma outra regra que reduzisse a oscilação, mas que não mudasse o princípio básico de precificação pelo custo de oportunidade - que é dado pelo preço do bem no mercado internacional -, significa que ele estava com dificuldade de impor esse princípio. Mas não dá para fazer prognóstico do que acontecerá na Petrobrás. A saída dele muda todo o jogo. O governo está no fim. O futuro dela depende do resultado eleitoral.

Essa crise na empresa abre espaço para um debate em torno da privatização ou da estatização total?

Isso estava posto independentemente desse processo. Temos uma eleição difícil, um problema fiscal dramático e a sociedade vai ter de conversar com ela mesma. Não tem saída fácil e certamente a inserção do Estado, mais interventor ou que garanta mais bem estar social será tema importante.

Quais os impactos da greve na economia?

O impacto imediato é uma tendência de estagflação, porque a greve desorganiza a produção. Com isso, faltam bens e serviços, os preços sobem e a produção cai. Mas esperamos que, com a normalização da situação, os preços reduzam. Só não sabemos quanto tempo vai demorar esse processo.

Não é cedo para falar em estagflação? Vínhamos de uma inflação muito baixa. Não há espaço para um aumento de preços momentâneo sem gerar pressão inflacionária?

Com certeza. O que eu digo é uma tendência, um choque estagflacionário. A inflação estava em nível muito baixo. Se bem que ela já viria pressionada em junho em função da desvalorização do câmbio e do aumento do petróleo. Mas, adicionalmente, temos agora o impacto da greve.

O governo respondeu de forma correta à greve?

Me parece que estava mal informado. Depois que a crise está instaurada, com pintinhos morrendo, filas quilométricas nos postos e todas as cidades em clima de feriado, o poder de barganha do lado grevista é muito forte. É difícil não ceder. Não acho que o problema tenha sido esse. Tinha de ter agido antes. Tinha de estar acompanhando com mais cuidado.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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