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Compliance na Petrobras passou de um lado para outro, diz gerente demitido

Demissão de Cláudio Costa foi justificada nos bastidores porque ele teria feito "insider trading". Ou seja, usado informação privilegiada para vender ações

Petrobras: ações da estatal registravam queda de cerca de 20% (Dado Galdieri/Bloomberg)

Petrobras: ações da estatal registravam queda de cerca de 20% (Dado Galdieri/Bloomberg)

Victor Sena

Victor Sena

Publicado em 14 de abril de 2021 às 17h51.

Última atualização em 16 de abril de 2021 às 09h13.

Altas nos preços dos combustíveis, troca na presidência e oscilação no valor das ações. Desde fevereiro, esses são alguns dos assuntos que fizeram com que a Petrobras não saísse do noticiário. Nesta semana, ela ainda passou pela troca de comando com a substituição de sete nomes em seu conselho.

Essa forte exposição da empresa nos últimos meses pode ter sido um dos motivos que levaram o então presidente da companhia, Roberto Castello Branco, a demitir o ex-gerente de recursos humanos da empresa Cláudio Costa, sem que se iniciasse uma investigação, na visão de Costa.

A demissão de Cláudio Costa foi justificada nos bastidores porque ele teria feito insider trading. Ou seja, usado informação privilegiada de um futuro aumento no preço dos combustíveis para vender suas ações da companhia, que se valorizariam.

Em entrevista à EXAME, ele afirma que não houve informação privilegiada e sua compra e venda de ações ocorreram dentro das normas.

Por trás desta suposta inconsistência em sua demissão, Cláudio Costa acredita que Roberto Castello Branco foi mal assessorado e que, desde a descoberta da Operação Lava-Jato, a empresa vive uma cultura extrema de denuncismo, em que o compliance vive num extremo oposto do que era antes.

“Tem um grave erro processual e de julgamento das áreas de relações com investidores e de conformidade da Petrobras. A decisão já estava tomada antes mesmo da apresentação dos fatos como eles são. A Petrobras é uma empresa tensa, em todos em sentidos. Com todo o episódio de Lava-Jato, ela tem um ambiente tenso e uma cultura de denuncismo. O pêndulo do compliance da Petrobras foi de um lado e partiu muito para o outro. Isso quem diz não sou só eu. Não tem julgamento de valor. Isso é um fato", aponta Cláudio.

Ele também comenta que essa cultura leva a uma certa apatia na gestão da empresa, o que faz com que gestores tenham medo de tomada de decisão.

Procurada pela EXAME, a Petrobras não comentou as críticas pontuais de Cláudio, mas explicou que sua demissão ocorreu por ele ter "atuado, em episódio pontual, em desacordo com o disposto na Política de Divulgação de Ato ou Fato Relevante e de Negociação de Valores Mobiliários, que veda a negociação de valores mobiliários de emissão da Petrobras por Pessoas Vinculadas nos 15 dias que antecedem a divulgação das demonstrações financeiras da companhia."

Durante a Operação Lava-Jato, em 2016, a Polícia Federal apontou que a Petrobras sofreu um prejuízo de 64 bilhões de reais de corrupção devido às práticas de corrupção, mas os valores são imprecisos. Desde que o esquema foi revelado, mais de 5,3 bilhões de reais já foram recuperados.

Relembre o caso

No dia 18 de fevereiro, a ação preferencial da Petrobras abriu a 30,38 reais, chegou a 30,92 reais, mas encerrou em 29,27 reais. Nesse dia, a empresa anunciou, próximo à abertura do pregão, reajuste nos preços dos combustíveis, o que incomodou o presidente Jair Bolsonaro, resultando na indicação do general Joaquim Silva e Luna para assumir a estatal. Neste dia 18, a gerente de investimentos de Cláudio Costa no Banco Safra vendeu 2.800 ações da empresa.

Desde o dia 9 de fevereiro, a venda estava proibida a membros do conselho de administração, do conselho fiscal e de quaisquer órgãos com funções técnicas ou consultivas.

Cláudio Costa afirma, porém, que não fazia parte desse grupo na sua função de gerente de recursos humanos e que solicitou ao Banco Safra em janeiro que fizesse as vendas assim que os papéis da empresa atingissem 30 reais. Em 5 de fevereiro, isso chegou a acontecer, mas segundo Costa, o banco não conseguiu fazer a venda.

"Não há descumprimento de política, de instrução da CVM. Ainda assim, quando eu recebi o extrato da operação feita pelo banco Safra eu encaminhei à gerente executiva de Relações com Investidores, que me respondeu da seguinte forma: 'Obrigada, Cláudio, pela informação'", explica o executivo.

Em 26 de março, 40 dias depois, Cláudio foi procurado por um gerente da área de conformidade, para marcar um reunião e pela secretária do presidente Roberto Castello Branco. Ambas as reuniões foram marcadas para a segunda-feira, 29 de março, de manhã.

A reunião com o gerente da área de conformidade aconteceu entre 8h30 e 9h30. Segundo Claudio, foi demonstrado nela um sinal positivo à sua versão. Logo depois, houve a reunião com Castello Branco, a advogada-geral da Petrobras e o chefe de gabinete, mas o tom desta foi diferente.

"Eu pedi um espaço de fala, mas não foi considerado no processo, meu julgamento é que o Roberto foi mal assessorado, com outros temas em volume que ele estava tocando. Ele não tomou a melhor decisão."

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