Inovação: estimular disputas nem sempre traz bons resultados para novos projetos (Dreamstime.com)
Luísa Melo
Publicado em 18 de setembro de 2014 às 08h00.
São Paulo - Estabelecer a competição entre grupos e oferecer incentivos (financeiros ou não) como recompensa é uma ferramenta muito usada por empresas na tentantiva de melhorar a performance dos funcionários.
Porém, uma pesquisa recente da Universidade de Washington sugere que essa estratégia pode ser uma furada, especialmente se a equipe em questão for majoritariamente feminina e o trabalho exigir inovação.
De acordo com o material, publicado em junho no jornal científico Organization Science, times formados por mais mulheres do que homens perdem em criatividade na medida em que a concorrência com outros grupos aumenta.
O estudo foi feito em duas etapas. Na primeira, 360 estudantes de graduação de uma grande universidade foram divididos em 90 times de quatro integrantes. Alguns deles eram compostos metade por homens e metade por mulheres, outros tinham mais homens do que mulheres e vice-versa.
A cada time, foi dada a missão de desenvolver um plano para tornar a universidade mais atrativa para futuros estudantes. O objetivo era conseguir a proposta mais criativa possível.
Foram estabelecidos, então, três níveis de competição. No primeiro, cada participante da equipe receberia 1 dólar (4 dólares, no total) e teria sua proposta encaminhada à faculdade se o grupo conseguisse ficar entre os 50 mais criativos.
No segundo, a recompensa seria de 10 dólares por pessoa (40 dólares, no total) se o time ficasse entre os 10 melhores. E, no terceiro, o prêmio poderia chegar a 100 dólares por indivíduo (400 dólares, ao todo), se o grupo fosse o único vencedor, o mais criativo de todos.
Para definir os vencedores, a colaboração do time e a criatividade da sugestão eram levadas em conta. Esses indicadores foram medidos e combinados por critérios matemáticos desenvolvidos pelos pesquisadores.
As descobertas foram curiosas. Enquanto nos grupos formados somente ou majoritariamente por homens a criatividade aumentou conforme o nível de competição foi elevado, em grupos formados exclusivamente ou na maior parte por mulheres os efeitos sobre a criatividade foram negativos na medida em que a concorrência ficava mais acirrada.
Essas tendências, mais tarde, foram testadas em uma segunda etapa: um estudo de campo realizado em uma empresa global de óleo e gás. Foram analisadas 64 equipes compostas basicamente de cientistas, engenheiros e técnicos dessa companhia. Esses grupos eram responsáveis por uma série de atividades de desenvolvimento e pesquisa que envolviam bastante criatividade.
Por meio de dados arquivados pelo RH da empresa foi possível identificar o tamanho e a variação de genêro das equipes (o número de funcionários em cada time variou entre quatro e 26 e o percentual de homens por grupo ficou entre 5% e 100%). Já o nível de colaboração e criatividade foi medido após análises de questionários respondidos por representantes dessas equipes.
Ao cruzar as informações, foram encontrados resultados parecidos com os da fase anterior: os efeitos positivos da competição sobre a criatividade foram encontrados em times com maior porporção de homens e os efeitos negativos em grupos com mais mulheres, mas somente quando a concorrência era elevada aos mais altos níveis.
Na prática
De acordo com a pesquisa, estabelecer a competição como forma de estimular a inovação e o surgimento novos projetos em uma empresa é uma faca de dois gumes.
Segundo aponta a publicação, além de ser relativa (porque funciona para alguns grupos, mas não para outros), a concorrência pode ainda representar uma perda de oportunidade no ambiente corporativo. Isso porque as mulheres representam "uma parcela cada vez mais crescente da força de trabalho" e são naturalmente mais criativas em ambientes colaborativos e pouco competitivos.
Porém, não é cabível dizer que elas são menos criativas do que os homens, segundo o professor Markus Baer, um dos autores do estudo. Quando os times precisavam trabalhar juntos, sem concorrer uns com os outros, aqueles com mais mulheres se saíam melhor do que os predominantemente masculinos.
"Aparentemente, as mulheres aderem a comportamentos que estimulam a criatividade em grupo (ou seja, por meio da colaboração) mais naturalmente que os homens. É por isso que elas tendem a se sair melhor que eles quando os times estão trabalhando lado a lado, sem competição", disse o pesquisador em entrevista a EXAME.com.
Ele reforça também que o estudo em nenhum momento sugere que as mulheres são piores competidoras do que os homens, mas sim que os estereótipos de gênero ainda existem e influenciam comportamentos.
"As pessoas não esperam que as mulheres se saiam bem em circunstâncias competitivas e, por isso, grande parte do público feminino pensa que não está mesmo apta a conseguir bons resultados sob essas condições. Essas crenças fazem com que as mulheres se desliguem de suas tarefas, colaborem menos e, por fim, sejam menos criativas".
Como agir?
De acordo com Baer, para conseguir extrair o máximo de criatividade de seus funcionários, gestores precisarão trabalhar com o equilíbrio.
"A competição só é realmente devastadora para a criatividade de equipes femininas quando ela se torna extremamente acirrada. E, para os homens, ela funciona muito bem. Então, eu sugeriria balancear a concorrência com a colaboração entre times para amenizar os efeitos negativos", aconselhou o professor.
"Uma alternativa, por exemplo, é forçar os times a compartilhar uns com os outros algumas ideias que eles tiverem, mesmo que eles estejam copetindo entre si por um prêmio global", completou.