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Como o Vale do Silício se tornou um destino do RH

As viagens ao Vale do Silício estão se popularizando entre os RHs. Elas podem ajudar a criar um olhar inovador, mas é preciso cuidado ao escolher o pacote

Vale do Silício: fundo investe em negócios inovadores nacionais com potencial de sucesso nos Estados Unidos e vice-versa (Foto/Getty Images)

Vale do Silício: fundo investe em negócios inovadores nacionais com potencial de sucesso nos Estados Unidos e vice-versa (Foto/Getty Images)

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Da Redação

Publicado em 30 de janeiro de 2019 às 06h00.

Última atualização em 30 de janeiro de 2019 às 06h00.

Visitar garagens não é tarefa (apenas) para os amantes de automóveis. Principalmente se for na Califórnia e se os espaços em questão são considerados históricos. No número 367 da Avenida Addison, em Palo Alto, fica o chamado local de nascimento do Vale do Silício — ou pelo menos é o que indica a placa na frente da casa.

Num predinho de tijolinhos à vista, moravam no 1o andar Dave Packard e sua mulher. Bill Hewlett vivia num galpão nos fundos. A garagem do edifício foi transformada no primeiro escritório da dupla que viria a se tornar a HP. Hoje, a casa e a garagem são fechadas para visitação, mas costumam ser pontos turísticos disputados por visitantes que vão para lá em busca de inspiração, inovação, networking e (por que não?) fotos para o Instagram.

No roteiro desses turistas, entram a garagem da família de Steve Jobs e o espaço no qual Sergei Brin e Larry Page começaram o Google. A própria sede do Google, assim como Facebook, Tesla, SAP e Netflix, faz parte da lista.

Completam a peregrinação passagens pelas Universidades Stanford, Berkeley e Singularity; visitas a aceleradoras, coworkings,­ cafés, museus e até a um mítico restaurante chinês adorado por Craig Barrett, ex-CEO da Intel, que, lá dentro, recebeu a seguinte mensagem de um biscoito da sorte: “O mundo sempre aceitará talento com braços abertos”.

Garagem de Dave Packard (acima)e grupo de RHs em frente à casa do americano (abaixo): nesse endereço, considerado o berço do Vale do Silício, Dave e Bill Hewlett fundaram a HP | Fotos: Getty Images e Divulgação

Forma de pensar

Antes muito procurado por entusiastas da tecnologia e aspirantes a empreendedores, o apelo do Silicon Valley agora conquista o mundo do RH. Milva Pagano, presidente da Associação Brasileira dos Profissionais de Recursos Humanos, tem um palpite para essa tendência.

“Muito se discute sobre como o futuro do emprego e da gestão de pessoas será afetado pela evolução tecnológica. O Vale do Silício é o berço de gigantes da inovação, que criam novas metodologias de trabalho”, diz.

E é para encontrar inspirações que os profissionais fazem as malas e passam por imersões que duram, em média, uma semana. Nesse período, enfrentam uma agenda intensa, normalmente das 7 às 20 horas, e que custa de 3 000 a 7 000 reais, sem incluir custos com passagem e hospedagem.

Felipe Cotta, diretor de RH do Citi, encarou a viagem em setembro de 2018. Curioso por natureza, ele queria sentir a atmosfera de inovação na pele. “Já havia lido muitos livros sobre o assunto, mas ouvir dos funcionários dessas empresas sobre a cultura delas e ver o ecossistema é uma experiência muito rica”, afirma.

Depois de voltar, Felipe ainda está processando todas as informações antes de colocar qualquer novidade em prática. “Vi muita transformação: assistente de inteligência que prevê queda do clima organizacional e empresas que já passaram da fase de tolerar o fracasso, o que ainda é um desafio no Brasil”, diz.

A experiência foi tão boa que Felipe pensa em mandar a liderança para lá. “Não é uma mudança imediata, mas a forma como eu vejo gestão de pessoas evoluiu”, afirma.

Esse sentimento é compartilhado por Vanessa Lobato, vice-presidente de RH do Santander. Incentivada pelo presidente, Sergio Rial, a buscar algo para se desenvolver, Vanessa foi para a Califórnia quando descobriu um programa voltado para RHs. Desembarcou em São Paulo cheia de ideias, que apresentou à equipe e aos colegas.

“Conhecimento não ocupa espaço, mas você tem de ir de cabeça aberta e buscar aprender”, afirma. Maria Susana de Souza, vice-presidente de RH da RaiaDrogasil, que fez a viagem no mesmo grupo, concorda. “Dizem que o Vale não é um lugar físico, mas uma forma de pensar, e eu senti isso mesmo”, diz a executiva, que quer fazer mudanças e descomplicar processos.

“Lá a avaliação de desempenho é menos orientada para nota e remuneração e mais voltada para desenvolvimento do indivíduo. Para uma organização que não é nativa digital, como a nossa, ainda há um caminho a percorrer. Mas com pressa”, diz Maria Susana.

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Aplicações práticas

Claro que ficar apenas no sentimento não é o objetivo dessas excursões — e alguns executivos conseguem usar o que aprenderam nos Estados Unidos para inovar no Brasil.

Na varejista C&A, por exemplo, a inspiração para um laboratório de criação de coleções, que lança produtos de diferentes estilistas a cada 15 dias, surgiu depois que Márcia Costa, vice-presidente de RH, voltou de sua imersão pela Califórnia.

A ideia veio da agilidade com que as startups americanas colocam suas criações no mercado. “É preciso ver onde a cultura ágil é aplicável”, diz Márcia, que organizou um grupo de viagens com outros colegas de RH.

No caso de Adriano Lima — ex-­executivo de gestão de pessoas do banco Itaú e que em 2017 decidiu virar empreendedor —, ter ido ao Vale foi essencial para que ele tivesse a ideia de criar a People Tech Mission, que leva profissionais de gestão de pessoas para imersões na atmosfera californiana.

“Ninguém vai chegar lá e mudar completamente, mas a experiência ensina bastante. Voltei com mais dúvidas do que com respostas — e saber fazer as perguntas é uma das habilidades mais importantes hoje”, afirma.

Além da PeopleTech, outras companhias oferecem esse tipo de imersão. As mais famosas são a StartSe, que leva a experiência a grupos maiores, de até 100 pessoas, e o Instituto Valor, que já fez mais de dez viagens desse tipo em cinco anos e que, em dezembro, mudou o destino para Israel, berço de grandes startups, como o Waze.

“O Vale do Silício virou carne de vaca. Há muitas missões de turismo. Nós focamos quem quer fazer negócio e, para isso, é preciso ter conteúdo. Um professor de Stanford cobra 10 000 dólares para uma diária.

Há programas que custam 2 000 dólares, mas aí é passeio para conhecer a Golden Gate”, diz Jorge Muzy, presidente do conselho do Instituto Valor. Ou seja, fuja dos pacotes que não oferecem oportunidades de aprendizado (como aulas e reuniões com executivos de companhias inovadoras) e só o estimulam a fotos das garagens dos gênios.

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