Reunião (foto/Thinkstock)
Karin Salomão
Publicado em 17 de outubro de 2018 às 06h00.
Última atualização em 17 de outubro de 2018 às 06h00.
São Paulo - Há poucos dias do segundo turno das eleições presidenciais, os ânimos estão mais acirrados que nunca. As discussões tomaram as ruas, redes sociais e até o ambiente de trabalho.
Nestas eleições, muitos empresários se posicionaram politicamente e houve até casos de coação, em que pediam votos a candidatos específicos a seus funcionários, com ameaças ao emprego.
Em um cenário tão tenso, como as empresas deveriam se posicionar? E como deveriam gerenciar seus funcionários para não criar um clima de trabalho ruim? A resposta é o diálogo, de acordo com Renato Grinberg, especialista em gestão e liderança e diretor da BTS, consultoria global presente em 35 países.
As empresas nem deveria se posicionar tão forte politicamente nem impedir qualquer debate político, mas sim promover espaços saudáveis de troca de ideias, de acordo com ele. É o que é feito na JoyPay, startup de máquinas de cartões da qual Grinberg é consultor.
Confira abaixo a entrevista com o consultor.
EXAME - Nessas eleições, vimos muitos empresários se posicionando politicamente. É o caso das lojas Havan, do Supermercados Condor e Centauro, que apoiam Bolsonaro. É uma boa estratégia?
Renato Grinberg - Todos têm direito de expressar suas opiniões e até de deixar claro qual é sua posição. Mas discordo de quando um empresário tem uma agenda política e a coloca para que seus funcionários a sigam. É até uma questão ética, de influenciar pessoas que têm menos poder e que estão de certa forma subjugados economicamente. Qualquer pessoa pode expressar suas opiniões, mas quando um funcionário fica constrangido a expressar sua opinião, por ser contrária a do chefe, é porque passou do limite.
Já em relação às empresas, como instituição, acho que se posicionar é um erro grave de estratégia e de marca. Se uma empresa se torna polarizada politicamente, os consumidores que não concordam passam a comprar em outro lugar.
O mesmo vale para artistas, que carregam também uma marca. Você não precisa "ter um lado", o que pode alienar os fãs que pensam de maneira diferente. O Brasil está muito polarizado e passional. Nesse cenário, ninguém deveria colocar seus ideais políticos à frente do negócio e da sua carreira.
Que conflitos as eleições podem criar dentro do ambiente de trabalho?
Há o risco de criar uma guerra entre empregado e patrão. De um lado, o empregado diz que pode perder direitos e, do outro, o patrão que diz que isso é necessário para a economia. No entanto, quando trazemos informação e educação para o debate, vemos o que é verdade nessas discussões. Na maior parte do tempo, as pessoas não sabem a fundo do que estão falando. Por exemplo, um ataque comum que estamos vendo é chamar o outro de fascista. Mas muitas vezes a pessoa xinga sem saber o que esse termo significa.
Então, como as empresas deveriam se posicionar durante as eleições?
Ao invés das empresas pedirem que os funcionários não falem sobre isso, para não gerar conflitos, as empresas deveriam criar fóruns para debater esses assuntos.
Precisa ter um mediador ou facilitador das conversas, para direcionar o debate para o campo das ideias. Pode ser discutido o que é um estado forte ou estado mínimo, por que um candidato fala isso ou aquilo, qual o impacto que cada governo pode ter. Mas apenas no campo das ideias, precisa tirar as conversas mais para o lado pessoal ou emocional, que não levam a lugar nenhum.
Esse debate precisa ser fisicamente? Temos visto muitas discussões nas redes sociais e grupos de Whatsapp, são eficientes?
Qualquer discussão presencial já tem mais chance de dar mais certo, porque você vê a pessoa e a enxerga como a si mesmo. Na internet, o debate é mais anônimo e as pessoas sentem que não podem ser atingidas por falar o que falam.
Além disso, nos fóruns que estamos desenvolvendo nas empresas, temos também a figura de um mediador, facilitador, que não existe nas redes sociais. Existem técnicas para mediar um debate da melhor forma possível.
Claramente não é dever da empresa de promover esse debate, ainda mais de passar conceitos básicos de política. Mas é uma boa prática. A educação é o grande problema e será a grande solução do país e as empresas podem ajudar.
E o grupo de Whatsapp da empresa, que tem muito envio de brincadeiras e até discussões, as empresas deveriam mediar esse meio?
Sim, a empresa deveria pedir para que as pessoas não postem imagens, vídeos ou brincadeiras nos grupos das empresas, deveriam fazer isso em grupos pessoais. Isso porque algumas brincadeiras podem ofender. Nas redes sociais, o debate é mais acalorado e é preciso tomar cuidado para não dar asas ao que pode ofender ou prejudicar a empresa.
Na última eleição dos Estados Unidos, que levou Donald Trump à presidência, muitas empresas mandaram cartas para os funcionários para defender seus funcionários gays, negros ou imigrantes, grupos que eram atingidos pelo discurso de Trump. É o caso do Tim Cook, da Apple. E esse tipo de posicionamento, é correto?
Os Estados Unidos, comparados com o Brasil, são um país muito mais dividido em relação a raça, religião, orientação sexual.
Claro, quando um candidato é acusado de muitos comentários preconceituosos, isso aparece. Mas acredito que as empresas deveriam ser mais neutras nesse aspecto e contratar as pessoas independentemente da raça, credo ou gênero.
Acredito também que mandar uma carta é hipocrisia. Se você precisa mandar carta para defender funcionários gays, negros ou estrangeiros, mostra apenas a fragilidade da companhia. Se a empresa tem uma política forte de diversidade, não importa quem for o presidente, ela irá continuar na mesma estratégia.
As empresas então não deveriam se posicionar favoravelmente a um ou outro candidato. Mas, em relação a diversidade, elas devem defender essas políticas?
Sem a menor sombra de dúvidas! Não apenas porque é politicamente correto, mas é a coisa mais inteligente do ponto de vista do negócio. Quando só tem pessoas iguais, as ideias também serão parecidas. Quando há pessoas diferentes, as ideias também são diferentes.