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Como adotar o 'modo aprendiz' pode transformar a sua liderança

Marcelo Cherto reflete sobre a importância da aprendizagem contínua para líderes. "Não basta acumular diplomas e títulos", diz

Marcelo Cherto
Marcelo Cherto

Consultor de Franquias

Publicado em 15 de julho de 2025 às 15h04.

Última atualização em 15 de julho de 2025 às 15h05.

Você certamente conhece ao menos um gestor que se considera pronto. Que acredita que, depois da faculdade, de uma eventual pós-graduação, talvez até mesmo um MBA, dos primeiros anos de carreira de sucesso e de uma lista respeitável de resultados, já está não tem mais o que aprender.

Provoco você, agora: tente imaginar um outro gestor, com um perfil totalmente diferente. Inquieto, curioso, sempre com um (ou mais de um) livro novo na cabeceira, que vive fuçando a Internet atrás de informações sobre os temas mais diversos, que participa de cursos, ouve podcasts sobre os mais diversos temas, aprende outros idiomas, vive trocando ideias com amigos e pares que atuam em outros setores e se mostra sempre disposto a questionar o próprio modelo mental.

Qual desses líderes você acha que será capaz de tomar decisões mais ousadas — e mais acertadas — em um mundo no qual tudo muda o tempo todo a uma velocidade estonteante, no qual aquilo que até ontem era a receita do sucesso, hoje simplesmente já não funciona?

A meu ver, o que diferencia gestores e profissionais excepcionais daqueles apenas ordinários não é apenas o seu talento, ou mesmo a experiência que trazem acumulada. É a disposição para se manterem, para sempre, no “modo aprendiz”. Numa era de mudanças exponenciais, o conhecimento é um ativo que precisa ser continuamente reciclado.

Não basta acumular diplomas e títulos. Cada um de nós precisa repensar o tempo todo o que sabe, ou acha que sabe, com coragem para jogar fora ideias e conceitos velhos e abrir espaço para aprender sobre temas relevantes que ainda não domina.

Aliás, por experiência própria, garanto que é mais difícil a gente se livrar de conceitos que envelheceram e já não se coadunam com a realidade atual, do que aprender coisas novas. Conheço pessoas inteligentíssimas que continuam querendo atuar no mercado como se ainda vivessem nos anos 80 ou 90, abraçados a velhas ideias que já não têm espaço no mundo de hoje. Nem preciso dizer que, não apenas não vão para a frente, como viram alvo de chacotas.

Lifelong learning: o aprendizado como sobrevivência

A essência do tal lifelong learning é essa: estar disposto a aprender ao longo da vida, sem data para terminar. Algo que eu prego e pratico.

É uma questão de escolha: a pessoa escolhe investir continuamente seu tempo, sua energia e alguns recursos em conhecimento, não como obrigação, mas como estratégia de sobrevivência (e de geração de vantagem competitiva). Como eu digo sempre, cachorro velho precisa estar sempre aprendendo truques novos, se quiser se manter relevante, útil e produtivo.

Quando um gestor se compromete com o aprendizado contínuo, algo muda na forma como ele vê o negócio que gere. Ele ou ela ganha repertório para analisar contextos mais complexos. Desenvolve visão estratégica para antecipar tendências, através da observação do que acontece ao seu redor e em outros cantos do mundo. Cria pontes com profissionais de outros ramos, que provêm de outras histórias, geografias e culturas — e, graças a isso, se coloca em condições de descobrir soluções onde muitos outros só enxergam problemas.

Como um curso em Harvard reinventou a minha liderança

Quero relatar aqui uma experiência pessoal, muito recente, que traduz de forma palpável o poder de um programa de aprendizado verdadeiramente transformador. Falo do curso Leading Professional Services Firms, da Harvard Business School, que ganhei de meu filho no ano passado, como presente pelos meus 70 anos, mas só consegui fazer neste ano. Meu garoto, uma das pessoas mais generosas que já conheci, disse que, como investi na educação dele a vida toda, era chegada a hora de retribuir na mesma moeda. Ele tinha certeza de que eu ia adorar o presente. Como de fato adorei.

Sem qualquer sombra de exagero, foi a melhor vivência de aprendizagem pela qual já passei na vida. E olhe que eu já fiz muitos cursos, inclusive um Mestrado em Direito na New York University, nos final dos anos 1970.

Não estou aqui para fazer propaganda de Harvard, até porque a instituição não precisa disso. O que faz desse curso algo tão poderoso não é só o conteúdo, que é fantasticamente bom. É a metodologia, 100% baseada em casos reais, que coloca cada participante cara a cara com dilemas verdadeiros enfrentados por empreendedores e executivos de organizações mundo afora. Em cada caso, o aluno não é um mero observador: é um decisor. Assume o papel de protagonista, argumenta, defende, ajusta sua estratégia na hora (com base no que dizem seus outros colegas, que têm experiências, culturas e línguas diferentes da sua), refina sua leitura de cada situação com base em perspectivas que nunca alcançaria sozinho e toma decisões. Decisões coerentes e consistentes.

Na minha classe, éramos 136 alunos de mais de 30 nacionalidades diferentes. Na maioria das aulas, éramos divididos em duas turmas de 68 alunos. E elas ocorriam em auditórios-arena confortáveis e equipados com tudo o que há de mais avançado em tecnologia voltada para o ensino, sob a orquestração de professores absurdamente fora da curva. Já volto a falar deles.

Antes, quero falar de uma peça altamente importante para que a metodologia funcione: o Grupo de Estudos, formados por 8 alunos (os mesmos durante todo o curso), que vivem juntos numa ala de um dos dormitórios, na qual há 8 apartamentos (pequenos, mas adequados), um lounge com mesa de reunião, poltronas e sofás, geladeira permanentemente abastecida, impressora, computados, copiadora, quadro branco e tudo mais que é necessário. É nesse grupinho que você discute diariamente os casos (logo cedo e à noite) e refina seus argumentos, antes de participar da discussão no grupão. Teoricamente as últimas discussões do dia deveriam terminar por volta de 21h30. Na prática, alguns de nossos debates foram até 23h. Regados a vinhos de alta qualidade e petiscos variados, que ninguém é de ferro...

Detalhes importantes:

  • Como se trata de um curso caro, cujo custo, na vastíssima maioria dos casos, é bancado pelas empresas nas quais os alunos ocupam uma posição de liderança, elas só matriculam os melhores entre os melhores. Aqueles que já estão no topo, ou tem altíssimo potencial para chegar lá muito em breve. E isso é muito importante quando se trata de discutir casos reais e trocar experiência.
  • Todos, sem exceção, se preparam muito ANTES de embarcar para Harvard. Três semanas antes de ir, a gente recebe os casos para analisar e algumas leituras adicionais. E estuda para valer, se não quiser passar vergonha. São muitas horas de leitura e análise. Cheguei a estudar até 8 horas num dia.

Na minha turma, cada um recebeu um total de cerca de 200 páginas A4, com casos complexos e muitas perguntas sobre cada um deles. Tudo em Inglês, é óbvio. Você tem que ler cada material pelo menos duas vezes e depois tentar responder as perguntas da melhor forma possível, lembrando que não há respostas certas ou erradas. Esse estudo prévio é que vai embasar as discussões no Grupo de Estudo e, depois, as discussões em classe, orquestradas por professores que são um espetáculo à parte, com sua didática, sua consistência e sua capacidade de engajar e liderar a classe.

Na maior parte do tempo, não dão aulas expositivas, nem se limitam a repassar slides ou fórmulas prontas: provocam, questionam, estimulam as divergências, brincam, extraem o melhor de cada pessoa na sala, costuram ideias aparentemente opostas, criam uma energia coletiva que faz o aluno sair de lá outro profissional. Lembram aquelas estrelas da Broadway, que cantam bem, dançam bem e representam melhor ainda. Ao final de muitas aulas, com duração de 90 minutos, me peguei pensando

“Mas já acabou? Que pena!”...

O retorno do investimento de tempo, energia e grana num curso assim, mais cedo ou mais tarde, aparece em decisões mais corajosas, em maior consciência dos próprios pontos fortes e fracos, em equipes mais inspiradas e em negócios mais preparados para o futuro. Com um ganho adicional, que não pode ser subestimado: o networking.

No meu caso, discutir com gestores e empreendedores de alto nível, vindos de várias partes do mundo — cada um trazendo dilemas, soluções e visões distintas — valeu por um curso à parte, sobre diversidade de pensamento e como todo problema pode ser resolvido de várias formas.

Embora eu fosse vinte e cinco, trinta ou mais anos mais velho do que qualquer dos colegas (na verdade, sou mais velho do que a maioria dos professores), fui muito bem acolhido. Me dei conta de que, num espaço desses, o que vale não é sua idade, nem a língua que você fala em casa, nem o perfil da empresa que você lidera, mas sim sua experiência, seus conhecimentos e sua disposição para compartilhá-los e para ouvir respeitosamente seus colegas, sem julgá-los e sem criticá-los, mesmo quando as opiniões deles divergem totalmente das suas.

Uma convivência assim, de muita camaradagem, mas também de muito respeito mútuo, abre portas, derruba muros e mostra que a resposta para um desafio que você está enfrentando na sua empresa neste momento pode vir de uma prática bem-sucedida em alguma outra geografia, outra cultura, outra forma de perceber o mundo.

É comum ouvir a pergunta: “Vale mesmo a pena investir tempo, energia e grana em educação continuada?”. A resposta mais honesta que posso dar é: experimente não investir, para você ver o que acontece...

Empresas lideradas por profissionais que se fecham em suas antigas certezas e são reféns das próprias crenças, tendem a se tornar lentas, míopes e vulneráveis a disrupções que hoje chegam de todos os lados. Confesso que morro de medo, não dos meus concorrentes conhecidos, mas do negócio que, neste momento, pode estar sendo criado numa garagem ou num apartamento qualquer, por dois ou três garotos desconhecidos e inexperientes, mas cheios de ideias e com habilidade em lidar com agentes de Inteligência Artificial e que talvez possa nos tornar (todos nós) totalmente obsoletos.

Da forma como eu vejo a coisa, ser um eterno aprendiz não é mais opcional. É essencial. É existencial.

O mundo dos negócios mudou. E as lideranças empresariais precisam mudar com ele. Se antes se esperava de um gestor que tivesse sempre a resposta certa, agora se espera que saiba formular as perguntas certas — e que tenha a humildade de, junto com sua equipe, buscar as melhores respostas em um ecossistema cada vez mais interdependente.

Continuar estudando não é só uma escolha de carreira. É uma forma de mostrar, com atitudes, que excelência empresarial não se improvisa: se constrói, hora após hora, dia após dia, projeto após projeto, decisão após decisão, o tempo todo. Como diz o lema da Cherto Consultoria, “1% melhor a cada dia. Todos os dias”.

Seja numa sala de aula da Harvard, em um curso online, em um grupo de estudo, num podcast ou em uma leitura de qualidade antes de dormir — cada pequena porção de conhecimento de conhecimento que você adquire amplia um pouco mais seu campo de visão. E quem enxerga mais longe é capaz de tomar decisões que transformam empresas inteiras e até setores inteiros.

Portanto, a pergunta certa a se fazer não é se você tem tempo, idade, coragem ou recursos para estudar. A pergunta certa é: você tem tempo, idade, coragem e recursos para parar de aprender?

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