Ricardo Cavalieri, presidente da Master Mares: "Se não encontrarmos novos mercados, podemos perder até 40% do faturamento” (CARL DE SOUZA / Colaborador/Getty Images)
Repórter
Publicado em 14 de agosto de 2025 às 08h04.
“Com o tarifaço de 50%, simplesmente não temos mais como competir. O preço não fecha”, diz Ricardo Cavalieri, presidente da Master Mares, empresa de distribuição de pescados do Rio de Janeiro.
A frase resume o pensamento de empresários brasileiros diante da nova medida imposta pelos Estados Unidos, que taxa com 50% de imposto centenas de produtos vindos do Brasil, como cosméticos, café, pescados e produtos com base florestal.
No caso da Master Mares, que faturou R$ 60 milhões em 2024, 40% do faturamento vinha justamente da exportação para os EUA.
“Absorvemos os 10% anteriores de maio, mas agora a conta não fecha mais. É inviável continuar exportando para os Estados Unidos”, conta Cavalieri.
A empresa foi fundada pelo avô italiano de Cavalieri, na década de 60, nas feiras livres cariocas. Com o tempo, a empresa cresceu, saiu das feiras e se industrializou, passando a abastecer o mercado norte-americano desde 2019 com peixes como serra, cavala, dourado e badejo.
Agora, com a nova política tarifária em vigor, ele mira novas rotas internacionais para sustentar o negócio e os mais de 140 empregos.
“A exportação para os EUA era nosso motor de crescimento. Agora, precisamos reinventar o negócio. Se não encontrarmos novos mercados, podemos perder até 40% do faturamento”, afirma o empresário
Cavalieri explica que o pescado destinado ao mercado externo exige um tratamento especial desde a origem.
“A exportação dava uma sobrevida aos barcos de pesca. Só em função disso, cerca de 50 barcos estavam trabalhando para a gente, porque o produto internacional exige um tratamento especial. Se a gente parar com a exportação, esses barcos vão parar também.”
Além da nova tarifa americana, o setor de pescados sofre também com o fechamento do mercado na Europa. Uma normativa sanitária da Comunidade Europeia exige adequações das embarcações brasileiras, conta o presidente da Master Mares.
“As embarcações cumpriram as exigências, mas o governo federal não mandou ninguém para certificar e liberar a exportação. Com isso, estamos fechados para a Europa há oito anos," diz o executivo.
Com a taxa alta americana e as porta fechadas da Europa, as empresas do setor do pescado ficam sem poder de negociação com grandes países, e a Ásia aproveita a situação.
"Como eles sabem que nós não podemos mandar para a Europa e agora nem mais para os Estados Unidos, eles impõem o preço. Negociar pescado para fora está ficando cada vez mais complicado”, afirma Cavalieri.
O tarifaço do presidente norte-americano Donald Trump afeta diretamente 35,9% do volume total de mercadorias enviadas ao mercado americano — o que representa cerca de 4% de todas as exportações brasileiras, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC). Dos cerca de 4 mil produtos que o Brasil exporta para os EUA, aproximadamente 700 ficaram de fora do tarifaço.
O impacto estimado já preocupa. Um estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) aponta que o tarifaço pode reduzir o Produto Interno Bruto brasileiro em R$ 25,8 bilhões no curto prazo, mesmo considerando isenções concedidas. No longo prazo, o prejuízo pode chegar a R$ 110 bilhões. Setores como o florestal, calçadista e o de carne bovina estão entre os mais prejudicados.
Para o advogado tributarista Bruno Medeiros Durão, especialista em finanças, o tarifaço exige mais do que uma reação pontual do governo. Segundo ele, a medida imposta pelos EUA demanda uma resposta coordenada entre Estado e setor privado.
“O tarifaço imposto pelos EUA não afeta apenas a arrecadação ou a balança comercial. Ele muda a lógica de competitividade de várias cadeias produtivas. As empresas precisam, desde já, repensar seus fluxos de exportação, rever contratos internacionais e reavaliar margens de lucro. O impacto é direto no caixa e na operação”, afirma Durão.