Negócios

Chery terá centro de pesquisas para desenvolver motores flex e elétricos no Brasil

Em entrevista ao site EXAME, o presidente da montadora no país detalha os planos para que a empresa ganhe mercado

Luis Curi: presidente da montadora no Brasil quer alcançar 3% do mercado em 2013 (.)

Luis Curi: presidente da montadora no Brasil quer alcançar 3% do mercado em 2013 (.)

DR

Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

Salto (SP) - Ainda é incomum ver trafegando pelas ruas os modelos da montadora chinesa Chery. No entanto, o ritmo de crescimento vem aumentando. Em outubro a empresa fechou o segundo mês consecutivo acima da marca de 1.000 unidades vendidas. Trata-se de um bom resultado para a companhia que chegou ao país há pouco mais de um ano. Para dar continuidade à estratégia global, a montadora, presente em 70 países, não podia deixar o Brasil de fora.

Hoje o país é o quarto do mundo em vendas de veículos -- e o primeiro para a Chery no mercado internacional. O bom desempenho da empresa fez com que os chineses decidissem construir uma fábrica e um centro de pesquisas no interior paulista, o primeiro fora da China. Os investimentos ainda não foram calculados. Para crescer, a montadora está desenvolvendo motores flex para seus modelos – algo imprescindível para conquistar o consumidor brasileiro.

Em entrevista ao site EXAME, o presidente da unidade brasileira Luis Curi, conta que a fábrica de Jacareí, a 70 quilômetros da capital paulista e avaliada em 400 milhões de dólares, produzirá dois modelos: os utilitários S18 e o A13, a partir de 2013, quando as obras devem ser concluídas. Serão 170.000 unidades por ano. Os outros quatro modelos que compõem o portfólio brasileiro da empresa continuarão sendo importados. Confira a entrevista.

EXAME - Como se diferenciar num mercado onde Ford, Fiat e Volkswagen têm participação de quase 80%?
Luis Curi -
Acredito que essa concentração das montadoras não vai durar por muito mais tempo. Outras chinesas e coreanas estão vindo com força também. A nosso favor, está o design dos carros assinado por estúdios internacionais como os italianos Bertone e Pinifarina (responsável pelos projetos da Ferrari e Masseratti). Mas o nosso maior diferencial no Brasil é o preço 30% mais baixo do que a concorrência, com itens de série como CD player, airbag, freios ABS, sensor de ré, em todos os carros. A China também se tornou algo fashion. Outro ponto foi a confiança dos grandes grupos de concessionárias que acreditaram na marca para que o consumidor se sentisse mais confortável. Com isso, esperamos chegar a 3% de mercado já com a fábrica em 2013. Hoje temos 0,30%. Vamos buscar o dobro no ano que vem, com a chegada do QQ, um modelo de 20.000 reais.

EXAME - Por que montar uma fábrica no Brasil, que tem um custo de produção 30% mais alto, quando o diferencial é o baixo custo chinês e o dólar atual favorece a importação?
Curi -
Com uma fábrica no país, não estaremos suscetíveis a uma oscilação do dólar. Além disso, para trazer um carro para cá, são 45 dias de transporte pelo mar, o que implica em custos. Eliminaremos também os 35% de imposto de importação e os 25% pagos para a marinha mercante. 


EXAME - A fábrica vai alterar o preço dos carros no Brasil?
Curi -
Não. Segundo nossos estudos de viabilidade econômica, vamos manter os preços como o grande atrativo. O percentual de mão-de-obra na produção de um veículo não é tão significante. As peças são a parte mais cara na formatação de preço, por isso teremos também uma produção junto com a fábrica.

EXAME - Por que escolheram Jacareí, no interior de São Paulo?
Curi -
Foi uma decisão técnica. A Chery contratou a PriceWaterhouse Coopers para pesquisar um local adequado. O estudo da consultoria apontou que Jacareí tinha uma vantagem: a posição estratégica e logística no corredor SP-RJ, próximo ao porto de São Sebastião. E também está muito próximo da indústria de autopeças e do maior mercado consumidor do Brasil. No entanto, as importações vão continuar.

EXAME - As montadoras tradicionais oferecem carros flex, uma particularidade do Brasil. A Chery pensa em desenvolver essa tecnologia para ganhar mais força no mercado nacional?
Curi -
Desde a chegada ao Brasil, pensamos em investir na tecnologia flex. Hoje os modelos não são flex, mas todos serão a partir do segundo semestre do ano que vem. Os importados e os fabricados aqui. A empresa Delphi que desenvolveu a tecnologia flex em parceria com a China, vai exportar para subsidiar a matriz, que usará os motores em outros modelos. Também desenvolveremos motores elétricos em nosso centro de pesquisa.

EXAME - Então podemos esperar modelos elétricos da Chery no mercado brasileiro?
Curi -
Por enquanto será só para pesquisa. O carro elétrico é uma tendência a longo prazo, assim como o híbrido.

EXAME - Com a fábrica e o centro de pesquisas, o Brasil passa a ser um exportador para a América Latina?
Curi -
Com certeza, o Brasil vai ser o pólo das Américas. Temos uma relação muito boa com os países sul-americanos. A Chery é muito forte no Caribe também. Vai facilitar bastante ter uma fábrica aqui.

EXAME - Um dos problemas de carros importados são os altos preços das peças quando há a necessidade de troca. Como evitar que isso aconteça?
Curi -
Uma das nossas primeiras preocupações foi desenvolver conteúdo local de peças de reposição de alto giro, de desgaste mais rápido. Os fornecedores estão aqui. Estamos formando um centro de distribuição de peças para a América do Sul, que vai ser junto com a fábrica. Em termos de logística, é mais fácil abastecer os países vizinhos a partir do Brasil do que importar da China.


EXAME - A Chery está presente nas regiões sul e sudeste. Já há planos de expansão?
Curi -
Hoje o nordeste é a região que apresenta o maior crescimento real na venda de veículos zero. A Chery começou pelo sul e sudeste para se fortalecer e depois investir numa expansão. Até o final do ano, estaremos em todo o nordeste e no norte também. Nós teremos 72 concessionárias até o fim do ano. Hoje temos 50. Para o nordeste, estamos adotando a providência de preço CIF. É o preço que o concessionário paga para ter o carro na porta dele. O nordeste tinha a penalidade de o frete ser quase o dobro de São Paulo, então nós unificamos isso de maneira que o carro custe o mesmo valor do sudeste. O nordeste ainda tem a oferecer uma mídia mais barata e nós vamos intensificar isso. É uma região olhada pela Chery, porque há milhões de novos consumidores na região que se beneficiam com a facilidade de crédito.

EXAME - Quais foram as dificuldades para trazer a Chery ao Brasil?
Curi -
Os chineses não conseguiam entender a complexidade da tributação brasileira com PIS, COFINS e ICMS. O mercado brasileiro, pelos números que apresentava, era muito cobiçado pela Chery, mas ao mesmo tempo amedrontava pela tributação e pelas leis específicas que regem o relacionamento entre montadoras e concessionárias. Com tantos impostos, os chineses achavam que seria impossível ser competitivo no mercado brasileiro, mas não podiam deixar de investir aqui. A saída foi oferecer um preço mais barato. Lá os preços dos carros estão na média do mercado. Em 2009, a Chery recebeu um financiamento de 1,5 bilhão de dólares para levar adiante a estratégia de internacionalização. Em dois anos, fui seis vezes à China e recebi a visita de um técnico que ficava o tempo inteiro comigo no primeiro ano de negociação. No segundo ano, vieram dois. Eles viam mercado, concorrência, equipamentos, praças de vendas, e tinham aulas de tributação brasileira até fechar o negócio.

EXAME - Como manter boas margens com um preço até 30% menor do que a concorrência?
Curi -
Há um sacrifício muito grande por parte na Chery no quesito margem e em cima da negociação com fornecedores. Só assim conseguiremos ganhar uma fatia maior no mercado.

Acompanhe tudo sobre:AutoindústriaCheryEmpresasEmpresas chinesasIndústriaIndústrias em geralMontadoras

Mais de Negócios

Setor de varejo e consumo lança manifesto alertando contra perigo das 'bets'

Onde está o Brasil no novo cenário de aportes em startups latinas — e o que olham os investidores

Tupperware entra em falência e credores disputam ativos da marca icônica

Num dos maiores cheques do ano, marketplace de atacados capta R$ 300 milhões rumo a 500 cidades