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Azul (quase) pronta para celebrar entrada em Congonhas

Após decisão da Anac, Azul deve herdar espaços para pousos e decolagens da Avianca Brasil em Congonhas, mas novas disputas podem se dar na Justiça

Aeroporto de Congonhas (Valter Campanato/Agência Brasil)

Aeroporto de Congonhas (Valter Campanato/Agência Brasil)

DG

Denyse Godoy

Publicado em 26 de julho de 2019 às 13h32.

Última atualização em 26 de julho de 2019 às 19h46.

O dia na sede da Azul Linhas Aéreas em Barueri, na Grande São Paulo, começou com ânimo renovado nesta sexta-feira. Depois de quatro meses brigando com as concorrentes Gol e Latam para abocanhar a parte mais valiosa do espólio da Avianca Brasil, os espaços para pouso e decolagem (slots) no aeroporto paulistano de Congonhas, a Azul teve ontem à noite uma resolução do órgão regulador do setor a seu favor.

Mas o clima não é de festa ainda. Após inúmeras reviravoltas e vaivéns do governo e da Justiça para decidir o destino da Avianca, controlada pelos irmãos boliviano-brasileiros Germán e José Efromovich, que pediu recuperação judicial em dezembro e deixou de operar em maio, a Azul sabe que não dá para comemorar antes de o seu primeiro voo da ponte aérea com o Rio de Janeiro efetivamente decolar.

Na quinta-feira à noite, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) mudou o critério para distribuição dos slots em Congonhas, o aeroporto mais movimentado e que abriga a rota mais lucrativa do país: a ligação entre as capitais paulista e fluminense. A norma anterior previa que, caso vagassem slots, 50% deveriam ser distribuídos proporcionalmente às companhias que já operam no aeroporto e o restante, repassados a novos entrantes – empresas que tivessem menos de cinco slots.

A Anac criou ontem uma regra especial temporária (até março) para repartir os 41 pares de slots em Congonhas da Avianca, que perdeu o direito aos seus espaços em todos os aeroportos por ficar tanto tempo sem voar. Os espaços serão entregues apenas aos novos entrantes, agora considerados como as companhias que possuem menos de 54 pares de slots no aeroporto. O objetivo, segundo a agência, é recompor a oferta de voos, reduzida após a paralisação da Avianca, aumentar a competição naquele mercado e oferecer aos passageiros novas opções de serviços.

Com 26 pares de slots atualmente em Congonhas, ou 4,8% do total, a Azul é a maior beneficiada pela medida. Desde março, a empresa fez duas propostas para comprar os ativos da Avianca, uma de 105 milhões de dólares e outra de 145 milhões de dólares, mas ambas foram rejeitadas por falta de acordo com os credores. A Azul não usava anteriormente os seus espaços para a ponte aérea Rio-São Paulo porque dizia que a quantidade não lhe permitia ser competitiva nessa rota. A Latam, com 236 pares de slots no aeroporto, ou 44%, e a Gol, com 234 pares, ou 43,6%, estão barradas na nova distribuição.

Vitória frágil

Até ontem, a Gol e a Latam eram vistas pelo mercado como as grandes vencedoras da disputa. Depois de um acordo com o fundo de investimentos americano Eliott, a quem a Avianca deve cerca de 2 bilhões de reais, as maiores companhias aéreas brasileiras arremataram em 10 de julho, em um leilão previsto no plano de recuperação judicial da empresa dos Efromovich, dois lotes de ativos que incluíam grande parte dos slots em Congonhas oferecendo 70 milhões de dólares cada. A Azul se recusou a participar do certame por discordar do acordo com o Eliott.

Era uma vitória frágil, entretanto. Primeiro porque a legislação brasileira não permite que slots sejam vendidos pelas companhias aéreas. Pelo menos sete credores têm atualmente ações na Justiça questionando o plano de recuperação judicial nesse e em outros pontos. Advogados envolvidos nas negociações enxergavam mais brechas para anular o resultado.

A Gol e a Latam diziam que assinaram seus acordos com o Eliott sem saber que a grande rival estava fazendo o mesmo, mas, como no final os contratos eram idênticos, especialistas viam margem para acionar a Justiça alegando formação de cartel pelas empresas. A Anac e também o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) já haviam sinalizado nas últimas semanas que poderiam mudar as normas de distribuição dos slots.

Azul joga parada

Desde 10 de julho, a Azul não se mexeu. Esperou para ver o que os reguladores fariam a respeito. Nos bastidores, John Rodgerson, presidente da empresa, continuava indignado com a maneira como o imbróglio havia se desenrolado. Dizia a interlocutores que alguém tinha que ter coragem de fazer o que é certo no Brasil, e que a Azul estava do lado certo, o lado dos consumidores e dos funcionários.

Em sua proposta, a Azul havia se comprometido a pagar as verbas rescisórias dos empregados dispensados pela Avianca e readmiti-los. Dos 8.000 funcionários da empresa dos Efromovich que foram para a rua, a Azul já contratou 400 pilotos, comissários e pessoal de apoio em solo e deve absorver mais caso de fato aumente seu número de voos em Congonhas.

Ao longo dos últimos meses, enquanto a Azul fazia campanha nas redes sociais para conseguir a simpatia da sociedade à sua causa e acusava os concorrentes de tumultuar o processo para forçar a quebra da Avianca e herdar os slots sem esforço, por conta da regra anterior, a Gol e a Latam subiram o tom contra a Azul. As rivais, que assim como a Azul injetaram dinheiro para manter a Avianca funcionando e transportaram seus clientes que ficaram a pé, diziam que era a Azul que queria burlar a lei para ficar com os slots pagando menos do que o justo.

E a Avianca?

Agora, ninguém vai pagar mais nada mesmo pelos slots. A continuidade do plano de recuperação judicial da Avianca e a quitação das dívidas com credores e funcionários é uma enorme incógnita e pode se arrastar por anos. O mais provável, segundo advogados que acompanham a novela, é que a falência da empresa dos Efromovich seja decretada, já que, além, dos slots, a companhia tem poucos ativos que possam ser vendidos para quitar as pendências.

A Gol não comentou a decisão da Anac e não respondeu a perguntas sobre eventuais medidas judiciais para questionar a mudança na norma. Em comunicado, a Latam disse que a resolução “reforça mais uma vez o cenário de insegurança jurídica do setor aéreo brasileiro, e que, além de não atender aos parâmetros globais da Associação Internacional de Transportes Aéreos, cede à pressão em benefício de um único player do mercado”. Também não respondeu se vai à Justiça.

Começa na segunda-feira a nova distribuição dos slots, válida para a temporada de 27 de outubro a 28 de março mas efetiva imediatamente para minimizar os transtornos causados pela interrupção do serviço da Avianca. Os preços das passagens da ponte aérea chegaram a triplicar nas últimas semanas em alguns horários.

A Azul disse em comunicado que confia “que os órgãos reguladores brasileiros encontrarão uma solução definitiva que trará maior benefício ao consumidor e um uso mais eficiente dos slots, que são um valioso recurso público”. A empresa adota uma postura cautelosa neste momento porque não se sabe ainda se a mudança temporária vai ser convertida em permanente depois de março e quem vai se apresentar como novo entrante para pleitear os slots em Congonhas.

Em novo comunicado hoje, acrescentou que “sem providências adicionais, será inevitável a fragmentação dos voos entre várias empresas entrantes em Congonhas, subaproveitando a oferta de assentos e a receita da administração aeroportuária”.

A Passaredo, de Ribeirão Preto, já havia manifestado intenção de pedir alguns dos espaços. A MAP Linhas Aéreas, que atua na região Norte do país, também anunciou ontem que quer uma fatia. Na seleção dos contemplados, segundo especialistas do setor, os reguladores devem levar em consideração a efetiva capacidade de a companhia começar a preencher o vácuo deixado pela Avianca o mais rápido possível.

A Infraero, que administra Congonhas, também tem interesse em que esse novo operador seja de grande porte e possa usar todos os slots, pagando mais taxas. A única certeza que se tem é a de que uma grande reorganização do setor aéreo brasileiro está em curso.

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