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Avior: a aérea que voaria alto se não fosse venezuelana

Depois que a Latam anunciou a suspensão de seus voos para a Venezuela, a conexão aérea direta entre o país e o Brasil passou a ser feita somente pela empresa


	Avior: empresa voa da cidade venezuelana de Barcelona para Manaus três vezes por semana
 (Reprodução/Facebook/Avior)

Avior: empresa voa da cidade venezuelana de Barcelona para Manaus três vezes por semana (Reprodução/Facebook/Avior)

Luísa Melo

Luísa Melo

Publicado em 28 de junho de 2016 às 10h28.

São Paulo - Depois que a Latam (nascida da fusão da chilena LAN com a TAM) anunciou a suspensão de seus voos para a Venezuela até agosto, assim como a Gol já havia feito, a conexão aérea direta entre o país e o Brasil ficou nas mãos de uma única empresa: a Avior.

A empresa venezuelana opera uma rota da cidade de Barcelona, no Caribe, para Manaus, no Amazonas, (e vice-versa), três vezes por semana.

Em outros contextos, a "exclusividade" poderia ser uma vantagem competitiva para a companhia, mas a complicada situação econômica e política do país bolivariano engessa as possibilidades.

As duas brasileiras deixaram de voar para o território vizinho porque não conseguiam trazer de volta as receitas acumuladas por lá. Air Canada, Alitalia e Lufthansa já tinham tomado a mesma decisão.

As aéreas estrangeiras precisam vender suas passagens na moeda venezuelana, o bolívar. O que sobra do faturamento após o pagamento de custos administrativos e taxas locais, por exemplo, precisa primeiro ser transformado em dólar, para depois ser repatriado.

O problema é que restrições cambiais adotadas em 2003 pelo então presidente Hugo Chávez tornam essa conversão praticamente impossível.

"A principal razão para tudo isso é a queda no preço do petróleo, que compromete a formação das reservas cambiais da Venezuela, altamente dependentes da exportação da commodity. Numa tentativa de ajuste, o governo passou a impedir a compra de dólares no mercado interno para remessas no exterior", explica Otto Nogami, professor de economia do Insper.

Apenas a Gol tinha 351 milhões de reais retidos no país em fevereiro. A Latam não revelou valores atualizados, mas disse que, em dezembro do ano passado, tinha 3 milhões de dólares presos no local. 

De acordo com a Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA, na sigla em inglês), a soma dos fundos do setor bloqueados no país chega a 3,8 bilhões de dólares.

"Sem poder remeter seu lucro para a matriz, fica desinteressante para as empresas de fora se manterem lá", reforça Nogami.

E o cenário só tende a se agravar. Conforme previsões do FMI (Fundo Monetário Internacional), o PIB venezuelano deve encolher 8% e a inflação deve crescer 500% neste ano.

Desafios internos

A limitação do acesso ao dólar, entretanto, prejudica também as aéreas venezuelanas, já que grande parte de suas despesas só podem ser quitadas na moeda.

"Cerca de 80% dos custos da aviação são em dólar", diz o piloto Paulo Villas-Bôas, professor de Ciências Aeronáuticas da PUC do Rio Grande do Sul.

São gastos com leasing (arrendamento) de aviões, compra de peças importadas, taxas de pouso e treinamentos internacionais, por exemplo.

Na avaliação do comandante, que voou para a Venezuela por muitos anos, a Avior e as concorrentes locais vão precisar de incentivos do estado para perpetuar seus negócios.

"O setor é muito dependente de capital de giro e não consegue estocar capacidade – quando um avião decola com assentos vazios, aquela receita é perdida. Essas empresas não vão ter condições de sustentar a operação com recursos próprios", afirma.

No entanto, é arriscado para as aéreas contar com subsídios enquanto o país enfrenta problemas graves como o desabastecimento de comida e itens de primeira necessidade, como papel higiênico.

"Se houver o objetivo de manter um fluxo de turismo na Venezuela, principalmente no Caribe, é possível, sim, que o governo aporte nas empresas. Mas é difícil imaginar o que se passa na cabeça da equipe do [presidente Nicolás] Maduro", comenta Nogami, do Insper.

A (ausência de) demanda por viagens para lá, inclusive, é outro impeditivo para que a Avior desponte, de acordo com Hildebrando Hoffmann, coordenador do curso ciências aeronáuticas da PUC do RS.

Ele comenta que, com as sanções econômicas, poucos executivos viajam para o país, os turistas fogem porque "falta de tudo" e os porões que deveriam transportar cargas ficam vazios.

"Não adianta uma empresa operar sozinha em um mercado fraco", diz.

Para o venezuelano Rafael Villa, professor de Relações Internacionais da USP, a Avior não deve conquistar espaço nem mesmo com a retomada da economia.

Na visão dele, a companhia ainda não tem capacidade e frota para absorver o vácuo deixado pela Latam e pela Gol.

"O trecho vai acabar sendo coberto pela Copa Airlines (do Panamá) ou pela Avianca (da Colômbia)".

Ambas as empresas já ligam o Brasil à Caracas, capital venezuelana, mas indiretamente. A primeira faz escala na cidade do Panamá e a segunda, em Bogotá.

Empresa realista

A Avior é uma companhia privada, de médio porte. No ano passado, ela transportou cerca de 960.000 passageiros, uma média de 80.000 por mês. Desse total, cerca de 70.000 (88%) foram para destinos internacionais.

Apenas para efeito de comparação, no mesmo período a Gol transportou aproximadamente 38,8 milhões de passageiros.

Sediada no aeroporto de José Antonio Anzoátegui, em Barcelona, ela tem aproximadamente 1.500 funcionários e uma frota de 27 aeronaves, grante parte pequenas.

Atualmente, voa para 16 destinos, sendo 8 deles internacionais (Curaçao, Aruba, Miami, Cidade do Panamá, Bogotá, Medellín, Guaiaquil e Manaus).

É presidida por Jorge Áñez, um de seus fundadores. Foi criada em 1994, a partir de um único jatinho Cessna com apenas cinco lugares, usado principalmente para transportar executivos da petroleira estatal PDVSA (Petróleos de Venezuela).

Passou a operar com voos regulares três anos depois, quando comprou outros nove jatinhos.

Seu crescimento se deu de fato no começo dos anos 2000, quando deixou de usar aviões de 12, 19 e 30 lugares e passou a voar com Boeings 737-200, com capacidade para 108 viajantes.

Ainda hoje, ela mantém cinco dessas aeronaves em operação  inclusive a que faz o trecho Barcelona-Manaus.

"São aviões analógicos, dos anos 70, que ninguém mais usa. Consomem muito combustível e são barulhentos, mas são extremamente seguros se têm a manutenção bem-feita", diz o comandante Villas-Bôas.

A partir de 2013, começou a integrar à frota o Boeing 737-400, mais moderno e maior, com capacidade para 144 passageiros.

No mesmo ano, expandiu os destinos e serviços oferecidos, aprimorando, por exemplo, o seu sistema de SAC.

Em 2015, criou a Avior Regional, braço que atende rotas internas antes "abandonadas", por meio de aviões turbo-hélice de apenas 50 lugares.

"É uma das poucas empresas que têm conseguido se firmar dentro da Venezuela nos últimos anos, justamente por ser realista. Tem pequenas aeronaves, mas adequadas. Não ficam vazias", comenta o professor Villa, da USP.

Neste ano, a companhia quer crescer ainda mais internacionalmente e chegar "às principais cidades da América do Sul e Central" e à Europa.

Também começou a usar quatro Airbus 340-300, grandes, com 255 lugares.

Os voos para Manaus começaram em junho do ano passado e ainda operam em modo não regular, ou seja: cada pouso precisa ser autorizado individualmente pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

Na semana passada, já estavam confirmados os três voos semanais de ida e volta até o dia 30 deste mês.

Ela já está em processo para homologação para entrar no mercado de voos regulares junto ao órgão. Para isso, terá que estruturar um escritório no país.

EXAME.com entrou em contato com a Avior, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria. 

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