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Até onde vai a quebradeira das empresas de shale e como fica o petróleo

Uma das mais emblemáticas petroleiras do setor, a Chesapeake Energy, acaba de pedir recuperação judicial, um sinal de reestruturação do mercado global

Barril de petróleo na Venezuela. Foto: Bloomberg (Bloomberg/Bloomberg)

Barril de petróleo na Venezuela. Foto: Bloomberg (Bloomberg/Bloomberg)

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Juliana Estigarribia

Publicado em 29 de junho de 2020 às 13h41.

Última atualização em 29 de junho de 2020 às 19h31.

Uma das empresas mais emblemáticas de shale gas dos Estados Unidos, a Chesapeake Energy, entrou com pedido de Chapter 11, equivalente ao processo de recuperação judicial do Brasil. A solicitação soma-se a pelo menos outras duas dezenas em território americano. Para especialistas ouvidos pela EXAME, o cenário aponta para um reequilíbrio de oferta e demanda global de petróleo, profundamente impactado pela pandemia do novo coronavírus, mas as empresas que não tiverem uma forte disciplina de capital podem ficar pelo caminho.

A Chesapeake é emblemática porque foi uma das pioneiras na extração de gás de fontes não-convencionais nos Estados Unidos. No primeiro trimestre deste ano, a produção da companhia atingiu cerca de 500.000 barris de óleo equivalente por dia (boe), o que a coloca no patamar das maiores petroleiras de shale gas.

Com a crise desencadeada pela pandemia, o valor de mercado da empresa americana despencou. Há um ano, a petroleira valia mais de 6 bilhões de dólares;  hoje, seu valor de mercado é de apenas 116 milhões de dólares.

Este não foi o primeiro pedido de Chapter 11 no setor e não deve ser o último. Mais de 20 empresas de shale já solicitaram o mecanismo de proteção, diante da queda brusca da receita e do alto nível de endividamento.

Embora estas petroleiras tenham elevado o seu nível de produtividade nos últimos anos, elas ainda trabalham com um breakeven (custo de produção que torna a operação viável) acima de 50 dólares, além de uma alta taxa de alavancagem.

Os preços do Brent vêm se mantendo estáveis nas últimas semanas, na casa dos 40 dólares, após se aproximarem do piso de 10 dólares em meados de abril, pico da pandemia no mundo todo. Se o atual patamar das cotações persistir, a quebradeira no setor torna-se inevitável.

"Com os preços muito baixos, o mercado deve se equilibrar naturalmente com a saída de perfuradores de alto custo, principalmente as empresas de shale gas", afirma Walter de Vitto, analista de óleo e gás da Tendências Consultoria.

Com o corte de oferta de quase 10 milhões de barris pelos membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e aliados, até o final de julho, os preços do barril tendem a apresentar um pouco mais de equilíbrio.

"A situação começará a melhorar no segundo semestre, quando devemos ter mais clareza da situação econômica global e também uma retomada mais firme das atividades ao redor do mundo", afirma Marcelo de Assis, chefe de pesquisa da Wood Mackenzie América Latina para a área de upstream.

Segundo a consultoria, nos níveis atuais de atividade, estima-se que muitas empresas precisem de um preço médio do Brent de 53 dólares para se equilibrar em 2020. Se a cotação média, neste ano, ficar em torno de 35 dólares, as petroleiras do mundo todo podem amargar 380 bilhões de dólares de perdas em fluxo de caixa.

Com as estimativas apontando para uma certa estabilidade no cenário de preços para o restante do ano - desde que não haja uma segunda grande onda de contágio no mundo -, por ora a situação de majors como ExxonMobil, Shell e, no Brasil, a Petrobras, está relativamente controlada, apontam especialistas.

Pacote de socorro

A indústria americana de shale gas tem centenas de empresas, que tornaram o país um exportador líquido de petróleo, após décadas de uma condição de importador da commodity.

No entanto, atualmente, o setor equivale a apenas 2,5% do índice acionário S&P (em valor de mercado). Em seu auge, no início dos anos 2000, esse número era de 25%.

"O valor de mercado das empresas de shale vem caindo há algum tempo, mas os investidores continuam dando dinheiro para elas", diz Otavio Costa, analista da gestora americana Crescat.

Neste sentido, cresce a expectativa de que Donald Trump lance mão de um pacote de socorro às petroleiras. A principal medida seria a oferta de garantias por parte do governo americano para que as empresas possam obter novos financiamentos.

Mas isso é exatamente o que os produtores do Oriente Médio e a Rússia não querem. Desde meados de 2014, o grupo vem tentando tirar de operação os produtores de shale, que inundaram o mercado global e derrubaram os preços.

Além disso, a expansão da indústria do shale reduziu drasticamente a dependência dos Estados Unidos, maior consumidor de petróleo do mundo, em relação ao produto do Oriente Médio.

Historicamente, o setor contribui para disputas geopolíticas, da Guerra do Yom Kippur, em 1973, entre Israel e países árabes, à Guerra do Golfo, deflagrada pela invasão do Kuwait pelo Iraque em 1990.

Após o desenvolvimento do shale americano, porém, pequenas e grandes disputas que antes faziam os preços disparar agora estão muito mais restritas a oscilações temporárias. Além disso, como o setor reduziu drasticamente a dependência externa, o interesse do governo Trump de salvar, mais uma vez, essa indústria, é muito grande.

Estoques

Os estoques de petróleo na cidade de Cushing, Oklahoma - referência para o mercado futuro - apresentam queda de aproximadamente 30% em relação aos níveis de abril, quando os contratos foram negociados no terreno negativo pela primeira vez na história.

 

Segundo especialistas, entretanto, a capacidade de armazenamento de petróleo ainda está no limite nos Estados Unidos, Europa e Ásia, quadro que só deve se estabilizar a partir do final do ano. Com isso, os preços da commodity tendem a continuar sofrendo pressão negativa nos próximos meses.

Enquanto a indústria global caminha, em tese, para um certo equilíbrio, a produção no Brasil está em queda, principalmente diante dos cortes de oferta promovidos pela Petrobras, como parte da estratégia da companhia para reduzir custos e concentrar esforços em campos mais rentáveis.

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) informou que a produção de petróleo caiu 5,4% em maio am relação a abril. No acumulado do ano, porém, a trajetória ainda é de alta.

Para os próximos meses, a tendência é que a produção continue recuando, em um cenário de pressão sobre os preços e demanda incerta.

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