Desastre da Vale: Equipes de resgate buscam vítimas do rompimento da barragem em Brumadinho (Adriano Machado/Reuters)
Karin Salomão
Publicado em 5 de fevereiro de 2019 às 11h03.
Última atualização em 5 de fevereiro de 2019 às 11h03.
Quando a barragem da Vale se rompeu em Brumadinho (MG) no dia 25 de janeiro, arrastando centenas de pessoas em 13 milhões de metros cúbicos de rejeitos, muitas dúvidas surgiram. Dentre os questionamentos estão a dimensão da responsabilidade da empresa na tragédia, os reparos às vítimas e seus familiares, a sobrevivência econômica da cidade sem a atividade na mina e a real dimensão dos danos causados à comunidade e ao meio ambiente.
Desde então, a Vale tem emitido diversos comunicados para tentar responder a algumas questões urgentes. Também anunciou uma série de medidas, de doações para a cidade de Brumadinho à instalação de redes para filtragem da água do rio Paraopeba, comprometido com o desastre.
Algumas perguntas, porém, seguem sem resposta. A mais importante é: por que a Vale não conseguiu evitar a segunda catástrofe em suas operações em três anos. Em 2015, o rompimento da barragem em Mariana (MG) causou 19 mortes. A operação era administrada pela Samarco, joint venture da Vale com a BHP. Até hoje, moradores de Mariana que tiveram suas vidas arrasadas ainda esperam a indenização da empresa.
Veja abaixo as principais respostas da Vale à tragédia em Brumadinho, que até agora matou 134 pessoas (199 continuam desaparecidas).
Assim que as primeiras notícias do rompimento da barragem do Córrego do Feijão em Brumadinho (MG) chegaram aos jornais, as comparações com outra tragédia recente foram imediatas. Há pouco mais de três anos, uma barragem se rompeu em Mariana (MG) e matou 19 pessoas. A operação era administrada pela mineradora Samarco, joint venture da Vale e da BHP.
A questão foi abordada pelo presidente da Vale, Fabio Schvartsman, no dia do rompimento da barragem em Brumadinho. “Como vou dizer que a gente aprendeu (após o acidente de Mariana) se acaba de acontecer um acidente desses? Viramos todas as barragens do avesso e contratamos as melhores auditorias do mundo para verificar o estado de todas elas. Fizemos tudo que a gente entende que era possível para garantir a segurança e a estabilidade. O fato é que não sabemos o que aconteceu e o que ocasionou, mas certamente vamos descobrir”, afirmou.
No dia 28 de janeiro, a Vale anunciou mudanças em seu sistema de remuneração, como consequência do rompimento da barragem em Brumadinho. A companhia suspendeu sua política de remuneração aos acionistas, e suspendeu o pagamento de dividendos e juros sobre capital próprio, assim como qualquer outra deliberação sobre recompra de ações de sua própria emissão. A mineradora divulgou ainda a suspensão do pagamento de bônus a seus executivos.
No dia 28 de janeiro, o advogado contratado pela companhia, Sergio Bermudes, afirmou que a empresa não via responsabilidade pelo ocorrido. "A Vale não vê responsabilidade. Nem por dolo, que é infração intencional da lei, nem por culpa, que é a infração da lei por imperícia, imprudência ou negligência. Ela atribui o acontecido a um caso fortuito que ela está apurando ainda", afirmou em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Ele também disse que a diretoria da empresa não se afastará do comando.
No mesmo dia, a Vale informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “não autorizou nem autoriza terceiros, inclusive advogados contratados, a falar em seu nome”.
A barragem da Mina Córrego do Feijão rompeu-se apesar de ter sido inspecionada recentemente. Um laudo da empresa alemã Tüv Süd em setembro do ano passado atestava a estabilidade da barragem. As licenças ambientais estavam em dia, segundo a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade de Minas Gerais (Semad).
No dia 29, foram presos três funcionários da Vale diretamente envolvidos e responsáveis pelo licenciamento da barragem que se rompeu em Brumadinho e dois engenheiros terceirizados que atestaram a estabilidade do empreendimento.
Quatro escritórios de advocacia norte-americanos anunciaram no dia 28 que pretendem entrar com ações coletivas contra a Vale na Justiça dos Estados Unidos após as perdas causadas aos investidores pelo rompimento da barragem da mineradora. A Vale já foi alvo de dois processos semelhantes nos EUA em 2015 após o rompimento de barragem da Samarco em Mariana.
Em comunicado ao mercado, a empresa afirmou que pretende se defender “de forma vigorosa” da reclamação. “A Reclamação alega, entre outros pontos, que a Companhia teria feito declarações falsas e enganosas e se omitido em divulgar os riscos e danos potenciais no caso de um rompimento da barragem de Feijão em Brumadinho, MG, Brasil. A reclamação requer indenização por danos ainda não especificados. Tendo em vista o estágio ainda inicial do processo, não é possível, neste momento, prever qualquer possível resultado para esta questão”, afirma a mineradora.
A mineradora disse, no dia 29, que vai paralisar operações equivalentes a 10% de sua produção anual de minério de ferro. São cerca de dez barragens construídas da mesma maneira que a de Brumadinho e a de Mariana, que usam uma tecnologia chamada de alteamento a montante, método no qual a barragem vai subindo na forma de degraus, conforme aumenta o volume de rejeitos. A empresa tinha 19 barragens funcionando por esse sistema, mas nove já estavam desativadas.
A redução na produção anual da Vale será de 40 milhões de toneladas de minério de ferro e deve custar R$ 5 bilhões em investimentos ao longo de 3 anos.
Funcionários da Vale e moradores da cidade de Brumadinho não foram os únicos atingidos pelo rompimento da barragem. Milhares de animais também sofreram com o desastre. No dia 31, a Vale alugou uma fazenda para receber os animais resgatados após o desastre e criou uma estrutura para acolher e tratar animais resgatados na região. O local chegou a abrigar 16 cães, quatro aves, um bovino e um gato.
No entanto, nem todos os animais atingidos chegaram ao centro. Médicos-veterinários da Comissão de Bem-Estar Animal, do Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV-MG), acompanharam o resgate de animais, que em alguns casos, por estarem atolados em estado de sofrimento e debilidade tiveram de ser abatidos por meio de tiros com o apoio da Defesa Civil de Minas.
O consultor geral e diretor jurídico da empresa, Alexandre D’Ambrosio, divulgou um vídeo no dia 29 em que afirma que pediu para os funcionários da mineradora guardarem qualquer documento que possa ser usado nas investigações. “Uma das primeiras providências que tomei após o rompimento foi o envio de comunicação a todos os empregados no Brasil determinando que sejam preservados todo os e-mails, documentos e arquivos de qualquer espécie”, afirmou o diretor.
A Vale está disponibilizando assistência e auxílio funeral para as famílias das pessoas que morreram atingidas pelo rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão. A assistência, que inclui despesas com cartório, sepultamento e auxílio em dinheiro, beneficia além dos empregados próprios da Vale, prestadores de serviço e também a comunidade.
Em reunião com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e autoridades do Ministério Público Federal, o presidente da Vale Fábio Schvartsman comprometeu-se a acelerar o processo de compensação aos familiares de mortos e desaparecidos. "Para tanto, estamos preparados para abdicar de ações judiciais, e estamos preparados porque queremos fazer acordos extrajudiciais”, afirmou o presidente, acrescentando que pretende iniciar os pagamentos.
A mineradora afirmou que irá doar 80 milhões de reais em dois anos para o município de Brumadinho como forma de compensar a perda de arrecadação da cidade.
A empresa também anunciou que irá doar 100 mil reais para os atingidos pela tragédia. Segundo a companhia, estão aptos a receber a quantia os representantes de empregados da Vale, de trabalhadores terceirizados e de pessoas da comunidade falecidas ou desaparecidas. O diretor-executivo de Finanças e Relações com Investidores da Vale, Luciano Siani, afirmou que a quantia não tem relações com as indenizações.
No entanto, três anos após o rompimento da barragem do Fundão, da mineradora Samarco, os moradores do povoado de Bento Rodrigues, em Mariana, ainda esperam indenização da companhia.
Com o deslizamento de 13 milhões de metros cúbicos de rejeitos pelo rio Paraopeba, que passa pela cidade de Brumadinho, comunidades inteiras estão ameaçadas, de populações que vivem da pesca a indígenas que moram às margens do rio, além dos peixes, aves e outros animais.
A Vale informou que instalou no dia 2 de fevereiro a primeira membrana no Rio Paraopeba, em local próximo à captação de água da cidade de Pará de Minas, a cerca de 40 km de Brumadinho. Esse sistema de captação de água será protegido, no total, por três barreiras de retenção, que funcionam como tecidos filtrantes, evitando a dispersão das partículas sólidas (argila, silte, matéria orgânica etc), que provocam a turbidez da água e alteram sua transparência.
A Vale tinha um sistema para alertar os moradores da cidade de Brumadinho de qualquer problema na barragem, mas no dia 25 ele não funcionou. A empresa divulgou uma nota no sábado, 2, esclarecendo que o sistema é acionado manualmente, a partir de um Centro de Controle de Emergências e Comunicação, que fica localizado fora da área da mina com funcionamento 24 horas por dia, . “Pelas informações iniciais, que estão sendo apuradas pelas autoridades, devido à velocidade com que ocorreu o evento, não foi possível acionar as sirenes relativas à Barragem I. As causas continuam sendo apuradas”, afirma a empresa.
As ações da Vale tiveram queda nesta segunda-feira, 4, após a Justiça determinar que a mina de Brucutu parasse de operar. A notícia foi publicada pelo colunista Lauro Jardim, do jornal O Globo.
Localizada em São Gonçalo do Rio Baixo, em Minas Gerais, Brucutu é a maior mina de ferro em operação no estado mineiro. A Vale disse que irá recorrer da decisão.
A empresa também será investigada por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) aberta na Assembléia Legislativa de Minas Gerais para apurar as causas do rompimento da barragem em Brumadinho. As investigações vão envolver empresas e órgãos de fiscalização ambiental.