Leandro Melnick, da construtora Melnick: “Temos caixa robusto e baixa alavancagem. Isso nos permite distribuir dividendos sem comprometer investimentos” (Jonas Adriano / Melnick/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 29 de janeiro de 2025 às 19h51.
Última atualização em 29 de janeiro de 2025 às 19h56.
O empresário Leandro Melnick se considera um investidor conservador. Cada nova tese de investimento ou aporte de capital em sua empresa, a Melnick, maior construtora do Rio Grande do Sul, passa por estudos detalhados e um olhar atento para o cenário macroeconômico.
“Alocação de capital exige cautela. Sempre preferimos crescer onde temos conhecimento e controle. Foi assim no Rio Grande do Sul, depois em Santa Catarina", diz ele. "Agora, seguiremos essa mesma lógica em São Paulo”.
A empresa acaba de anunciar, em fato relevante, sua entrada no mercado imobiliário paulistano. Não é qualquer mercado. Trata-se do mais competitivo do país, com grandes players locais, alta liquidez e dinâmica própria de preços e consumo.
Em um bom português: é difícil e tanto construir e vender imóvel na maior cidade do Brasil.
A Melnick está confiante nesse projeto agora porque vem de uma experiência de pelo menos sete anos por aqui, numa movimentação que envolve outra grande construtora brasileira: a Even. Leandro foi CEO da construtora paulista e seu grupo de investimentos familiar é acionista controlador do negócio.
A estreia será com um projeto de alto padrão na Vila Madalena, na zona oeste da cidade, com um valor geral de vendas de 700 milhões de reais, em parceria com a Even. O empreendimento terá 80 unidades de 355 metros quadrados, além de uma área de lazer completa.
O histórico entre a Melnick e a Even começou em 2008, quando a paulista buscava parceiros regionais para expandir nacionalmente. No Rio Grande do Sul, encontrou a Melnick, então uma construtora pequena, mas com governança sólida e estrutura bem organizada.
Em vez de uma simples parceria comercial, as empresas criaram uma joint venture, a Melnick Even, unindo a força da Even no mercado de capitais com a experiência local da Melnick.
O modelo permitiu que a empresa gaúcha crescesse sem perder o foco na rentabilidade.
Enquanto outras incorporadoras apostavam em expansão acelerada e crescimento geográfico, a Melnick seguiu uma estratégia mais cautelosa, sempre priorizando baixo risco e alta rentabilidade. Isso fez com que a Melnick Even se destacasse entre as incorporadoras mais lucrativas do setor.
A relação acionária se aprofundou em 2010, quando um fundo liderado por Leandro Melnick, a Melpar, adquiriu 48% da Even, uma movimentação pouco comum no mercado: em vez de uma gigante paulista comprar uma regional, foi a empresa gaúcha que passou a ter participação relevante na incorporadora de São Paulo.
Entre 2016 e 2022, Leandro Melnick assumiu como CEO da Even. A parceria acionária entre as empresas seguiu até o fim de 2024. No ano passado, o grupo Melpar Invest, gestora de investimentos da família Melnick, recomprou as ações da Even e encerrou oficialmente a ligação societária entre as duas.
O movimento abriu uma nova possibilidade: pela primeira vez em 15 anos, a Melnick estava livre para atuar no mercado paulista sem restrições contratuais. Durante a sociedade, havia um acordo de non-compete, que delimitava territórios de atuação. A Melnick operava do Paraná para baixo, enquanto a Even ficava com São Paulo.
Agora, sem essa limitação, a Melnick entra em São Paulo como investidora em projetos da Even. O primeiro passo é o empreendimento na Vila Madalena, que servirá como teste para futuras parcerias no estado.
“O fim da relação acionária abriu um novo caminho. Agora podemos atuar juntos de outra forma, como parceiros estratégicos em projetos pontuais”, diz Melnick.
A Melnick entra com capital e expertise de gestão, enquanto a Even cuida da execução e comercialização, aproveitando sua estrutura consolidada na cidade.
A Melnick cresceu no Rio Grande do Sul sem pressa. Focada em projetos de alto padrão, evitou a expansão agressiva que marcou o setor imobiliário nos anos 2000.
Enquanto incorporadoras abriram capital e cresceram via alavancagem, a empresa manteve uma estrutura financeira enxuta. “Sempre privilegiamos rentabilidade sobre crescimento. Crescer sem rentabilidade destrói valor”, diz Melnick.
Essa lógica se manteve mesmo após o IPO em 2020. Naquele momento, a empresa captou recursos para expandir, mas segurou os planos quando a economia brasileira mudou. Em menos de um ano, os juros saltaram de 3,5% para 12%, inviabilizando a estratégia original.
“O cenário mudou e decidimos preservar caixa. Preferimos oportunidades com menor risco e maior previsibilidade”, afirma o CEO.
Com esse modelo, a Melnick acumulou um landbank relevante, com 28 terrenos em Porto Alegre, avaliados em R$ 2,7 bilhões. Além disso, entrou no segmento de urbanização e loteamentos, ampliando suas fontes de receita sem comprometer a rentabilidade.
Agora, a empresa usa essa mesma estratégia para crescer fora do Rio Grande do Sul. Em Santa Catarina, entrou via parcerias com incorporadoras locais, aportando conhecimento e gestão em troca de participação nos projetos. Por ali, serão 17 bilhões de reais em projetos em cidades como Balneário Camboriú, Itajaí e Florianópolis.
A estratégia funcionou e abriu caminho para a entrada em São Paulo.
Apesar da expansão, a Melnick mantém uma característica que a diferencia da maioria das incorporadoras listadas: a distribuição consistente de dividendos. Desde 2008, antes mesmo do IPO, a empresa pagou cerca de 90% do lucro líquido aos investidores. Após a abertura de capital, o payout segue próximo de 100%.
“Temos caixa robusto e baixa alavancagem. Isso nos permite distribuir dividendos sem comprometer investimentos”, afirma Melnick.
Desde 2020, a empresa já distribuiu R$ 334,8 milhões em dividendos. O mercado vê essa estratégia como um diferencial, especialmente em tempos de incerteza econômica.
Com os juros ainda elevados e o setor imobiliário enfrentando desafios, empresas com forte geração de caixa ganham vantagem.
A história da Melnick começou em 1970, quando Milton Melnick fundou a Melco, uma pequena construtora familiar. Nos anos 90, Leandro Melnick assumiu o comando e iniciou a transição para uma empresa profissionalizada.
O grande salto veio em 2008, quando a Melnick firmou parceria com a Even. A joint venture deu fôlego para a empresa crescer no segmento de alto padrão sem perder rentabilidade. Em 2020, a Melnick abriu capital na B3, tornando-se a primeira incorporadora do Sul do Brasil a negociar ações em bolsa.
Desde então, manteve um ritmo controlado de expansão, focando em mercados onde já tinha expertise. Porto Alegre continua sendo seu principal foco, mas a empresa já fincou bandeira em Santa Catarina, Paraná e agora São Paulo.
“Olhamos crescimento com responsabilidade. Não queremos ser a maior incorporadora do Brasil. Queremos ser a mais rentável”, afirma o CEO.