Malu Lira, à frente do Grupo Malu Finanças: “Mas tudo começa com a coragem de dar o primeiro passo – o mais difícil, mas o que põe a caminhada em movimento”
Jornalista especializada em carreira, RH e negócios
Publicado em 18 de setembro de 2025 às 11h20.
Última atualização em 18 de setembro de 2025 às 12h51.
A amazonense Malu Lira sempre foi sonhadora e inquieta. Na infância, gostava de observar, questionar e entender como o mundo funcionava. Dizia que gostaria de viajar e estudar fora, mas aprendeu com os pais que nada vem de graça. É preciso estudo, dedicação e disciplina. “Entendi que o dinheiro não é um vilão, mas um aliado para abrir portas e realizar sonhos. E como em casa, a regra era de presentes só em datas especiais, se eu quisesse outra coisa tinha que poupar”, conta. A partir daí, passou a vender pulseiras, colares de miçanga e até os desenhos que produzia, além dos bolos feitos pela mãe. Não se tratava apenas de obter retorno financeiro, mas de conhecer mais sobre esse universo e descobrir que podia construir o próprio caminho.
O que ela não imaginava era que esse caminho seria trilhado tão rápido. Hoje, aos 15 anos, é autora de 20 livros e está à frente do Grupo Malu Finanças, composto por três empresas e administrado com o apoio direto dos pais. Em 2024, o negócio faturou R$ 2,6 milhões e projeta superar R$ 11 milhões em 2025. Com a proposta de ressignificar a relação de crianças e jovens com o dinheiro, a metodologia já chegou a mais de 200 escolas, impactando em torno de 50 mil estudantes.
Como reflexo do trabalho, realiza palestras pelo Brasil e, desde 2022, é embaixadora do programa internacional Eu Lidero, da Maxwell Leadership Foundation. Em outubro deste ano, representará a iniciativa em uma palestra na embaixada da França.
Em 2018, quando Malu tinha nove anos, a família deixou Apuí, município com pouco mais de 21 mil habitantes no Amazonas, e se mudou para Manaus. Na capital, com mais acesso à internet, complementou as leituras com vídeos sobre finanças e logo notou que não havia nada voltado ao público infantil. “Decidi compartilhar o que aprendia com os colegas da escola, mas a maioria achava ‘chato', e os professores diziam que dinheiro não era assunto para nós”, lembra.
Incomodada, pesquisou estatísticas sobre pobreza e endividamento e concluiu que, se o tema fosse ensinado cedo, poderia mudar realidades. “Tive a ideia de gravar vídeos curtos explicando conceitos básicos – de criança para criança, mas no início meus pais tinham receio de eu estar na internet”. O que mudou essa visão foi a consulta com uma neuropsicóloga, recomendada pela escola. “Eu era muito ansiosa. Terminava as tarefas e ficava andando pela sala de aula para ajudar os outros estudantes ou puxar conversa.”
O diagnóstico foi de Altas Habilidades, condição em que indivíduos apresentam desempenho acima da média em áreas como a intelectual e a acadêmica. A médica explicou que as gravações poderiam ser uma forma de canalizar a ansiedade e estimular a criatividade. “Entendi por que não me identificava com meus colegas e que, às vezes, você vai ser diferente – e está tudo bem.” A partir daí, os pais abraçaram o sonho da filha.
Os vídeos chamaram a atenção rapidamente, e ela percebeu que os conteúdos digitais não chegariam às comunidades mais remotas do Amazonas. Um livro poderia romper essa barreira. Assim, aos 11 anos, escreveu Finanças para Crianças: além da mesada, e apresentou um plano detalhado de custos e prazos aos pais. O lançamento, organizado pela família com secretários de educação e gestores escolares, foi um sucesso. A venda chegou a 50 mil exemplares, dando início a uma turnê pela região.
A obra abriu portas em escolas e bibliotecas, trouxe convites para palestras e levou à criação da Malu Finanças, administrada com o suporte do pai, professor; e da mãe, agente pública. Eles haviam se mudado para abrir uma consultoria educacional e decidiram investir também no projeto da filha. Atualmente, o grupo engloba três empresas – Malu Finanças Educação Financeira, responsável por palestras, parcerias e projetos sociais; Editora Fada Madrinha, para publicação de obras e aplicação da metodologia educacional nas escolas; e Editora Pena, dedicada à publicação de livros para concorrer a editais públicos, inclusive ao PNLD.
São 15 funcionários fixos, além de parceiros jurídicos, contábeis e editoriais, e um escritório em São Paulo para acelerar a expansão. Há também uma equipe pedagógica que garante a adequação dos materiais à BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Apenas no primeiro semestre de 2025, mais de 900 professores da rede pública receberam formação para aplicar a metodologia, que vai do Infantil ao Ensino Fundamental II.
O crescimento não deixou de lado o impacto social. Em 2024, dois projetos foram criados no Amazonas para públicos em situação de vulnerabilidade. O Me Conta uma História, realizado em ONGs e instituições sem fins lucrativos, une o lúdico ao pedagógico para aproximar o público infantil da educação financeira e, em 2024, impactou mais de 450 crianças. Já o Cinderela Empreendedora, em parceria com o Sebrae, capacita mulheres em situação de vulnerabilidade. A primeira edição, em julho de 2025, formou 22 participantes; a segunda, prevista para novembro, deve atender mais 25. A meta é alcançar 15 mil pessoas até abril de 2026.
Para Malu, o sucesso da companhia está ancorado em pilares claros: os ensinamentos e apoio dos pais, propósito genuíno de transformar a relação das crianças com o dinheiro e escuta ativa. Foi em uma palestra para professores, em 2022, por exemplo, que ouviu de um deles: “Como vou ensinar finanças se o meu dinheiro não dura até o fim do mês?” A fala acendeu um alerta: era preciso preparar também os educadores e oferecer materiais de suporte.
Ela também compartilha características que considera essenciais para empreender, como disciplina, para conciliar escola e trabalho; humildade, disposição de aprender com todos; e paciência, pois os resultados podem demorar. “Mas tudo começa com a coragem de dar o primeiro passo – o mais difícil, mas o que põe a caminhada em movimento”, finaliza