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Com Anitta no Nubank, favela ganha espaço no debate econômico global

Mais do que a fama, a cantora traz para o banco a capacidade de construir uma ponte entre a favela e o pop, diz pesquisador

Anitta em foto promocional de seu novo clipe, "Girl From Rio": primeira artista brasileira a figurar no top 100 da lista da platafor Shazam nos EUA (Mar+Vin/Divulgação)

Anitta em foto promocional de seu novo clipe, "Girl From Rio": primeira artista brasileira a figurar no top 100 da lista da platafor Shazam nos EUA (Mar+Vin/Divulgação)

RC

Rodrigo Caetano

Publicado em 21 de junho de 2021 às 18h15.

Última atualização em 2 de julho de 2021 às 18h27.

A nomeação de Anitta para o conselho do Nubank, maior banco digital independente do mundo, consolida a ascensão das favelas no debate econômico. Nos últimos anos, empreendedores como Celso Athayde, da Favela Holding, e influencers como a youtuber Nath Finanças inverteram a ordem do fluxo de informações entre favela e asfalto. Com Anitta, que já é a artista de maior projeção internacional do país, esse movimento ganha contornos globais.

"É muito chato e constrangedor não conseguir ter acesso a produtos financeiros. Muita gente na América Latina sempre viveu de emprego informal. Como essas pessoas vão ter histórico de crédito?”, afirmou Anitta, que vai participar de reuniões trimestrais com os outros seis conselheiros e a diretoria do Nubank para discutir decisões estratégicas do futuro do banco digital. “Fiquei impressionada ao ver o trabalho do Nubank em fazer com que milhões de pessoas se sintam incluídas, podendo ter uma vida financeira melhor."

Mais do que a fama, Anitta agrega ao banco seu conhecimento sobre o estilo de vida das periferias. Internacionalmente, Anitta fará a ponte entre o banco que começou com um posicionamento “antissistema” e, agora, se vê diante do desafio de manter a imagem, ao mesmo tempo em que atinge mais de 40 milhões de clientes. "É uma empresária de sucesso que vai nos ajudar a aprimorar ainda mais os produtos para nossos clientes", afirmou Cristina Junqueira, cofundadora do Nubank.

“Anitta é o ponto de encontro entre a favela e o pop”, afirma Renato Meirelles, fundador da Locomotiva, empresa de pesquisas especializada no público de baixa renda. “Ela consegue ser diversa como o século 21 exige. Foi um golaço do Nubank.”

Meirelles enxerga um movimento da periferia que ele chama de apoderamento. “Empoderamento, é quando o outro permite que você ocupe um lugar. Apoderamento é ocupar um lugar que é seu”, explica. Essa tendência ocorre da periferia para o centro, não ao contrário, como costumava ser.

A cantora e empresária irá fazer parte de um grupo formado por nomes como Daniel Goldberg, ex-presidente do Morgan Stanley no Brasil; Luis Alberto Moreno, ex-presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento); e Doug Leone, global managing partner e investidor da Sequoia Capital.

Apesar de não ostentar a mesma “grife” financeira, suas credenciais vão muito além do seu talento musical. Ela já acumula uma fortuna de 100 milhões de reais e é a primeira artista brasileira a figurar no top 100 das paradas americanas na plataforma Shazam, um agregador de streaming.

Pandemia e aplicativos de pagamentos

Em parte, o movimento do Nubank também busca atacar ameaças ao seu negócio que surgiram com a pandemia, em especial os aplicativos de pagamento, como PicPay e Mercado Pago. “O Nubank ocupou um primeiro espaço como segundo banco do rico e conta universitária. Mas, quando vê o crescimento desses concorrentes, entende que precisa entrar no segmento. A Anitta é a pessoa certa para isso, pois é transversal. Ela é antissistema, mas quando precisa conversa com o establishment, canta Bossa Nova com o Caetano na abertura da Olimpíada”, diz Meirelles.

Internacionalmente, Anitta está levanto para mercados externos, como o americano, a estética da favela, que é universal. Hoje, ela é a artista de maior sucesso internacional do Brasil. Os resultados são fruto de um trabalho planejado, iniciado há quase cinco anos, que contou com muito improviso, aos moldes de uma startup.

"Eu acabei não seguindo nenhum dos planos que eu tinha porque tudo aconteceu de um jeito bem diferente do que eu planejei. Eu tive que improvisar, mas acabou dando mais certo do que eu imaginava", afirmou a CEO da startup Anitta, em abril, quando lanço seu mais recente clipe, “Girl From Rio. Segundo a cantora, 30% dos seus seguidores, atualmente, são de fora do país.

“As empresas precisam entender que querer ser rico é diferente de querer ser como os ricos”, diz Meirelles. “A Anitta leva para o exterior o melhor do Brasil e não precisa do aval da elite para nada. Ela é a expressão artística atualizada do brasileiro, que se conecta com a realidade de muita gente.”

A favela vai à África

No dia em que Anitta foi anunciada como conselheira do Nubank, o empresário Celso Athayde, fundador da Central Única de Favelas (Cufa) e da Favela Holding, pegava o voo de volta de uma viagem à África, onde visitou Camarões e Etiópia. O objetivo: se conectar às suas raízes e fazer negócios.

Athayde inaugurou três escritórios da Cufa no continente. Ele também se reuniu com potenciais parceiros para levar a Camarões dois negócios da sua holding: a operadora de telefonia Alo Social e o jipe brasileiro Tak Stark, projeto desenvolvido em parceria entre a Favela Holding e a cearense CAB Motors.

“A favela, onde mora a maioria negra, produz riquezas que fazem o país avançar”, afirma Athayde. “Eu sempre digo que a favela não estava perdendo o jogo, ela nem estava jogando. O que estamos fazendo é assumir nosso protagonismo e sentar na mesa de negociações”.

Pelos cálculos da Data Favela, outro empreendimento de Athayde, em parceria com Renato Meirelles, da empresa de pesquisas Locomotiva, aponta que o PIB das favelas brasileiras supera os 200 bilhões de reais. Segundo Celso, o problema é que essa produção não fica nas favelas, ela volta para o asfalto. É preciso inverter essa ordem.

Empoderamento financeiro

Outro sinal do protagonismo das favelas no debate financeiro vem das redes sociais. Em meio aos gurus de day trade e especialistas que ensinam como investir centenas de milhares de reais, a estudante de administração Nathalia Rodrigues, de 21 anos, se consolidou como uma das principais youtubers financeiras do país apostando em uma linguagem acessível à população de baixa renda.

Nos vídeos, Rodrigues explica desde como limpar o nome no Serasa até como aderir ao saque-aniversário do FGTS. A ideia de criar o canal surgiu após as aulas de matemática financeira na faculdade. “Eu me apaixonei por finanças e criei o canal para ajudar gente como eu”, disse a youtuber à EXAME, em janeiro.

Em dois anos de canal, Rodrigues atingiu um patrimônio de 1 milhão de reais. A favela está vencendo.

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