Avião da Flybondi na Argentina: empresa de baixo custo estreia no Brasil após mudanças regulatórias (Flybondi/Instagram/Reprodução)
Carolina Riveira
Publicado em 2 de outubro de 2019 às 11h39.
Última atualização em 14 de junho de 2021 às 13h16.
A argentina Flybondi chega ao Brasil neste mês fazendo barulho. A companhia aérea começou a partir desta quarta-feira, 2 de outubro, a vender um lote de passagens aéreas a 1 real + taxas e impostos em sua rota Rio de Janeiro-Buenos Aires. Em poucas horas, as passagens com desconto se esgotaram e a promoção não está mais válida.
A empresa, que segue o modelo de baixo custo (low cost), tem duas rotas já anunciadas no Brasil. A Flybondi ligará as cidades de Florianópolis (Aeroporto Internacional Hercílio Luz) e Rio de Janeiro (Galeão) a Buenos Aires. Na capital argentina, a empresa opera no aeroporto de El Palomar, que é de pequeno porte e fica a cerca de 20 quilômetros do centro de Buenos Aires, acessível por uma linha de trem localizada a 300 metros do aeroporto.
Com a promoção de estreia, que ofereceu cerca de 20 passagens promocionais por voo nos meses de outubro e novembro, o bilhete da Flybondi custará, entre o Galeão e a capital argentina, além do 1 real promocional, outros 122 reais em taxas obrigatórias dos respectivos governos e aeroportos, totalizando 123 reais. Sem a promoção, os preços no Rio ficam a partir de 410 reais.
O primeiro voo decola do Rio no próximo dia 10 de outubro e de Florianópolis em 20 de dezembro. Os bilhetes com partida das duas cidades estão à venda no site da Flybondi.
“Estamos muito felizes em chegar ao Brasil. É um mercado muito importante. Estamos entrando aos poucos e vamos fazer testes para entender o que funciona melhor”, diz o colombiano Mauricio Sana, diretor comercial da Flybondi, em entrevista a EXAME durante sua passagem por São Paulo nesta semana.
Promoções à parte, o foco da Flybondi será atrair os brasileiros — e os argentinos que queiram vir ao Brasil — com preços mais baixos mesmo em dias não-promocionais.
Em média, segundo a empresa, o preço da passagem no trecho Florianópolis-Buenos Aires está em 342 reais a ida e 399 reais a volta, enquanto o trecho Galeão-Buenos Aires está em 410 reais a ida e 475 reais a volta, incluindo taxas. Sem taxas, todas as passagens ficam em menos de 300 reais na média.
Tendo feito o primeiro voo no mercado doméstico da Argentina em janeiro de 2018, a Flybondi inaugurou a categoria low-cost naquele país. Desde então, já transportou mais de 1,6 milhão de passageiros. Em dezembro passado, começou a oferecer rotas partindo da Argentina para o Paraguai. A Flybondi opera atualmente com cinco aviões Boeing 737-800 e 17 destinos, com maior foco nos voos dentro da Argentina.
Entre janeiro e junho deste ano, a companhia atingiu participação de 9% do mercado doméstico argentino (com 4.772 voos e mais de 160.000 passageiros transportados no período), ante 15% da Latam e 68% da Aerolineas Argentinas, segundo dados da agência de aviação nacional argentina. (A quarta posição no mercado local é de outra low-cost, a norueguesa Norwegian Air, que ficou com 7% do mercado no período). Nos últimos doze meses, a empresa mais que dobrou seu número de passageiros e de voos.
Dados do buscador de passagens Kayak mostraram que, com a chegada da Flybondi, aumentou a busca por passagens entre os trechos operados em mais de 60% em Florianópolis e mais de 30% no Rio de Janeiro.
“A chegada desse modelo ao Brasil é importante para aumentar a oferta de voos na região, dando mais opções e alternativas mais acessíveis para os viajantes se planejarem, especialmente em um cenário econômico difícil”, diz Eduardo Fleury, diretor de operações do Kayak no Brasil.
A Flybondi e outras empresas do modelo low-cost conseguem oferecer passagens mais baratas do que as companhias aéreas tradicionais por terem poucos aviões que voam mais horas por dia, aumentando a eficiência e a produtividade, e cobrando por serviços como a bagagem e a alimentação a bordo. Os clientes que desejarem esses serviços podem escolher pagar por eles no momento da compra ou durante o voo.
Além da Flybondi, o Brasil já viu nos últimos meses a chegada de outras três companhias aéreas de baixo custo: as chilenas Sky Airlines e JetSmart e a norueguesa Norwegian. Todas vão operar apenas rotas internacionais por ora.
As low-cost vieram para ficar. O Congresso Nacional brasileiro manteve, na semana passada, a autorização às empresas aéreas para cobrar pelo despacho de bagagens. A permissão para a cobrança foi estabelecida com uma Medida Provisória aprovada pelos legisladores em maio e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em junho.
“Quando uma companhia aérea oferece despacho de bagagem gratuito, não é exatamente gratuito. Hoje quase nenhuma empresa oferece serviços de alto padrão em todas as classes do avião, mas as companhias cobram o consumidor por coisas que ele pode nem precisar”, diz Lucía Ginzo, diretora de comunicações da Flybondi.
Na mesma Medida Provisória que flexibilizou as regras para bagagem, o Congresso autorizou também que empresas de capital 100% estrangeiro operem no mercado doméstico brasileiro. Até então, o limite era de 20%. A chegada de companhias aéreas de baixo custo estrangeiras no mercado doméstico deve movimentar bastante um setor que sempre foi dominado por poucos concorrentes.
A espanhola Air Europa, que já tem autorização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar no Brasil, deve ser a primeira a ingressar neste mercado, mas ainda sem data definida. A Flybondi, por sua vez, diz que ainda é muito cedo para pensar no mercado doméstico, embora, assim como outras companhias de baixo custo que chegaram ao Brasil recentemente, não descarte, no futuro, uma operação interna como faz na Argentina.
Além de Florianópolis e Rio, a Flybondi ainda estuda outros destinos possíveis de operar no Brasil. Sobre a chegada a São Paulo, a empresa diz que é um mercado importante, mas que vai exigir mais estudos prévios.
O maior desafio é que a capital paulista não é um centro turístico, de modo que os viajantes usam mais a cidade para fazer conexões para outros destinos. Para os que vêm a São Paulo a negócios, uma low-cost pode não ser o modelo ideal, já que não inclui os confortos que os executivos de alto escalão demandam (o avião não tem classes separadas, por exemplo) e não tem muitas opções de horários. A Flybondi oferecerá três voos semanais por enquanto nos destinos em que opera no Brasil, o que pode não ser a frequência ideal para executivos, diz Sana.
A Flybondi vai replicar no Brasil todas as estratégias de sua operação de baixo custo na Argentina. A empresa vende a maioria de seus voos por canal direto, isto é, apenas em seu próprio site, sem convênios com agências de viagem. Por isso, precisa investir fortemente na comunicação com os usuários, que já está bem estabelecida na Argentina mas deve ser desenvolvida no Brasil. A companhia também optou por não ter escritórios nos locais onde atua ou guichês nos aeroportos.
“A própria cultura do passageiro em voar low-cost ou em comprar somente pela internet é algo a se desenvolver”, diz Sana.
Os executivos contaram a EXAME a história de um casal de idosos que foi até a sede da Flybondi em Buenos Aires dizendo que queria comprar uma passagem. Como não são feitas vendas físicas, um funcionário precisou descer com um computador para ajudá-los. “Foi um caso atípico, mas mostra um pouco do nosso modelo de operação”, diz Sana. “Não temos custos desnecessários para não termos de cobrar do passageiro.”
A empresa ainda não sabe ao certo qual será o seu grande público no Brasil, mas espera atrair, como na Argentina, executivos de empresas menores, que não dispõem de altos orçamentos para viagens, e passageiros que nunca voaram de avião. A Flybondi, que tem como slogan “liberdade de voar”, orgulha-se de dizer que mais de 200.000 passageiros voaram de avião pela primeira vez na vida usando o serviço da empresa. “Como na Argentina, viemos muito menos para pegar mercado das grandes companhias e mais para chegar a novas pessoas”, diz Sana.
Mas os especialistas do setor esperam que a Flybondi e outras empresas de baixo custo que estão chegando ao Brasil roubem, sim, mercado das grandes companhias e atraiam também os clientes que, em meio à crise econômica brasileira, não têm mais considerado a opção de viajar de avião.
* Matéria atualizada às 13h45 após o esgotamento das passagens promocionais.