Petrobras: o negócio garante uma entrada no caixa da Petrobras de 1,6 bilhão de dólares na conclusão da operação, prevista para ocorrer em cerca de 60 dias (.)
Reuters
Publicado em 22 de dezembro de 2016 às 16h43.
Rio de Janeiro - Ao anunciar uma aliança estratégica com a francesa Total de natureza e porte inéditos em sua história, a Petrobras mostrou que está disposta a compartilhar bons ativos brasileiros em troca de conhecimento e fôlego financeiro, tornando o país mais atrativo para estrangeiros.
O acordo, de 2,2 bilhões de dólares, anunciado na noite de quarta-feira, envolve a venda de direitos em áreas no pré-sal, compartilhamento de terminal de regaseificação, transferência de fatias em térmicas, entre outros negócios, incluindo a troca de informações estratégicas sobre ativos.
O professor e membro do Grupo de Economia da Energia da UFRJ Helder Queiroz destacou que além de oferecer acesso a tecnologia em áreas como a exploração de petróleo em mar, o acordo traz à Petrobras recursos importantes em um momento em que a petroleira precisa equilibrar seu balanço financeiro.
"É um marco importante, uma operação que eu chamaria de a aliança estratégica mais bem estruturada dos últimos tempos e acho que promissora para as duas empresas; elas têm ativos e competências complementares e acho que isso pode ser útil, especialmente neste momento", afirmou Queiroz, ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
O negócio garante uma entrada no caixa da Petrobras de 1,6 bilhão de dólares na conclusão da operação, prevista para ocorrer em cerca de 60 dias, além de pagamentos contingentes e o carrego de investimentos no desenvolvimento de ativos.
Dentre os acordos, a Petrobras se comprometeu em transferir a operação e 35 por cento do campo de Lapa, já produzindo no pré-sal da Bacia de Santos, ficando com apenas 10 por cento da concessão, e marcando a segunda vez que a companhia abre mão de recursos das promissoras áreas do pré-sal.
Além disso, a Petrobras concordou em ceder direitos de 22,5 por cento para a Total na área da concessão de Iara, no bloco BM-S-11, também no pré-sal. Pelo acordo, a Petrobras continuará como operadora, detendo a maior participação, de 42,5 por cento.
Queiroz destacou, no entanto, que a venda no pré-sal neste caso é diferente do negócio da Petrobras com a norueguesa Statoil, já que no acordo anterior a empresa se desfez inteiramente da descoberta de Carcará, também em Santos.
"Carcará você sai do negócio. Com a Total, a Petrobras está casando... e pretende ficar por um bom tempo... é um compromisso mais firme do que outros", destacou.
A quebra de paradigmas nas vendas do pré-sal, algo difícil de ser imaginado durante o governo do Partido dos Trabalhadores (PT), que desejava concentrar essas áreas nas mãos da Petrobras, apresenta uma oportunidade para petroleiras estrangeiras terem acesso a ativos importantes do Brasil.
"Esse tipo de acordo traz de volta o conceito de parceria que vigorou no (governo do presidente Fernando Henrique Cardoso) FHC (PSDB) e que foi abandonado nos governos do PT. Além da troca de conhecimento, da entrada de dinheiro no caixa da Petrobras, traz também uma maior blindagem da empresa na medida em que ela passa a ter sócios", afirmou o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires.
Anteriormente, o acesso às petroleiras estrangeiras estava bastante limitado a participações em leilões de áreas exploratórias e algumas oportunidades para se tornarem sócias minoritárias da Petrobras em ativos mais importantes, segundo destacaram analistas ouvidos pela Reuters.
"Isso é bom para a Petrobras e para o Brasil. Mostra que há uma mudança estrutural que torna mais atrativo o investimento no país. Na filosofia antiga a Petrobras tinha que fazer tudo, quem é obrigado a fazer tudo acaba não fazendo nada", disse o diretor institucional da Fundação Getulio Vargas (FGV), Roberto Castello Branco, que foi membro do Conselho de Administração da Petrobras em 2015.
A nova abertura da Petrobras para compartilhar informações com outras empresas também foi bem vista por analistas.
"Como os investimentos da indústria de petróleo são muito elevados, é sempre bom fazer parcerias para partilhar riscos e trocar tecnologia", disse Castello Branco.
"É uma inovação..., algo positivo, para a Petrobras olhar para todo o mundo e não para o seu próprio umbigo como sempre foi."
Sindicatos de petroleiros, no entanto, são totalmente contra as vendas de ativos da empresa e têm impetrado uma série de ações judiciais, muitas bem sucedidas, para impedir os negócios.
Como resposta ao acordo anunciado com a Total, a Federação Nacional dos Petroleiros (FNP), que reúne cinco sindicatos, afirmou em uma nota que o governo está desmontando a maior empresa de energia do Brasil, "seguindo o receituário neoliberal da chamada 'ponte para o futuro' de Michel Temer, que joga o Brasil no abismo e o faz reviver tempos de semicolônia".
A assinatura final do acordo ainda precisa passar pelo crivo de órgãos reguladores, como o Tribunal de Contas da União (TCU), que suspendeu recentemente a possibilidade da Petrobras concluir a venda de ativos, até que ambas cheguem a um acordo sobre a metodologia para a alienação de bens.
Em coletiva de imprensa para anunciar o negócio na quarta-feira, o presidente da Petrobras, Pedro Parente, se mostrou confiante em relação aos órgãos reguladores e frisou que mantém conversas frequentes com o TCU e que está disposto a realizar mudanças nos métodos internos de venda.
Além disso, afirmou que a empresa irá lutar na Justiça até o fim contra liminares obtidas por sindicatos de trabalhadores que impediram a negociação de desinvestimentos, como a de sua subsidiária de combustíveis BR Distribuidora.
Analistas reconhecem os impedimentos para a venda de ativos como riscos, mas acreditam que a Petrobras conseguirá superá-los.
"O TCU não vai ser empecilho grande. A Petrobras tem sido bastante cuidadosa, isso antecede até a gestão do Pedro Parente. No ano passado a Petrobras sempre procurou manter um diálogo com TCU para não sofrer um revés", disse Castello Branco.
Em relatório publicado após o anúncio do acordo, o Itaú BBA destacou que apesar da recente volatilidade dos preços das ações causada pelo cenário político e pelos preços do petróleo, manteve sua visão positiva sobre os fundamentos da empresa.
Isso porque a Petrobras tem sido, na avaliação do banco, efetiva na implementação da política de preços de combustíveis, no avanço do programa de venda de ativos e tem cumprido suas promessas de redução de custos.
Com o acordo com a francesa, a Petrobras anunciou cerca de 13 bilhões de dólares do plano de desinvestimentos para o biênio 2015-16, de um total estimado de 15,1 bilhões de dólares.