Negócios

Abilio Diniz, um maratonista que não foge da briga

Prestes a entregar o poder no Pão de Açúcar, Abilio teve uma trajetória marcada por embates com a família e com os sócios

Abílio Diniz: em toda sua trajetória, empresário colecionou embates com diversos sócios (Raul Junior/EXAME.com)

Abílio Diniz: em toda sua trajetória, empresário colecionou embates com diversos sócios (Raul Junior/EXAME.com)

Tatiana Vaz

Tatiana Vaz

Publicado em 15 de junho de 2012 às 14h34.

São Paulo – Abilio Diniz sempre foi um amante do esporte – a ponto até de incentivar seus colaboradores a participarem de maratonas, sua paixão. A trajetória empresarial dele, hoje com 75 anos, também deixa claro quanto ele precisou aplicar o que aprendeu com as corridas em sua vida nos negócios. Fôlego e foco não faltaram até que ele galgasse, a cada passo, o comando do que se transformaria no maior grupo de varejo do país, o Grupo Pão de Açúcar.

De todos os percalços, o mais tortuoso e emblemático foi o travado por ele com sua família, engalfinhada por anos numa áspera disputa pelo poder. Primogênito de seis irmãos – Alcides, Arnaldo, Vera, Sônia e a caçula Lucília -, desde criança Abilio fazia as entregas dos doces vendidos pelos pais, Valentim e Floripes, na pequena confeitaria aberta por eles no centro da capital paulista. Com o progresso dos negócios, tornou-se o braço direito do pai e o ajudou a transformar a companhia, na década de 80, em um conglomerado de 22 empresas de faturamento bilionário, 55 000 funcionários e 570 supermercados. Um desempenho reconhecido pelo pai na primeira divisão de ações feita por ele, em 1987.

Na época, o patriarca distribuiu entre os filhos 38% das ações da empresa de acordo a produtividade de cada um. Abilio ficou com 16% e os outros dois irmãos com 8% cada. As três filhas, que não atuavam na empresa, ficaram com 2% cada uma. Descontentes, os irmãos se uniram para tirar do comando o primogênito, que logo renunciou ao cargo de superintendente para ser apenas assessor de seu pai na tentativa de apaziguar os ânimos. Pouco tempo depois, Alcides vendeu sua parte para o pai por 120 milhões de dólares – valor quatro vezes maior ao da empresa na época.

De volta ao comando a mando do pai no final dos anos 80, num estágio em que a companhia se atolava em dívidas, agravadas pelo Plano Collor, Abilio adotou um severo regime de cortes de custos para estancar os prejuízos crescentes. O primeiro passo foi vender todos os tipos de negócios que não fossem ligados a supermercado, seguido da demissão de 22.000 funcionários. Onze membros da diretoria foram substituídos, inclusive amigos da família. Das 549 lojas, apenas as 216 mais lucrativas ficaram abertas.

O empresário também criou a Consistência Participações, uma holding que aglutinaria todos os negócios da família e controlaria o grupo. Pelos estatutos dela, Abilio passaria a deter 51% das ações após a morte do pai. Até lá, os dois dividiriam o comando. Aborrecido com a iniciativa, Alcides abriu um processo contra o irmão por ele não ter sido consultado sobre as vendas de imóveis da família usados para sanar dívidas. Sônia também questionou judicialmente a criação da Consistência, considerada por ela um testamento antecipado.

Depois foi a vez da mãe, Floripes, acusar o filho de coagir mentalmente o pai e revogar as procurações do marido para evitar que Valentim fizesse o acerto acionário. Um consenso chegou apenas no fim de 1993, quando o empresário comprou as ações dos irmãos– apenas a irmã Lucília manteve os papéis que detinha.


Depois da família, os sócios

Na liderança do grupo, Abilio passou a colecionar conflitos de outro gênero, movido pela vontade de progredir com os negócios. O primeiro embate com sócios se deu com Arthur Sendas, em dezembro de 2003, depois da fusão das empresas deles. Diniz ficou com a maior parte das ações e o direito de compra da companhia. Sendas ficou com o direto de venda, caso houvesse mudança de controle acionário.

O mesmo método firme de conter as dívidas foi adotado na rede carioca, cujo prejuízo chegava a 163 milhões no ano da compra. A depreciação pesava no grupo de varejo, que sofria uma nova crise financeira na época. A decisão de Abílio foi a de buscar um segundo aporte de capital do francês Casino (o primeiro havia ocorrido em 1999).

A entrada do sócio francês e a criação de uma nova holding de controle foi entendida por Arthur como uma mudança de controle e ele passou a brigar pela venda de sua parte no Sendas. Abilio, com o argumento de que não havia mudança, mas sim compartilhamento, não concordava. O impasse levou os dois a travarem uma briga em uma Câmara de Arbitragem, em janeiro de 2006. O resultado favorável a Abílio só chegou em 2008 e, no ano passado, o grupo comprou as ações remanescentes da família Sendas por 377 milhões de reais.

Em 2009, depois de comprar a rede Ponto Frio por 824 milhões de reais, em junho, Diniz investiu na fusão com a Casas Bahia, em dezembro. O contrato foi renegociado e, em julho do ano seguinte, o grupo do empresário concordou em fazer uma capitalização adicional de 700 milhões de reais na nova empresa.

Último embate

Com o Casino, o impasse terá, pela primeira vez, um desfecho desfavorável ao empresário. A condição imposta pelo sócio francês para a injeção de capital na rede, em 2005, era a de ter o direito de comprar uma ação da Wilkes, holding controladora do Pão de Açúcar, pelo valor simbólico de 1 real no póximo 22 de junho. Sem querer entregar o controle da empresa para o Casino, o empresário traçou um plano para permanecer à frente do grupo.

Procurou, em maio do ano passado, convencer os franceses do Carrefour, maior concorrente do sócio na França, a fundir a operação brasileira com a do Pão de Açúcar. O presidente do Casino, Jean-Charles Naouri, só soube da manobra pela imprensa francesa e, furioso, entrou com um pedido de arbitragem na Câmara Internacional de Comércio, em Paris. O desentendimento culminou com a aprovação da saída de Abílio do conselho de administração do grupo pela assembleia de acionistas do Casino. Como todo maratonista sabe, não se pode vencer todas.

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