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A Kings Sneakers nasceu num porão com R$ 300; hoje, fatura R$ 350 milhões e encara o desafio dos EUA

A rede acaba de estrear nos Estados Unidos, mas terá que enfrentar uma tarifa de 50% anunciada por Trump

Igor Morais, fundador da Kings Sneakers:  “A concorrência tirou todo mundo da zona de conforto. E isso é bom. Faz o setor se mexer.” (Kings Sneakers/Divulgação)

Igor Morais, fundador da Kings Sneakers: “A concorrência tirou todo mundo da zona de conforto. E isso é bom. Faz o setor se mexer.” (Kings Sneakers/Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 23 de julho de 2025 às 14h03.

Em 2006, com apenas 15 anos, Igor Morais pediu  300 reais emprestados a um amigo.

Prometeu devolver o dobro em um mês. Comprou CDs de black music no centro de São Paulo, levou para revender na Galeria do Rock e, no mesmo dia, transformou os R$ 300 em R$ 600. Decidiu que não pararia ali.

Era o início da Kings Sneakers — uma das maiores redes brasileiras de moda urbana, que hoje fatura 350 milhões de reais por ano e acaba de estrear sua operação internacional nos Estados Unidos.

Do porão à rede nacional de franquias

A loja original ficava num porão de 12 metros quadrados, herdado do pai de Igor, um nordestino que veio do Maranhão e sustentava a família com bancas de jornal.

Quando o pai quebrou e ia entregar o ponto, na Galeria do Rock, Igor pediu para ficar com a loja. “Me dá essa chance. Eu vou tocar”, disse.

Sem funcionário, sem sócio e sem experiência, ele virou tudo: vendedor, caixa, estoquista e faxineiro.

Lia revistas importadas de hip hop, buscava tendências nas ruas e montava a vitrine com os poucos pares que encontrava em outlets. “Só tinha o pé esquerdo na vitrine, porque eu não tinha grade. Cada par era único.”

A loja virou ponto de encontro de MCs, DJs, grafiteiros e apaixonados por streetwear, criando não só um negócio, mas uma cultura em torno da marca. Os tênis começaram a ganhar mais espaço que os CDs, e o streetwear virou o coração da operação.

Nos anos seguintes, a expansão veio na marra.

Sem capital para abrir novas unidades, Igor criou um modelo de franquias desenvolvido dentro de casa, com apoio de quem já vivia a operação.

Hoje, a Kings tem mais de 170 lojas franqueadas em todo o Brasil — e apenas uma própria, mantida na Galeria do Rock em homenagem à origem.

O plano de internacionalização

Agora, o desafio é outro: conquistar o mercado americano, berço do hip hop, dos sneakers e da cultura que sempre inspirou a Kings.

Após dois anos de planejamento, a marca lançou um site em inglês e espanhol, com estoque local e foco inicial em três estados: Flórida, Califórnia e Nova York.

Diferente do Brasil, a operação nos EUA começa com um portfólio 100% autoral — nada de Nike, Adidas ou outras marcas.

“A gente quer mostrar primeiro quem somos. Vender nossa identidade. Depois a gente pensa em ser multimarca lá também”, diz Igor.

O investimento inicial foi de 500.000 dólares, com metas ousadas: faturar 100.000 dólares até o fim de 2025 e meio milhão de dólares até 2026. A ideia é abrir a primeira loja física americana nos próximos dois anos.

Mas logo após o lançamento do site, veio o revés: o ex-presidente Donald Trump, em plena campanha, anunciou uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, com vigência a partir de 1º de agosto. A medida pode afetar diretamente operações como a da Kings.

“Subimos o site, e no outro dia veio essa bomba. Mas agora não tem como dar ré. A máquina está ligada. Vamos pra cima”, afirma Igor. Se necessário, ele já cogita produzir localmente nos EUA. “Temos parceiros. Estamos preparados para tudo.”

Como a Kings se mantém relevante mesmo entre gigantes

No Brasil, os desafios também não são poucos.

A Kings compra com até um ano de antecedência, lidando com variações do dólar e apostas em tendências de consumo. “Já errei nessa conta. Se a gente errar no que vai vender, perde. O jogo é esse: comprar certo, vender muito. E repetir.”

Mesmo diante de marcas gigantes com lojas próprias, a Kings sobrevive — e cresce.

“Quando uma loja da Nike abre num shopping, nossa venda aumenta”, diz. “O nosso cliente entra na Nike, vê o tênis, mas vem pra Kings. Porque aqui ele encontra mais: camiseta, boné, cultura. É identidade.”

Além das multimarcas, 8% do faturamento hoje já vem da marca própria — uma linha que carrega a estética e o discurso da empresa. “Nosso cliente compra porque representa um estilo, não só pelo preço.”

E esse estilo também chegou à música. Em 2024, Igor criou o selo musical Sombras, ao lado do irmão, para lançar artistas conectados ao universo urbano. “Começamos vendendo CD. Agora vamos produzir conteúdo. Não é só moda. É cultura.”

Do porão da Galeria do Rock às prateleiras americanas, a Kings não é só uma loja. É uma ideia. E está só começando.

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