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"A crise é enorme", diz presidente da Latam no Brasil

Para Jerome Cadier, sobrevivência de companhias aéreas em meio à crise do coronavírus depende de ajuda do governo

Latam: Latam anunciou um corte total de 70% em sua operação (John Milner/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)

Latam: Latam anunciou um corte total de 70% em sua operação (John Milner/SOPA Images/LightRocket/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 17 de março de 2020 às 08h22.

Última atualização em 17 de março de 2020 às 11h15.

Com o setor aéreo agonizando por causa da crise do coronavírus e com vendas para voos internacionais próximas a zero, o presidente da Latam no Brasil, Jerome Cadier, afirma que a sobrevivência das empresas dependerá das medidas do governo federal.

As companhias aéreas negociam com os ministérios de Infraestrutura e Economia uma linha de crédito para capital de giro, a postergação do recolhimento de impostos e regras diferenciadas para a devolução de passagens aos consumidores.

"Não estamos tentando resolver problemas estruturais nem pedindo renúncia fiscal ao governo. As empresas aéreas querem ajuda no curto prazo porque a demanda vai voltar em algum momento", disse Cadier. Segundo o executivo, a demanda deve ficar retraída por até seis meses e a ajuda do governo não pode ser tímida. "Não adianta um movimento pequeno. A crise é enorme." A seguir, trechos da entrevista.

A Latam anunciou um corte total de 70% em sua operação. Esse número corresponde ao tamanho da queda de demanda?

Esse número é uma conjunção de dois fatores. Algumas rotas são impossíveis de voar porque as fronteiras de países foram fechadas. Há também o impacto da queda de demanda. O que é interessante é que, no dia 12, anunciamos um corte de 30% nos voos internacionais. Agora, esse número é de 90%. O principal fator é a velocidade com que as coisas estão acontecendo.

Qual a queda de demanda?

É difícil dar guidance. O internacional está numa situação de pouca venda, se não for zero. No doméstico, a queda foi brutal. Temos uma combinação inédita de venda muito baixa com cancelamento alto de viagens e postergação de passagens. Isso faz com que a quantidade de passageiros esteja bem mais baixa.

Quanto tempo uma companhia aérea resiste nessas condições?

Difícil dizer também. Depende das ações do governo. Se não vier nenhuma mudança, esses 90% de voos cancelados podem virar 100% rapidamente. Aí pode acontecer de não ter mais nem voo doméstico nem internacional. É um cenário possível, que queremos evitar.

Qual o impacto econômico dessa crise para a empresa?

O que podemos divulgar é o que temos feito com os ministérios da Infraestrutura e da Economia. A gente compartilha com eles essa tendência de queda de vendas muito forte, cancelamentos e países fechando fronteiras. Na semana passada, teve um mal-entendido sobre esse assunto. Não estamos tentando resolver problemas estruturais do setor nem pedindo renúncia fiscal ao governo. As empresas aéreas querem ajuda no curto prazo porque a demanda vai voltar em algum momento.

Como o governo tem respondido aos pedidos do setor?

Três coisas estão na pauta. Primeiro, ajuda para o caixa das empresas no curto prazo. Segundo, postergação de recolhimento de impostos, para ainda em 2020. Empurrar para a frente alguns recolhimentos de PIS/Cofins não afetaria as contas do governo em 2020, mas ajudaria as companhias. O terceiro são medidas relacionadas aos consumidores, que estão solicitando o dinheiro de volta. A gente está tentando garantir maneiras mais inteligentes, neste período de crise, de pensar na devolução, seja transformando em crédito, seja devolvendo o dinheiro mais adiante, quando a crise tiver sido digerida.

Mas qual tem sido o retorno do governo?

Temos sido escutados, porque o governo entende o impacto no negócio. O que precisa entender, como governo, é que tipo de medida é possível e por quanto tempo. A gente não participa dessas discussões. Esperamos que entre hoje (ontem) e amanhã (hoje), saia o conjunto de medidas e que ele seja suficiente. Não adianta um movimento pequeno. A crise é enorme. Nos Estados Unidos, as empresas estão pedindo 50 bilhões de dólares. Na Inglaterra, 11 bilhões de libras. Esse é o tamanho da ajuda que as empresas precisam para continuar operando. Depois, esse dinheiro volta (aos cofres públicos), conforme a demanda retornar. Estamos trabalhando com a possibilidade de uma demanda reprimida durante quatro ou seis meses.

Segundo a consultoria Centre for Aviation (Capa), companhias aéreas importantes podem quebrar até maio. Acha que esse cenário é provável?

Não apostaria nesse cenário porque acho que os governos vão tomar medidas para socorrer as empresas. Diferentemente das outras crises, que eram no sistema financeiro, essa é no setor produtivo. A capacidade de os governos impedirem que haja demissões em massa ou quebra de empresas em massa vai ajudar o setor.

Mas deve ocorrer uma aceleração do processo de consolidação do setor globalmente, com aquisições de empresas que não resistirem?

Acho que sim. Pode ser que se acelere esse processo ou que desapareçam pequenas empresas que não tenham tamanho para se sustentar numa crise dessas. Às vezes, a consolidação é um processo mais longo. Agora, vai ser meio de supetão.

O consumidor deve esperar preços mais altos para quando a situação se regularizar?

Pensando nos fatores de custo do setor: um dólar a 5 reais, com 70% dos custos das companhias dolarizados, é matador. Por outro lado, o petróleo despencou. São dois efeitos que não chegam a se anular. O dólar machuca mais. Mas o que vai determinar os preços mesmo são as condições de demanda: quantos passageiros teremos daqui a seis meses, se o consumidor vai se acostumar a viajar menos… Neste momento, temos de manter o mercado mais competitivo, e não menos.

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