Negócios

A ascensão e queda do homem forte do Goldman na Malásia

Leissner, presidente do conselho para o Sudeste Asiático, deixou a empresa no mês passado após receber questionamentos a respeito de seu trabalho


	Goldman Sachs: os bons tempos não duraram
 (REUTERS/Brendan McDermid)

Goldman Sachs: os bons tempos não duraram (REUTERS/Brendan McDermid)

DR

Da Redação

Publicado em 31 de março de 2016 às 22h54.

O primeiro-ministro da Malásia entregou uma mensagem ao público presente no Grand Hyatt San Francisco, em setembro de 2013.

“Não podemos ter uma sociedade igualitária, é impossível ter uma sociedade igualitária”, disse Najib Razak. “Mas certamente podemos conseguir uma sociedade mais justa”.

Tim Leissner, um dos banqueiros-estrela do Goldman Sachs, desfrutou das festividades naquela noite com a modelo Kimora Lee Simmons, que agora é sua esposa. Ela postou fotos no Twitter em que está sentada ao lado da esposa de Najib e depois de pé entre ele e Leissner. Todos sorriam.

Os bons tempos não duraram. Pelo menos US$ 681 milhões entraram na conta bancária pessoal do primeiro-ministro naquele ano, dinheiro que seu governo disse ter sido um presente da família real saudita.

O rendimento causou distúrbios para ele, investigações ao fundo estatal que ele administra e problemas para o Goldman Sachs, que o ajudou a captar US$ 6,5 bilhões. Leissner, presidente do conselho para o Sudeste Asiático, deixou a empresa no mês passado após receber questionamentos a respeito do fundo, de seu trabalho em um negócio no setor de mineração na Indonésia e de uma carta de referência supostamente imprecisa.

Poucas corporações aprimoraram a mistura de dinheiro e poder como o Goldman Sachs, que tem sede em Nova York, cujos ex- funcionários se transformaram em parlamentares nos EUA, secretários do Tesouro e membros do banco central. A ascensão e a queda de Leissner mostram como pode ser lucrativo e fértil para o banco exportar essa receita para o mundo. Em 2002, quando o tornou chefe de investment banking em Cingapura, a empresa tinha acabado de limpar uma bagunça lá após ofender famílias poderosas.

Foram necessários apenas alguns anos para que o mestre do networking ajudasse o banco a crescer no Sudeste Asiático -- chegando a acordos bilionários com o fundo estatal 1Malaysia Development, também conhecido como 1MDB. Mas se as ligações dele com os ricos e poderosos impulsionaram sua carreira no Goldman, também ajudaram a encerrá-la.

O advogado de Leissner, Jonathan Cogan, não respondeu às mensagens. Edward Naylor, porta-voz do Goldman Sachs, preferiu não comentar.

Um colega dessa época disse que Leissner era o tipo de banqueiro que poderia pular numa canoa, remar rio acima e voltar com uma comissão. Essa pessoa, que pediu anonimato, disse que Leissner era capaz de deslumbrar de outras formas: quando se casou com Judy Chan, cujo pai administrava uma empresa de mineração de carvão na China, a festa de casamento incluiu leitões com luzes elétricas piscantes nos buracos dos olhos.

Bilionários malaios

Os contatos de Leissner eram mais impressionantes ainda. Em maio de 2006, ele estava sentado no palco quando o conglomerado controlado pelo bilionário Syed Mokhtar Al-Bukhary anunciou a aquisição da produtora de energia Malakoff, que classificou como “a maior aquisição já realizada na Malásia”. O Goldman Sachs assessorou o negócio. Naquele ano, Leissner instituiu uma parceria.

A firma ajudou a gerenciar a oferta pública inicial do bilionário T. Ananda Krishnan, em 2009, para a Maxis, a maior operadora de telefonia celular da Malásia. Krishnan controlava também a Astro Malaysia Holdings, maior emissora de TV paga do país, e o Goldman Sachs também estava lá quando a empresa abriu seu capital.

Leissner era franco sobre sua ambição. A empresa queria fazer mais negócios na Malásia, disse ele, em entrevista realizada por uma agência de notícias do governo. Isso foi antes de Najib se tornar primeiro-ministro, em 2009. No final daquele ano, a comissão de valores mobiliários do país citou a “mudança estratégica” do novo líder ao anunciar que a candidatura do Goldman para iniciar operações de gestão de fundos e finanças corporativas havia sido aprovada.

Aquilo abriu caminho para os grandes negócios da empresa com a 1MDB, que começou como um fundo de investimento criado pelo estado de Terengganu, rico em petróleo, antes de Najib assumir.

A entidade estatal atraiu a atenção desde o começo: Jho Low, um jovem negociante que assessorou a autoridade de investimentos de Terengganu e que era amigo do filho adotivo de Najib, o produtor de cinema Riza Aziz, apareceu nos tabloides festejando em Nova York e Saint-Tropez com Lindsay Lohan, Paris Hilton e garrafas de champanhe.

O Goldman Sachs, banco no qual o irmão de Jho Low, Szen, havia trabalhado, também fez um grande negócio. A empresa ganhou US$ 593 milhões trabalhando em três vendas de bonds que captaram US$ 6,5 bilhões para a 1MDB em 2012 e 2013, segundo uma pessoa informada sobre o assunto, superando por muito o que os bancos normalmente lucram com negócios com o governo. Leissner assessorou o fundo estatal desde o início, segundo um ex-colega familiarizado com as vendas de bonds.

“Havia grandes exigências e o Goldman era uma das poucas empresas, na verdade a única, que poderia oferecer a solução que era exigida”, disse o presidente da 1MDB, Arul Kanda, em entrevista, na quarta-feira, em seu escritório, em Kuala Lumpur. “De uma forma geral, os objetivos foram atingidos”. Ele preferiu não comentar sobre Leissner.

O banco disse no ano passado que as tarifas e comissões “refletiam os riscos de subscrição assumidos pelo Goldman Sachs”. Um porta-voz de Najib preferiu não comentar essa reportagem. Jho Low não respondeu aos e-mails.

US$ 681 mi

A irritação em relação ao lucro do banco de Wall Street foi ofuscada pela controvérsia sobre se o dinheiro captado pela 1MDB foi gasto como previsto, em projetos locais, como um centro financeiro em Kuala Lumpur, ou se foi desviado.

“Eu não sou ladrão”, disse Najib, em julho passado, quando os investigadores analisaram as centenas de milhões de dólares que teriam aparecido nas contas bancárias dele.

O advogado-geral da Malásia disse em janeiro que o primeiro-ministro recebeu US$ 681 milhões na forma de presente da família real da Arábia Saudita e devolveu US$ 620 milhões. Naquele mês, procuradores suíços pediram ajuda à Malásia para investigar a 1MDB, dizendo que suspeitavam que US$ 4 bilhões podem ter sido apropriados indevidamente.

O Goldman Sachs também reavaliou o negócio, mas não encontrou nenhum indicativo de que a empresa ou Leissner cometeram irregularidades, disseram duas pessoas familiarizadas com o processo. Mesmo assim, o banco intensificou o rigor sobre o executivo depois que ele trabalhou com um grupo de investidores, no ano passado, para tentar comprar as operações indonésias de cobre da Newmont Mining.

Um deles, Sudjiono Timan, ex-chefe de uma corretora estatal condenado por corrupção em 2004, criou um problema. A empresa disse a Leissner que não poderia seguir adiante se ele fosse um dos patrocinadores, apesar de a condenação ter sido anulada em 2013, disseram duas pessoas familiarizadas com o assunto. Timan se retirou, mas o Goldman Sachs deixou o negócio quando soube que ele continuava atuando como assessor, disseram as fontes.

O banco, então, examinou as mensagens de Leissner e descobriu uma carta de referência escrita por ele que, segundo informou o banco em comunicado ao mercado, era “imprecisa e não autorizada”.

Mansão

A empresa colocou Leissner de licença em janeiro e ele se demitiu logo depois. Ele foi intimado por investigadores dos EUA em fevereiro pelo trabalho com a 1MDB. O governo disse a ele que ele não é um alvo, segundo uma das pessoas.

As autoridades estão analisando se o Goldman Sachs enganou os detentores de bonds da 1MDB ou violou leis anticorrupção, reportou o Wall Street Journal na semana passada. Leissner recomendou que a empresa contratasse a filha de um assessor próximo de Najib, segundo o jornal.

Os negócios do Goldman na Malásia, onde era um dos principais bancos há quatro anos, caíram bastante. A empresa ficou classificada em 17º lugar em termos de trabalhos de fusões e aquisições no ano passado, quando não recebeu crédito por nenhuma negociação de ações ou dívidas, mostram dados compilados pela Bloomberg.

Uma tentativa, neste mês, de contato com Leissner ou sua esposa pelo interfone do portão de uma mansão de US$ 11 milhões em Beverly Hills não teve sucesso. A casa de 873 metros quadrados, que conta com sete quartos, nove banheiros, sala de cinema, academia, quadra de tênis e casa de hóspedes, segundo um antigo anúncio, fica ao norte de Sunset Boulevard.

--Com a colaboração de Esmé E. Deprez, Greg Farrell, Cathy Chan, Joyce Koh e Dakin Campbell.

Acompanhe tudo sobre:Bancosbancos-de-investimentoEmpresasEmpresas americanasFinançasGoldman SachsMalásia

Mais de Negócios

'E-commerce' ao vivo? Loja física aplica modelo do TikTok e fatura alto nos EUA

Catarinense mira R$ 32 milhões na Black Friday com cadeiras que aliviam suas dores

Startups no Brasil: menos glamour e mais trabalho na era da inteligência artificial

Um erro quase levou essa marca de camisetas à falência – mas agora ela deve faturar US$ 250 milhões