Mauricio de Sousa na prancheta em 1967 (MSP Estúdios/Divulgação)
Repórter
Publicado em 27 de outubro de 2025 às 06h28.
Última atualização em 27 de outubro de 2025 às 06h49.
Mauricio de Sousa completa nesta segunda-feira, 27, 90 anos de vida, sendo boa parte dela dedicada à empresa MSP Produções, que detém a marca "Turma da Mônica".
Sua história também é marcada por diferentes profissões. Entre jornalista, empresário e artista, essa última ele gostava mais, mas viveu todas essas versões. O primeiro emprego foi como repórter policial nos anos 1950, quando ele rabiscava personagens entre um plantão e outro.
O sonho de viver de histórias virou uma das estruturas mais sólidas do entretenimento brasileiro: a MSP Estúdios (ex-Mauricio de Sousa Produções), fundada oficialmente em 1959, atravessou planos econômicos, crises e revoluções tecnológicas mantendo a criatividade no centro da estratégia.
Hoje, a companhia com sede em São Paulo e cerca de 250 funcionários opera em modelo multiplataforma: quadrinhos, animação, espetáculos ao vivo, games, experiências imersivas e uma máquina de licenciamento que abastece mais de 4 mil produtos em mais de 150 empresas parceiras — de alimentos a vestuário, passando por educação, cosméticos e bem-estar.
A companhia também conta com uma nova direção desde março deste ano, formada por Marina de Sousa, Mauro de Sousa e Marcos Saraiva. O Conselho segue presidido por Mauricio de Sousa, com Alice Takeda e Mônica Sousa como conselheiras, e heads das áreas estratégicas participando. Cada familiar que está na direção conta com uma expertise. Marina lidera a criação e narrativa, Mauro puxa o ao vivo (teatro, parques, festivais) e Marcos conduz a tradução do universo para audiovisual e digital.
A MSP responde hoje por cerca de 89% do mercado nacional de quadrinhos infantojuvenis, com média histórica de 2,5 milhões de exemplares mensais e 12 milhões de revistinhas vendidas ao ano.
“É uma marca que atravessa gerações. Pouquíssimas conversam com crianças, pais e avós ao mesmo tempo”, afirma Marcos Saraiva, diretor executivo da MSP (e neto de Mauricio de Sousa).
O parque da Turma da Mônica completa 10 anos e representa uma fatia grande do fatuamento do grupo criado pelo desenhista Mauricio de Sousa (MSP Estúdios/Divulgação)
A MSP organiza seu portfólio por franquias (Turma da Mônica, Chico Bento, Horácio, entre outras) e sublinhas por faixa etária (Baby, Tradicional, Jovem, Toy, etc.). A conta é direta:
“Quando falamos licenciamento, é produto. Se somarmos o ao vivo, subimos mais 30%”, diz Saraiva.
Marcos Saraiva, diretor executivo da MSP: “Para dobrar o faturamento, precisamos diversificar marcas e públicos. Hoje falamos com bolhas, não mais com massas” (MSP Estúdios/Divulgação)
A história do licenciamento da Turma da Mônica é, na prática, a origem do mercado de licenciamento de marcas no Brasil. Tudo começou em 1969, quando Mauricio de Sousa recebeu um convite da antiga Sica, fabricante de extrato de tomate, para criar uma campanha publicitária. O personagem escolhido foi o Jotalhão, o elefante verde amigo da turma — e o sucesso foi tão grande que o produto saiu das telas e ganhou as prateleiras, inaugurando o primeiro contrato de licenciamento do país.
A partir daí, Mauricio percebeu que seus personagens tinham um valor que ia além dos quadrinhos. Ele começou a licenciar a marca Turma da Mônica para brinquedos, roupas, material escolar e produtos alimentícios. Essa visão pioneira transformou a MSP em uma referência mundial de economia criativa, abrindo um mercado que hoje movimenta bilhões.
Entre os maiores sucessos estão as maçãs da Turma da Mônica (em parceria com a Fischer), os miojos da Nissin, as fraldas da Softys, e o extrato de tomate Jotalhão, que mantém o mesmo contrato original há mais de cinco décadas.
Para a família, o segredo é a combinação de afetividade e gestão de marca. Como relembrou o neto e diretor executivo Saraiva:
“O primeiro licenciamento nasceu de uma propaganda de TV e virou um novo modelo de negócio. A partir dali o Maurício entendeu que tinha em mãos uma marca capaz de conversar com todas as gerações e setores”.
A maçã da Turma da Mônica nasceu de um problema real: caber na lancheira. A parceria com a Fischer embalou frutos menores, lavados e prontos para consumo, criando um novo posicionamento de conveniência e qualidade. Hoje, o canal movimenta cerca de 1,6 mil toneladas de frutas e cerca de 850 mil pacotes por mês. O efeito-rede levou o selo para brócolis do Cebolinha, melão da Magali, milho do Chico Bento e tangerina da Mônica.
Uma das lições que Saraiva aprendeu com o seu avô sobre liderança foi ter empatia e se colocar no lugar do cliente.
“Pergunte sempre: eu daria este produto ao meu filho? Se a resposta for sim, é um bom negócio. E um bom negócio precisa ser bom para todos os lados,” diz Saraiva ao relembra o conselho do avô.
O alimentar é uma das verticais mais fortes: a empresa estima 9,5 milhões de unidades de miojo e cerca de 750 toneladas de produtos alimentícios licenciados por mês circulando com as marcas da MSP.
A companhia opera dois parques da Mônica (SP Market, em São Paulo, e Gramado/RS), somando quase 1 milhão de visitantes por ano. O parque do SP Market completou 10 anos neste ano (o primeiro grande parque foi o do Eldorado, nos anos 1990). Em eventos, o Festival Turma da Mônica no Parque Villa-Lobos, em São Paulo, levou 20 a 30 mil pessoas em quatro dias durante a semana do Dia das Crianças.
Espetáculo da Turma da Mônica no parque em São Paulo (MSP Estúdios/Divulgação)
A década passada marcou a aceleração da MSP no audiovisual como “canhão de mídia” para popularizar IPs e diversificar receitas. Do Mônica Toy (estreado no início dos anos 2010, com bilhões de views no YouTube) a séries como Turma da Mônica — Origens (Globoplay), passando por live actions (Laços, Lições e Chico Bento, lançado em 2025), a empresa lançou 15 novas propriedades desde 2018.
Mais recentemente, a MSP estreou Cortes do Chico em formatos curtos (YouTube/TikTok), atingindo 1 milhão de visualizações logo no primeiro mês, com humor “um pouco mais ácido” mirando crianças de 8 a 11 anos.
“Para dobrar o faturamento, precisamos diversificar marcas e públicos. Hoje falamos com bolhas, não mais com massas”, diz Saraiva.
Neste mês, uma das apostas do audiovisual é o filme sobre a vida do Mauricio de Sousa (Mauricio de Sousa – O Filme).
“O Mauricio não nasceu um gênio pronto — ele foi se construindo. É uma história de humanidade, de vulnerabilidade e de força”, conta Mauro de Sousa, filho de Mauricio de Sousa.
No entando, uma das novidades de Saraiva à EXAME, é que até 2030 um novo filme deve chegar ao cinema. Em pré-produção com a produtora Boi Peba de Carlos Saldanha, o filme do Horácio terá estreia global estimada em 5 anos.
Ao mesmo tempo, a empresa trabalha o selo ‘Mauricio 90’ como franquia anual e prepara Penadinho para o ciclo 360º (conteúdo, produtos, experiências), tema que Saraiva também compartilha de forma exclusiva à EXAME.
A presença internacional existe — com ativações no Japão e publicações na Europa (gráficas e Panini, França e Portugal) —, mas o foco dos próximos anos é América Latina. As animações da Turma da Mônica já estão na região em espanhol (HBO Max), já nos Estados Unidos seguem como ambição de médio prazo, pela competição acirrada e pelo custo de entrada.
“O nosso foco agora é fortalecer a presença na América Latina, onde já existe uma conexão afetiva com a marca desde os anos 80 e 90”, afirma Saraiva.
A MSP passou por reorganização recente (com redução de quadro e custos de rescisão) para ganhar eficiência e acelerar a partir de 2026. Mesmo com o ajuste, 2024 teve crescimento ante 2023, e o plano é avançar.
“A meta é dobrar o faturamento em três anos, somando Brasil e América Latina", diz Saraiva.
No editorial, a MSP trabalha com 33 editoras (entre elas, Panini, Melhoramentos e Girassol). Em alimentos e higiene, nomes como Nissin, Cargill (Jotalhão, herdeiro do primeiro licenciamento com a Sica, de 1969) e Softys (fraldas) estão na vitrine. No streaming, há conteúdos com Netflix, HBO Max, Prime Video e Globoplay. Em live e eventos, a InHouse e a rede Bourbon figuram entre os parceiros.
Em ano de 90 anos de seu fundador, a empresa reforça governança, abre caminho para a 2ª/3ª geração e mira territórios onde a memória afetiva já é vantagem competitiva.
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