Wadi Khaled: imprecisa delimitação fronteiriça foi motivo de disputa entre o Líbano e a Síria (Uriel Sinai/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 31 de março de 2012 às 10h18.
Wadi Khaled (Líbano) - A região fronteiriça de Wadi Khaled, antes próspera devido ao contrabando de mercadorias entre Síria e Líbano, é hoje uma zona empobrecida que sofre o drama do conflito sírio, ao acolher milhares de refugiados.
Sua proximidade com cidades devastadas pelas operações do Exército sírio, como Homs, fez desta região dividida em 23 aldeias um dos principais pontos de referência para os sírios que cruzam o Líbano fugindo da violência em seu país.
A fronteira entre as duas nações países é delimitada nesta área de forma imprecisa pelo rio Al Kabir, onde algumas pontes foram atacadas pela artilharia do regime de Damasco e apresentam um aspecto de zona de guerra.
Apesar destas dificuldades e do medo por conta das minas instaladas pela Síria na fronteira, o que já matou e mutilou alguns dos refugiados, Wadi Khaled se transformou em um acampamento improvisado de amparada para os sírios.
A maioria da população é de confissão sunita, assim como grande parte dos sírios que fogem de seu país, algo que dá segurança aos refugiados, que temem o respaldo das comunidades xiitas do Líbano ao regime sírio de Bashar al Assad.
'Não é a mesma coisa estar em nosso país, mas em Wadi Khaled nos sentimos como em nossa casa, já que nos tratam muito bem', assegurou à Agência Efe a síria Um Shafic, mãe de nove filhos de entre dois e 18 anos.
Esta mulher, que há 20 dias decidiu abandonar seu país devido à intensidade dos bombardeios contra seu bairro - Baba Amre, em Homs -, se aloja em um andar de um edifício em construção cedido pela libanesa Fatma Ahmad Yehia.
Fatma explicou à Efe que tenta ajudar esta família com seus poucos recursos: 'Enterneci-me quando vi tantas crianças pequenas. Permanecerão aqui até que possam voltar a seu país sãos e salvos', explicou.
Este retorno parece distante para Um Shafic, que se sente incapaz de voltar a viver uma experiência tão traumática como a detenção de seu filho mais velho 'só por ser sunita', em um país governado pela minoria alauita (um ramo do xiismo).
'Sabiam que não estava envolvido em nada, mas fizeram isso por dinheiro. Pediram-nos US$ 4 mil para libertá-lo e, quando conseguimos juntar essa soma, o libertaram', lamenta.
Ao sofrimento na Síria se somam as duras condições da fuga, na qual foram ajudados pelo rebelde Exército Livre Sírio (ELS), que também tenta desativar algumas das minas colocadas na fronteira.
A imprecisa delimitação fronteiriça foi motivo de disputa entre o Líbano e a Síria, uma vez que este último considera que lhe pertencem algumas aldeias da região, onde parte da população não obteve a nacionalidade libanesa até 1994 porque eram nômades.
Outro dos refugiados em Wadi Khaled é Gharid Mohamad Issa, que chegou à localidade de Arida há vários meses na companhia de dez membros de sua família.
Issa também fugiu dos bombardeios contra Homs e assegura que, apesar de ser complicado viver da caridade, não voltará a seu país enquanto Assad estiver no poder.
Entre os deslocados a Wadi Khaled predominam os árabes sunitas, mas também há outras comunidades como a curda, à qual pertence um refugiado que se identifica como Abdullah e que ficiou detido durante dois meses.
O homem explicou à Efe que fugiu das torturas sofridas na prisão, onde compartilhou uma cela subterrânea de três metros com 80 pessoas.
'Levam-nos à prisão para pedir dinheiro ou nossas mulheres e filhas para nos pressionar. Muitos curdos se arruinaram para salvar suas famílias', denuncia Abdullah, que deixou para trás uma dúzia de estabelecimentos comerciais de sua propriedade na Síria.
Enquanto os refugiados deixam para trás seus negócios, no antes florescente mercado de Wadi Khaled, onde eram vendidos os produtos que vinham de modo ilegal da Síria, agora há apenas cinco lojas, e a fronteira só é cruzada por algumas mulheres carregadas com artigos de primeira necessidade. EFE