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Violência urbana na América Central provoca onda de migração

“É um deslocamento que sai da escala individual e vira, realmente, um fluxo migratório”, disse a assessora da Anistia Internacional


	Arma: pessoas de Honduras, Guatemala e El Salvador não aguentam mais o ambiente de violência e extorsão, diz Anistia
 (Thinckstock/Thinkstock)

Arma: pessoas de Honduras, Guatemala e El Salvador não aguentam mais o ambiente de violência e extorsão, diz Anistia (Thinckstock/Thinkstock)

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Da Redação

Publicado em 14 de outubro de 2016 às 19h23.

A violência urbana em Honduras, Guatemala e El Salvador, tanto por parte de gangues armadas como de forças de segurança pública, está provocando uma onda de migração em massa, segundo relatório divulgado hoje (14) pela organização não governamental (ONG) Anistia Internacional sobre refugiados na América Central.

“[É] um deslocamento que sai da escala individual e vira, realmente, um fluxo migratório”, disse a assessora de direitos humanos da ONG, Marina Motta.

Segundo Marina, as pessoas desses três países não aguentam mais o ambiente de ameaça, extorsão, violência, seja ela sexual ou por gênero, por exemplo, e são obrigadas a sair em busca de sobrevivência em nações mais ricas.

O que ocorre, segundo Marina, é que no México e Estados Unidos, onde as populações dessas nações veem possibilidades de se inserir no mercado de trabalho, os refugiados estão sofrendo deportações ilegais.

"Não estão sendo reconhecidos como solicitantes de refúgio. A possibilidade de buscar refúgio nesses países está sendo negada a eles. Isso é muito grave”. Essa prática, diz, fere a regra de ouro da Convenção do Refugiado, que é o princípio de não devolução.

Negligência

Esses refugiados são obrigados, então, a retornar a seus países de origem, cujos governos fazem parte desse ambiente de violência, de negligência e também não se responsabilizam pela proteção dessas pessoas, chamadas retornadas, que acabam sujeitas às mesmas condições das quais estavam fugindo e, “possivelmente, ainda mais estigmatizadas”, segundo Marina.

O relatório cita o caso do motorista de ônibus de Honduras, Saul, de 35 anos, que fugiu para o México em novembro do ano passado, após sofrer um ataque de gangues que atuam sobre o setor de transportes e, ao ter o pedido de asilo negado, foi morto no seu país de origem, menos de três semanas depois de ser deportado em julho de 2016.

Agências da Organização das Nações Unidas (ONU) e outros organismos internacionais estão dando apoio financeiro a esses três países da região do Triângulo Norte da América Central para que invistam em prevenção e redução da violência, estratégias de desenvolvimento local e melhoria das condições de vida.

Este ano, os Estados Unidos anunciaram que, a partir de 2017, vão aportar US$ 750 milhões a esse programa de cooperação internacional para o Plano da Aliança para a Prosperidade, com objetivo de apoiar pessoas deportadas cuja vida está em perigo.

A grande questão, diz Marina Motta, é que os governos não divulgam como vão utilizar esse dinheiro. “A gente está muito preocupado com a possibilidade desse dinheiro ou sumir ou não ser implementado em programas que, de fato, melhorem as condições de vida dessas pessoas”.

Ela diz que há um histórico de desvio de recursos que fez com que projetos similares anteriores fracassassem. A Anistia Internacional defende que haja transparência no uso desse dinheiro e que ele seja direcionado para políticas baseadas em direitos humanos, em segurança, desenvolvimento, prevenção da violência e não simplesmente como um pacote de medidas de tolerância zero.

Contribuição do Brasil

Embora o Brasil não seja a opção de país mais rico em termos de oportunidades para esses migrantes, Marina diz que ele pode contribuir de forma emergencial para dar abrigo, tendo em vista o difícil acesso para mercados como México e Estados Unidos. Hondurenhos, guatemaltecos e salvadorenhos deportados acabam indo para países vizinhos, como Panamá, que tem 4 milhões de habitantes e abriga 3.400 refugiados; Costa Rica, cuja população oscila em torno de 5 milhões de habitantes e abriga 3.600 refugiados; Belize e Nicarágua. São todos países de renda média baixa.

Por isso, a Anistia Internacional acredita que o Brasil, como potência regional e com um histórico de receber imigrantes, deve se propor a resolver esse problema e receber mais refugiados do Triângulo Norte da América Central.

O Brasil tem, no momento, 9 mil refugiados, disse a assessora de Direitos Humanos. “Isso é muito pouco”. Apesar de o Brasil apresentar taxa atual de desemprego de 11%, Marina diz que a situação é mais grave em países menores, como a Costa Rica, por exemplo, onde o nível de desempregados atinge 17%, ou o Panamá, com 14%.

Marina diz que isso não significa que o Brasil assuma o papel de liderança na recepção dessas pessoas de uma forma irresponsável. Ela diz que existe a possibilidade de o Brasil ter apoio financeiro internacional para poder receber esses refugiados, criando, ao mesmo tempo, políticas públicas para a integração responsável dessas pessoas.

Segundo ela, todos os países do mundo estão fazendo esforço para receber essa população em situação emergencial. “Nós temos mais de 20 milhões de pessoas buscando refúgio”.

A assessora disse que o papel do Brasil para contribuir de forma positiva é duplo: de um lado, facilitar que essas pessoas venham para o país, por meio da criação de programa de vistos humanitários, ou da extensão do programa de reassentamento solidário, que o Brasil já oferece para a população da Colômbia; a outra por uma via mais política.

Essa alternativa prevê que o governo e a sociedade civil brasileiros pressionem os governos de Honduras, Guatemala e El Salvador a garantirem soluções para esses problemas e proteção dessas pessoas para que elas não precisem migrar.

Periculosidade

A ONU já classificou El Salvador como um dos mais perigosos países do mundo fora de uma zona de guerra, com registro de mais de 108 homicídios por 100 mil habitantes em 2015, nível maior que a guerra na Síria, que a guerra no Iraque.

Em Honduras, esse índice foi 63,75 assassinatos e, na Guatemala, de 34,99 homicídios por 100 mil habitantes. No Brasil, números recentes do Mapa da Violência 2016, referentes a 2014, revelam que a taxa de homicídios por 100 mil habitantes foi 30,3. 

O secretário-geral da Anistia Internacional, Salil Shetty, está hoje em Honduras em reunião com o presidente Juan Orlando Hernández, para entregar o relatório e cobrar um posicionamento oficial daquele governo.

Marina informou que o objetivo da ONG é encaminhar o documento aos presidentes dos três países analisados. Ele será levado também para os governos da região e do mundo todo, exigindo investigação do México e Estados Unidos sobre as deportações ilegais.

A Anistia Internacional Brasil vai procurar ainda o governo do presidente Michel Temer para ver como ele pode promover um papel mais “assertivo e mais positivo do Brasil em meio a essa crise”.

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