Protestos contra o presidente Mauricio Macri na Argentina (Marcos Brindicci/Reuters)
Gabriela Ruic
Publicado em 26 de setembro de 2018 às 12h45.
Última atualização em 26 de setembro de 2018 às 12h50.
Primeiro acabou o frango, depois o açúcar. A carne desapareceu e, em pouco tempo, o pão também. A escassez de alimentos, os preços exorbitantes e a criminalidade desenfreada na Venezuela levaram Verónica García a decidir: ela encontraria refúgio em Buenos Aires.
No entanto, Verónica foi recebida pela crise monetária da Argentina quando ela e o namorado, Miguel Nicorsin, chegaram à cidade no final de junho. O peso caiu 50 por cento neste ano, a inflação está subindo e a economia está entrando em recessão.
Isso assustou o jovem casal. Por enquanto, é verdade que é altamente improvável que a Argentina se torne a próxima Venezuela, mas os jovens emigrados não podem deixar de ver a crise atual através da lente de sua recente - e muito traumática - experiência em seu país natal.
"A Venezuela começou assim", disse Verónica, de 25 anos, que trabalha como assistente de um contador. "Não posso ficar pulando de um país para o outro. Quero ver se consigo me estabelecer aqui."
Verónica e Miguel são apenas dois dos quase 70.000 venezuelanos que chegaram à Argentina nos últimos dois anos e meio, segundo dados do governo. À medida que a Venezuela se transformou em uma crise humanitária, cerca de 2,3 milhões de pessoas passaram a morar no exterior, das quais 1,6 milhão fugiram desde 2015, estimou a ONU em agosto. Em Buenos Aires, essas pessoas costumam aceitar empregos de baixa remuneração, como a entrega de comida, o trabalho em lojas de roupas e o atendimento em bares e restaurantes.
Argentina e Venezuela divergem politicamente, mas são as economias que têm o pior desempenho da América Latina neste ano. A diferença é que a Venezuela está muito, muito pior.
Quando o preço do petróleo despencou em 2014, a Venezuela começou a ficar sem moeda forte. O bolívar entrou em queda livre no mercado paralelo quando o presidente Nicolás Maduro intensificou a impressão de dinheiro, desencadeando um dos grandes surtos de hiperinflação da história recente. Um índice da Bloomberg coloca a taxa anual em mais de 100.000 por cento hoje, e o Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que a taxa chegará a 1 milhão por cento até o final do ano.
A Argentina não está enfrentando nada parecido com esse apocalipse, mas sua recuperação sob o comando do presidente Mauricio Macri - um grande crítico de Maduro - desviou-se do caminho. Embora no início do ano fosse projetado um crescimento de 3 por cento, agora a economia da Argentina poderia registrar uma contração de 3 por cento, e a inflação dispara para mais de 40 por cento, o dobro do previsto em janeiro.
Os venezuelanos continuam indo para a Argentina porque o idioma é o mesmo, o país é seguro e a documentação de imigração é mais fácil em comparação com a de outros países latino-americanos.